Capítulo 2 🖤🤍

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- Mãe! - Aurora chamou, já entrando em casa de forma animada, estava tendo dias tão felizes e nem mesmo sabia o motivo de tanta alegria.

- Aurora. - A mãe gritou em resposta, estava no andar de cima, arrumava alguns escritos que tinha e os transcrevia de forma correta para um caderno azul que havia feito. Sua cama tinha papeis de todos os tipos, até guardanapos com anotações antigos e borrados.

A filha parou no batente da porta e a olhou, um sorriso singelo no rosto.

- Estou de volta.

- Está contente. - Murmurou entre olhares para os papeis e para a filha. Dolores já tinha se acostumado com a alegria de Aurora todas as vezes que chegava do acampamento de seu pai, a fazia ficar viva, mais do que já era.

A mulher mais velha acreditava que seu bom humor era constantemente alimentado pelos momentos em que entrava em sua primeira cultura.

- Oh, ultimamente estou tão contente que até temo que isso acabe, mesmo sabendo que tudo tem fim. - Falou rapidamente, chegando próxima a mãe e a dando um beijo na testa.

Se sentou na cama, analisando toda a bagunça sobre os lençóis.

- Você realmente parece que está ficando velha...

- Não pode falar nada de mim, é pior que eu muitas das vezes. - Declarou, puxando os óculos para os cabelos fazendo com que Aurora soltasse uma rápida risada, mas logo ao olhar para a mãe teve uma leve seriedade no rosto.

- Papai está bem... - A mulher mais velha nada disse, quase nunca conversavam sobre Hanzi de forma aberta, mas Aurora era perspicaz, sabia que os dois ainda se amavam e sua tia Mercedes apenas fortalecia sua crença de que sim ao contar-lhe em tom secreto o quanto Hanzi ainda sentia imensa falta da antiga esposa, mesmo que esse não precisasse falar nada.

- Ele não disse muito, sabe como é meio calado as vezes com o que é sério, mas eu sei que se controla para não perguntar sobre você todas as vezes.

- Hanzi sempre foi um bom homem.

- E você sempre foi uma boa mulher.

- Sua tia, como está?

- Ela me deu esse anel. - Aurora mostrou a mão cheia de anéis, havia ganho um de Rubi, a pedra grande o suficiente para atrair olhares até mesmo furtivos.

- Lindo...

- Ela sempre foi meio exagerada, tia Mercedes. - Dolores riu.

- Nem comece, sempre gostou do exagero dela com você, te concedeu muitas joias desde pequena e sempre as amou.

- Não sou de ferro mãe, claro que sempre adorei, mas não me mostro por isso, são joias, bastante valiosas, mas no final são somente isso.

- Em certos momentos fala como seu pai.

- Está no sangue. - Disse se levantando e esticando o corpo, usava uma saia vermelha, nem justa nem larga e uma blusa branca que mostrava seus ombros, uma flor de igual coloração nos cabelos e brincos de argola, os pulsos com pulseiras e os dedos cobertos por anéis.

- Preciso de um banho mãe e de um descanso por hoje. É manhã, mas festividades pra eles duram tempo que ainda não estou completamente acostumada, juro por Deus, se fosse eu a casar não conseguiria ficar três dias em celebração, pegaria meu noivo e provavelmente sairíamos às escondidas.

- Seu pai te escuta falar essas coisas assim como eu Aurora?

- Oh, meu pai sabe a filha que tem. - Comentou brincando e se pôs a sair, no batente da porta sua mãe a chamou.

- Quem te trouxe de volta?

- Igor me trouxe, de carro.

Estava ali outro costume, mulheres normalmente não saiam sozinhas do acampamento, Mercedes era uma das que somente saia com Hanzi ou algum outro acompanhante de extrema confiança.

- Ah sim, seu...

- Meu antigo prometido mãe.

- Ainda acho estranho a família dele ter deixado que mantenha contato com você. - Aurora deu de ombros, não pensava muito nisso, nem queria pensar se fosse honesta consigo mesma, era o que era e ponto final.

Trocaram mais algumas palavras e Aurora saiu, indo em direção a seu quarto, onde tirava cada joia de si, uma por uma, as guardando na caixa marrom que tinha sobre uma mesinha pequena próxima a seu piano de armário amarronzado, para então ir ao banheiro.

Cansaço resumia seu corpo, agitação sua alma. Enquanto a água morna a abraçava pensava nos deveres que tinha, nas coisas que desejava escrever e nas aulas que pretendia dar no conservatório. Havia mudado alguns planos, queria ensinar mais crianças, amava a energia que seres tão puros conseguiam passar pra si e desejava abrir uma academia somente para eles. Sorria abertamente com a ideia de ter algo com seu nome para ensinar piano e sua vontade de criar imediatamente algo assim apenas vinha com mais determinação.

Era um dos registros de personalidade de Aurora, determinação, quando tinha algo em mente não parava até que conseguisse realizar.

Ficou por alguns bons minutos imersa em pensamentos e na água que relaxava seus músculos, observando as pequenas gotinhas trilharem caminho em seu corpo.

Assim que terminou vestiu uma calça leve, uma blusa de alça por cima e fez um rabo de cavalo no cabelo, pegou um lápis e se sentou no banco do piano. Estava exausta, mas antes de pensar em cair em um sono profundo necessitava de compor, tinha uma melodia em mente, a criou no acampamento, na madrugada antes de ir embora. Aquele era o lugar onde tinha toda sua intensidade exposta, coisa que atiçava sua criatividade e seus desejos em um ponto que não sabia ao certo como explicar.

- Vamos lá. - Murmurou pra si mesma, começando a dedilhar algumas notas e acidentas do piano tentando criar a mesma melodia que tinha em mente, anotava o que achava que seria um avanço, criando sua própria partitura. Dolores no quarto ao lado escutava a improvisação da filha e sorria sozinha, sempre deu apoio para que a menina tocasse, gostava de ver sua filha tão centrada em algo, muitas das vezes ficava ao batente da porta e a observava, Aurora quase sempre não notava sua presença e a forma como ela se perdia nas coisas era algo que enchia o coração da mãe, Kalitch mergulhava facilmente naquilo que amava e se permitiu ficar nisso por quinze minutos, decidiu com esse tempo que ficou satisfeita com a parte inicial tão facilmente criada, teria alguns óbvios arranjos e bastante progresso a se fazer, mas sua cabeça estava com um funcionamento lento demais para que tudo ficasse em perfeito estado.

Apenas deixou a partitura no suporte e deitou na cama, sempre deixava uma coberta dobrada em seu pé, mais prático, ela pensava, se cobriu e mergulhou em um sono profundo.

As horas se passavam e Aurora permanecia dormindo, já toda torta pela cama, mas pelas 15:30 um homem alto e de terno passou pela sua rua, esse andava tão rapidamente que nem notava muito as coisas ao seu redor, tinha as mãos nos bolsos e uma postura altiva e fechada, que não demonstrava o que era verdadeiramente por dentro.

Assim que ele passou por sua porta, mesmo em meio a distrações mentais tão grandes sentiu algo de diferente o suficiente para parar seus pés, virar levemente a cabeça e olhar a casa de madeira branca com dois andares, foi exatamente neste momento que Aurora sorriu em meio ao sonho, um fator que nenhum dos dois notariam nunca, muito menos saberiam que se reconheceram sem precisarem se ver, mas havia alguém que cuidava meticulosamente de todas as coisas, e a cada sinal que via ser positivo sobre suas tentativas desconexas de aproximação ele zelava mais pelas duas existências.

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