Capítulo III

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Impulsiva por natureza, Sakura dessa vez pensou antes de agir, pois não devia entrar numa discussão sem sentido com um estranho que podia muito bem ser um bandido e, embora ele exibisse um sorriso, seus olhos negros a intimidavam de certa forma. Eles eram como olhos de uma ave de rapina, pronta para lhe atrapar, então pigarreou antes de disparar:

— Não é preciso ouvir a versão dos assassinos quando se pode contar os cadáveres de suas vítimas. — respondeu rebatendo o olhar fixo e intenso que ele a transmitiu e foi ele quem desviou desta vez.

Sentindo uma espécie de gosto por sua pequena vitória, Sakura virou as costas de cabeça erguida, com sua pose inabalável e sem dar tempo para uma réplica. Ainda assim, ouviu um riso rouco vindo do estranho. Seus cabelos cor de rosa soltos ao vento, deram um efeito dramático à situação, se não fosse por seu vestido verde musgo surrado, ele poderia jurar que aquela se tratava de uma princesa de um reino influente.

Ao voltar para casa, Sakura tremia de raiva ao imaginar que o homem que tinha matado o seu pai poderia estar tão próximo, era revoltante demais para suportar e sua vontade era dar ao culpado um sofrimento ainda maior do que o que ela e a mãe enfrentavam todos os dias.

Sua mãe já estava deitada quando entrou na casa, mas a filha fez questão de deixar um beijo em sua cabeça e sussurrar o quanto a amava, pois realmente não tinha mágoas dela.

Preparou sozinha a receita para ser comercializada no dia seguinte e depois, foi dormir em seu colchão de palha nada confortável para se preparar para o árduo trabalho. De manhã, despertou agitada, não se lembrava tão bem do sonho que tivera na noite anterior, porém de uma coisa tinha certeza: nele havia vislumbrado os olhos negros como a noite do estranho que encontrou no porto, aparentemente a primeira impressão que tinha a respeito do jovem tinha a marcado mesmo.

— Está tudo bem, Sakura? — sua mãe perguntou ao ver sua expressão incomodada logo cedo.

— Está sim, foi só um pesadelo.

O silêncio perdurou e o coração de Sakura doeu ao ver a expressão culposa na face de sua mãe, Mebuki parecia querer dizer algo, mas era como se não soubesse como, para ela, a gravidade de seu feito era inesquecível e horrível o bastante para ser perdoada pela filha, contudo Sakura não pensava assim e o demonstrou quando veio ao seu encontro e a envolveu com seus braços finos.

— Filha, eu... — lágrimas escapavam de seus olhos, as mesmas que ela poupava a todo momento para não demonstrar sua fraqueza na frente de Sakura.

— Está tudo bem, mamãe.

Acariciou o rosto e enxugou as lágrimas de Mebuki, a ternura do ato pareceu amenizar o sofrimento presente na face dela, ainda que as cicatrizes e as marcas de suas experiências ainda continuassem ali.

Aquele foi um dia bem produtivo para Sakura, ela atendeu tanta gente, viu tantas pessoas distintas e para o seu bem-estar, não ouviu mais nenhum boato sobre os piratas. Voltou para casa com o sol já se pondo e o caldeirão vazio, no entanto, sua satisfação foi momentaneamente interrompida ao constatar novamente a presença da carruagem de Itaroshi parada diante da sua casa.

Estranhou a falta de vizinhos enxeridos e constatou que o filho dele também não estava na condução, provavelmente tinha descido para azucrinar a vida dos outros aldeões, o que dava uma pequena folga para Sakura, a quem também o desprezava tanto. Entrou na pequena casa de apenas um cômodo, tinha deixado seu caldeirão do lado de fora, então o barulho não foi o suficiente para interromper a ação que se seguia, seus olhos se arregalaram assombrados com a cena que presenciava:

O homem tentava segurar Mebuki a todo custo pelos pulsos, seus braços roliços faziam os da mulher parecer ainda mais frágeis e inofensivos, ele gritava para que ela ficasse quieta, enquanto a mulher se debatia debaixo dele.

A Cerejeira dos maresOnde histórias criam vida. Descubra agora