Dia 21 Depois do apagão
Jared
A cidade estava silenciosa. Não havia mais animais selvagens a correr pelas ruas. Por enquanto.
Jared acelerou a moto pelas avenidas cada vez mais vazias, á medida que os animais iam fazendo os corpos mortos desaparecerem e conforme alguns apodreciam, sumindo aos poucos. Na verdade, algo teria de ser feito quanto a isso. O cheiro estava se tornando incômodo e os próprios corpos em decomposição poderiam provocar doenças, e isso era algo que não estava nos planos ultimamente. Os médicos estavam em greve.
Ele parou a moto na frente do mesmo bar de sempre, desligando ela, pegando a besta e saindo da moto.
Lá estava aquele zumbido de novo, mas Jared ignorou, entrando no bar.
Mas nesse dia, olhou uma foto que nunca olhava.
Era ele, com sua irmã e seu pai, antes de ele ficar doente. Os três sorrindo feito idiotas, com os braços sobre os ombros uns dos outros, na frente do balcão do bar.
Negou com a cabeça, e foi pegar uma cerveja, sentando na mesma mesa de sempre, colocando os pés em cima da mesa e bebendo aquela bebida quente.
De repente, algo fez barulho, chamando sua atenção. Parecia algo caindo ao chão.
Jared franziu o cenho e colocou a bebida sobre a mesa, devagar, abaixando os pés e pegando na besta, sem fazer barulho. Levantou, atento. Percebera de onde viera o som e segui nessa direção.
Seria um animal? Um cachorro faminto? Um gato? Só esperava que não fosse mais nenhum animal selvagem.
Andando silenciosamente, Jared se aproximou da porta da pequena arrecadação do bar, encostando na parede e respirando fundo. Escutou barulho do outro lado. Parecia... Algo respirando. Depois, muito rápido, surgiu na porta, mirando a besta no que quer que estivesse ali.
Lá dentro, sentada no chão, encolhida contra a parede, estava uma garota, que abriu muito os olhos quando viu ele e ergueu as mãos. Parecia uma adolescente, e deveria sê-lo.
Jared franziu o cenho. Mas o que estava acontecendo? Como aquilo era possível? Ele vira as pessoas mortas, não sobrara ninguém.
A garota parecia tão surpresa quanto ele.
Jared abaixou a besta, confuso. - Quem é você? - Sua voz grave saiu agressiva demais. Sua irmã costumava falar que ele tinha voz de cantor de rock.
A garota, tremendo, abriu a boca mas não fez som algum. Depois respirou fundo e tentou novamente.
- Ashley. Meus... Meus amigos me chamavam Ash.
Jared soltou um "pfff", desvalorizando o que ela falara. - Seus amigos estão mortos. Porque você não está?
A garota abaixou as mãos e o olhou. - O... O quê? - Seus olhos se enchendo de lágrimas.
Ele se afastou dela, regressando depois. - É algum tipo de brincadeira? Porque se for, não tem graça alguma!
- O... Eu não... Eu não sei do que você está falando. Eu... Eu pensei que não tinha sobrado ninguém.
Jared balançou a cabeça e soltou um som semelhante a um riso irónico. - É, eu também. - Deu as costas e se afastou para o interior do bar. - Uma adolescente! Tanta gente no mundo, e a única que ficou foi uma adolescente. Pelo amor!
Escutou a garota seguindo ele, mas ignorou, sentando novamente na cadeira e pegando a cerveja.
Ashley ficou encostada na beira da porta, olhando ele, assustada.
- Já entendi que não tem brincadeira nenhuma. - Disse ele. - Sabe o porquê de todo o mundo ter morrido?
Ela negou com a cabeça.
- Certo. Qual sua idade?
- 15.
Jared fechou os olhos. - Deus do céu. - Abriu e olhou ela. - Tá, pode parar de ficar aí me encarando como se eu fosse o palhaço do "It"?
Ela se mexeu, encostando na parede em frente da mesa e olhando a janela.
Jared ficou olhando ela, de braços cruzados sobre o peito, como se isso a mantivesse viva e segura. Respirou fundo.
- Onde você estava quando aconteceu? - Perguntou.
A garota olhou ele, colocando um pedaço de cabelo loiro atrás da orelha. Agora que Jared olhava com atenção, ela parecia a tipica patricinha rica e mimada que ele sempre evitava quando era adolescente.
Cabelo loiro, olho azul, pele perfeita, roupas caras...
- Em casa. - Disse ela. - No meu quarto, escutando música enquanto me preparava para a escola.
Jared continuou olhando ela. Deu de ombros. - Não escutou nada?
Ela negou. - Tinha phones de ouvido.
- Hum. - Bebeu um gole de cerveja. - Viu alguém vivo?
Ela revirou os olhos. - Você.
- Além de mim, patricinha.
Ashley negou com a cabeça. - Não, senhor simpatia.
Jared assentiu, colocou a garrafa na mesa, pegou a besta e saiu do bar, deixando a garota sozinha.
- Hey! - Gritou ela, correndo atrás de si. - Espera, onde você vai? Não me deixa sozinha!
Jared prendeu a besta na moto e subiu. - Se vira. O sonho de todo o adolescente não é viver sozinho e ter tudo o que quer? Então, tá aí. Bem vinda ao mundo de sonho!
- Não! Eu não... Eu não quero ficar sozinha. - Ashley abraçou o peito novamente. - Por favor. - Disse baixinho e olhando o chão, a pontos de chorar.
O rapaz fechou os olhos, suspirou, e depois abriu de novo, olhando ela de canto. Olhou em frente e mordeu o lábio. Depois olhou para a garota.
- Sobe aí.
Ela ergueu a cabeça. - O quê?
- Olha eu não sou um assassino e nem um estuprador. Também não gosto de adolescente, então não vou te magoar nem nada disso. - Deu de ombros. - Sobe antes que eu mude de ideia e deixe você sozinha de novo.
Ashley olhou a moto de forma nervosa e depois assentiu e Jared sorriu.
- Nunca andou?
Ela negou.
Ele esticou o braço. - Vem, eu te ajudo, não deixo você cair.
Ashley se aproximou e segurou a mão dele, passando uma perna por cima da moto e depois a outra.
Jared sentiu ela estremecendo e esticou os braços para trás, pegando as mãos dela e colocando em redor da sua cintura.
- Segura. Vou ligar, não grita, tá? Ela faz muito barulho mas não morde.
Ashley riu nervosamente e assentiu. - Tá.
Jared ligou a moto e sentiu Ashley apertando sua barriga.
Sorriu torto. - Gostaria de manter minha barriga no lugar, se fosse possível.
Ela diminuiu o aperto. - Desculpa.
Ele assentiu. - Sou o Jared, já agora.
- É... Oi.
Jared deu a partida e sentiu as unhas dela quase passando o tecido fino da sua camiseta. Negou com a cabeça. Mas no fundo, e mesmo estando ainda confuso, era bom ter companhia, mesmo que fosse uma adolescente idiota. Além disso, Ashley lembrava Jared da irmã, e isso era algo que ele não esperava.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Legado
Science FictionO mundo parou. Todos morreram. Do nada, as pessoas deixaram de respirar, caíndo como se estivessem adormecidas... Todos menos Lauren e o seu pai. Sozinhos em uma cidade fantasma, Lauren e Bill têm de sobreviver ao que parece ser o fim dos tempos, em...