Laranja II 🍊

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- Darcy ficou sentado durante alguns instantes e depois, levantando-se, pôs-se a caminhar pela sala - Jenne leu para Emmy, que encontrava-se dormindo, num sono sem sonhos, ainda em coma - Elizabeth ficou espantada, mas não disse nada - Jenne continuou a leitura - Depois de um silêncio de alguns minutos, aproximou-se agitado, e disse: "Em vão tenho lutado comigo mesmo; nada consegui. Meus sentimentos não podem ser reprimidos e preciso que me permita dizer-lhe que eu a admiro e amo ardentemente".

Jenne pousou o livro Orgulho e Preconceito em cima da mesinha ao lado da cama de Emmy, fitando a garota.

- Agora eu entendo porquê você gosta tanto desse livro - falou.

Já havia virado rotina esses monólogos com Emmy. Haviam se passado 21 dias desde que a garota havia entrado em coma. Todos os dias depois das aulas, Jenne passava as tardes no hospital, a diretoria do internato estava sendo muito compreensiva quanto ao caso e, quando Diana insistia um pouco e a diretora Lucy permitia, Jenne também dormia lá, para fazer companhia à outra.

- Sabe, você não vai acreditar no que eu comprei na lanchonete do hospital hoje de novo - Jenne fez uma pausa, como se esperasse a outra responder - suco de laranja - Jenne pegou o suco na bancada e apontou na direção de Emmy, mesmo que a mesma estivesse de olhos fechados e não pudesse responder - posso te confessar algo? - Jenne sentou-se ao lado de Emmy, abrindo o suco de laranja e tomando um gole - eu odiava suco de laranja quando você me deu na sua casa, só aceitei porque foi você quem me ofereceu - outro gole - mas aí você teve que ficar aqui nesse hospital e, desde o primeiro dia, quando fui na lanchonete, tinha suco de laranja. Lembrei de você nos servindo, suas mãos trêmulas, lembro de ter me perguntando porquê você estava tremendo, eu não sabia que você tinha dificuldade com a coordenação motora. Mas lembro que por algum motivo fiquei feliz por você ter conseguido nos servir sem derramar nada. Eu me orgulhei de você.

Uma lágrima solitária desceu pela bochecha de Jenne.

- Eu tenho orgulho de você, sabia? Pelas coisas grandes, como o fato de você sempre tirar A+ em álgebra, e pelas pequenas também, como quando você consegue servir o suco sem derramar. Todos os dias você se supera. Já passou por tanta coisa e continua perseverante - Jenne colocou o suco de lado, pegando a mão de Emmy, dando um beijinho - você é a sorte da minha vida.

Quando encostou a testa na mão de Emmy, alguém bateu na porta.

- Entre - Jenne pediu, enxugando o rosto.

- Jenne, oi - Ana cumprimentou - já está dando a hora de você voltar para o internato.

- Oh, sim - Jenne olhou a hora no relógio de parede. 16h:39 - posso só me despedir dela? - Jenne pediu.

- Claro - Ana disse, sentando na poltrona que ficava no canto do quarto.

Jenne se aproximou de Emmy, fazendo carinho no rosto da garota.

- Meu amor, eu tenho que ir agora - Jenne beijou a testa de Emmy, pegando sua mão - amanhã à tarde eu venho e...

Como se fosse fruto de sua imaginação, Jenne sentiu Emmy apertar sua mão brevemente.

Podem ser só reflexos, Jenne pensou, não querendo alarmar Ana.

- Amanhã à tarde eu venho e continuo o livro - a voz de Jenne estava trêmula - está me ouvindo? - Jenne sussurrou no ouvido de Emmy, que novamente apertou sua mão, dessa vez com um pouco mais de força - dona Ana, ela está se mexendo - Jenne avisou, pálida.

- O que? - Ana levantou de onde estava, se aproximando.

- Segura a mão dela - Jenne pediu e assim Ana o fez - amor, você está ouvindo?

- Eu não senti nada - Ana disse, sentindo uma pontada de desapontamento e inveja para o caso de Jenne ter sentido algo e ela não.

- Amor, eu tenho que ir, você está me ouvindo?

- MEU DEUS! - Ana exclamou - ela está ouvindo! Ela está mexendo! Chama o médico!

Tão rápido quanto podia, Jenne avisou à primeira enfermeira que viu, que avisou ao restante do hospital, incluindo ao médico de plantão. O médico logo estava no quarto, com uma lanterna nos olhos de Emmy.

- Bem, quando a pessoa está em coma profundo, como a Emmy estava nos primeiros dias, ela não está consciente, por isso não sente, não se mexe e não ouve - o médico começou a explicação - porém, existem vários níveis de sedação, que dependem da dose do medicamento, por isso, quando a sedação é mais leve, como a da Emmy agora, é possível ouvir, se mexer ou interagir.

- Você quer dizer que ela está nos ouvindo agora? - Jenne perguntou, boquiaberta.

- Muito provavelmente - o médico respondeu - e mais, digo que logo ela estará acordando.

- Meu amor - Jenne pegou a mão de Emny - você está aqui, eu sabia! - a mão de Emmy mexeu levemente - muito obrigada, muito obrigada, amor. Obrigada por voltar, eu sabia que voltaria!

Naquela noite, Jenne não voltou ao internato. Ficou acordada à base de suco de laranja e Emmy, conversando com a outra, dessa vez com a certeza de que não estava sozinha. Vez ou outra recebia uma confirmação, através de um breve aperto, de que não estava só. Nesses momentos, sentia seus olhos inundarem. Além disso, seu coração, seu coração também se inundava, se inundava com a certeza de que logo estaria conversando com sua Emmy. Logo estaria em seu lar.

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