Pausa para café

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  Hunter estava debruçado na varanda das traseiras do "Bloody Apple Mary". Era um café muito famoso e frequentado. Eles conversavam sempre nos fundos porque só lá passavam empregados para descarregar carrinhos com loiça suja. Mas normalmente só faziam isso na hora de fecho por isso era uma área deserta.

  Mas para que é que um rapaz que o mundo achava que estava morto precisava de tanta descrição?

  A resposta chegava com dois copos de sangue de maçã.

  - Olá principezinho!

  Darius era um homem com cerca de 40 anos, alto, de pele escura, olhos verdes e um estranho cabelo feito de abominação que tinha um espécie de coque alto. Era conhecido pelos outros membros do RATS como Afton.

  Passou um dos copos ao rapaz de cabelos esbranquiçados.

  - Sangue de maçã com olho num copo frio, como tu gostas.

  Hunter esboçou um sorriso de agradecimento e agarrou o copo com as duas mãos, sem mesmo levanta-lo do parapeito.

  Darius reparou na expressão preocupada do miúdo.

  - Então, porque é que me chamaste? Foi difícil sair do castelo. Os guardas estão em alerta máximo, revistam toda a gente que entra ou saí do castelo.

  Hunter parecia mais interessado em estabelecer contacto visual com o olho que boiava no seu copo. Finalmente, disse alguma coisa.

  - Como vai o novato?

  Darius suspirou. Sempre que se viam, ele fazia a mesma pergunta, e Darius odiava ter de lhe responder.

  - Um pouco nervoso, como todos no castelo. - deu um gole e tentou fugir do assunto. - Mas não me chamaste aqui para falar do atual Guarda Dourado, pois não?

  Foi a vês de Hunter suspirar.

  Hunter tirou da capa o pequeno diário de couro e colocou em cima do parapeito.

  - É o diário do Phillip...

  - Queres dizer o Belos, certo?

  Hunter assentiu com a cabeça e começou a explicar a sua teoria, enquanto folheava o diário.

  - A Luz, a miúda que nos está a ajudar, é uma humana que veio do mundo humano. Ontem, enquanto estávamos a jantar, ela contou-nos que tinha chegado a Boiling Isles porque atravessou um portal em forma de porta com um olho e agora estava presa aqui porque o portal foi destruído. - parou numa página e apontou para uma ilustração. 

  Darius olhou para a figura. Por mais que fosse um esboço feito a preto e branco, notava-se perfeitamente uma porta com um olho. Ao lado, estava escrito "Portal".

  - Certo... Mas portais para o mundo humano são algo raro e difícil de fazer. 

  - É verdade, mas repara. Ela faz magia, mesmo não tendo um saco de bílis, usando uns desenhos chamados glifos - mostrou-lhe o glifo que Luz lhe tinha dado - Se tocarmos nisto, transforma-se numa bolinha de luz.

  A afirmação que Hunter fez Darius levantar o sobrolho. Para provar o seu ponto, o rapaz tocou no desenho, transformando-o numa pequena bola de luz, coisa que espantou o homem, que sabia perfeitamente que Hunter não conseguia fazer magia naturalmente.

  O miúdo de capa vermelha voltou a folhear o diário, tendo o cuidado de passar as páginas que seguravam uma folha solta que Hunter não fazia questão de rever. Parou na página em que estava desenhado um enorme glifo de luz.

  O chefe do coven de abominações observou o glifo. Tal e qual o que Hunter usara.

  - Ela diz que têm uma mentora chamada Eda, a mulher coruja. Lembraste da mulher coruja?

  - Sim... Era aquela mulher que quase foi petrificada mas o Belos cancelou a petrificação à última da hora.

  - Exato! Não achas estranho que uma humana, tal como o Phillip, chegue a Boiling Isles por uma portal igual ao do Phillip, que faz magia tal como ele e que as pessoas especiais para ela são perdoadas de todos os seus crimes.

  Darius inspirou.

  - Estás a sugerir que a humana é uma cúmplice do Belos?

  Hunter fez que sim com a cabeça.

  - Hunter, isso não faz sentido. Primeiro, pelo que tu me disseste, vocês conheceram a humana quando ela estava a fugir dos guardas. Coisa que não faria sentido se ela fosse comparsa do Belos. Segundo, porque é que ela ficaria com vocês. Sendo a "segunda Guarda Dourada", provavelmente teria mais coisas para fazer?

  - A missão dela podia ser espiar-nos. E toda a cena da fuga para ficar mais realista. 

  - Era muito improvável vocês ajudarem, e como é que iam saber que vocês iam estar lá? Além disso, para que é que ela te ia espiar, se o Belos acha que estás te a decompor no fundo da cabeça do Titan?

  - O Hunter está morto. Mas o Pássaro Escarlate e a Abomigata não. 

  - Correto...

  Darius e Hunter deram um gole na bebida, exatamente ao mesmo tempo.

  - Raine não tinha pedido À Amity e à Luz para sabotarem os Abomatrons do Alador. 

  Hunter fez que sim com a cabeça. A sua cara voltara a ser melancólica, preocupada.

  Afton reparou nisso, e tentou consolá-lo.

  - Olha, - colocou a mão no ombro dele para confortá-lo - se a humana fosse mesmo uma espiã, já vos tinha denunciado quando estavam a dormir.

  Hunter fungou e forçou um sorriso.  

  - É, ela definitivamente não dava para Guarda Dourada. 

  Deu um gole e mudou abruptamente de assunto de tema de conversa.

  - Não queres que te entregue as poções agora?

  - Não vai dar, vão revistar-me e tenho uma missão de dois dias na Anca Esquerda.

  - Partes quando?

  - Daqui a uns... - desenhou um círculo no ar, criando um relógio de abominação - 35 minutos.

  Fez uma pequena pausa.

  - Eu volto depois de amanhã por volta do meio-dia. Quando voltar encontramo-nos aqui e bebemos um copo (de café) para celebrar o sucesso das nossas missões, pode ser?

  Hunter sorriu e brindou com o seu copo. Após acabar o café e quase se engasgar com o olho, despediu-se de Darius.

  - Bom, tenho umas compras a fazer e tu tens de te preparar para a viagem. Vejo te daqui a três dias.

  - Não te metas em sarilhos! - gritou Darius, pois o rapaz já se tinha afastado. 

  - Vou tentar!!!

  Ficou a vê-lo afastar-se ao longe. Aquele miúdo tinha feridas muito profundas que preocupavam-no. Darius tentara sempre anima-lo para que as feridas sarassem mais depressa, mas cortes acentuados não se curam com pensos rápidos. Ele continuavam o mesmo miúdo magoado que ele encontrara escondido nos fundos de uma padaria. Estava melhor? Estava...

  Mas ainda tinha pesadelos com aquela ponte.

  E esses pesadelos não iriam passar enquanto Belos continuasse a poder magoá-lo.

  E Darius sabia disso.

  O que ele não sabia, é que aquela podia ter sido a última vez que ele teria visto Hunter com vida... 

Dois criminosos e uma humana: o que pode correr mal? (Um multiverso de TOH)Onde histórias criam vida. Descubra agora