Notas de Um Psicólogo Desmotivado

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O paciente se chama Felipe Siqueira de Souza, tem trinta e cinco anos, está ficando calvo e é casado com um homem chamado Rodrigo

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O paciente se chama Felipe Siqueira de Souza, tem trinta e cinco anos, está ficando calvo e é casado com um homem chamado Rodrigo... ou era Rodolfo? Eu vou ter que perguntar de novo, porque agora não estou lembrando. Felipe se queixa de não conseguir mais atingir ereções durante momentos de interação íntima com seu parceiro, o que causa a ambos intensa aflição e até mesmo alguns conflitos. O paciente também se queixa de ejacular durante o sono com certa frequência, e acredita que este fato talvez tenha alguma relação com sua disfunção erétil. Como eu não faço ideia do que pode estar acontecendo, acabei dando corda para essa linha de raciocínio absurda e sugeri que investigássemos seus sonhos. No entanto, Felipe nunca se recorda de nenhum deles. Sugeri, portanto, baseando-me em um artigo que li aleatoriamente na Wikipédia alguns anos atrás, que ele passasse a deixar o celular ao lado do travesseiro, para que assim pudesse fazer quaisquer anotações relacionadas a eventos oníricos, seja por texto ou por áudio, logo ao acordar. Todo esse conteúdo deverá ser mandado para a minha caixa de mensagens a partir de hoje, eu lhe disse, e lhe garanti também que essa atividade faria com que ele forçasse o próprio cérebro cada vez mais a se recordar dos sonhos, de modo que em poucas semanas passaria a se lembrar de praticamente tudo. Desta forma, desvendaríamos a questão e resolveríamos o problema.

Diário de sonhos, dia 1

Lembro de ter visto sangue em azulejos brancos. Havia uma pilastra também coberta de azulejos brancos. Ela tapava parte da visão da poça de sangue.

Nota: Não estou bem certo quanto ao significado desse sonho. Por um momento, eu conversei com o paciente usando um vocabulário complexo e acadêmico. Nem eu tinha muita certeza do que eu estava falando.

Diário de sonhos, dia 3

Eu estava numa espécie de labirinto todo coberto de azulejos brancos. Depois de andar por muito tempo, eu encontrei uma piscina. Eu vi dois ou três degraus submersos que meio que me convidavam a entrar naquela água escura. Devia haver mais degraus, mas a água se tornava cada vez mais turva e mais escura lá pra baixo. E ela ondulava... Se ela ondulava eu não estava sozinho.

Nota: Eu disse ao paciente que deveríamos investigar em sua infância a origem dos azulejos brancos. Teriam eles pertencido a algum local em que ocorrera um trauma ou coisa parecida? Felipe não soube me responder.

Diário de sonhos, dia 5

Havia azulejos pretos na parede, mas a banheira era feita de azulejos brancos. O fundo da banheira, porém, era igual a um tabuleiro de xadrez distorcido pelo ondular de um líquido azul-claro. Eu é quem causava essas ondas na banheira. O líquido cristalino se distorcia num círculo de ondulação em torno de mim, e em torno desse círculo se formava outro, e assim sucessivamente.

Nota: Eu incentivei o paciente a manter o diário e lhe dei uma longa explicação improvisada e sem fundamento científico a respeito de todos os símbolos presentes no sonho.

Diário de sonhos, dia 8

Observo um sol alaranjado e sem vida se pôr num brejo. O céu é esverdeado e há nuvens cor de ferrugem espalhadas. As árvores são muito altas e seus troncos são esguios. A paisagem é ameaçadora de certa forma. Eu vou andando com certa dificuldade através da água lamacenta. Vejo uma casa toda coberta de sombras. As janelas estão iluminadas. Eu me aproximo, mas parece que nunca vou chegar. De repente estou andando numa estrada de terra. Ladeando a estrada há fileiras de árvores enormes, iguais às outras que eu já descrevi. A folhagem dessas árvores fica bem lá em cima, bem distante de mim. Elas são como mastros imensos. Eu vejo casas, agora mais nítidas. Os telhados são vermelhos, elas são brancas. O sol amarelo toca o horizonte lá no fim da estrada. Eu bato à porta de uma das casas, mas ninguém atende. Eu me viro e vejo que sombras se aproximam, vindo do mesmo caminho de onde eu também vim. Parecem ser duas pessoas... Eu fico com medo e corro até um homem que está cavando um buraco no chão, num campo não muito longe. Eu vejo o homem se afastando em direção a um boi coberto de sombras. O sol havia desaparecido. O céu estava carregado de nuvens escuras.

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