Querido diário, por vezes a ideia de fugir de nossos deveres é assustadora, crescemos sendo ensinados que tudo tem seu lugar. Se eu não sou alguém indefesa, se Hill Valley não é uma cidade comum e pacata, se Artemi não foi alguém falsamente acusada. Bem, então o que somos?
Buscar um novo propósito é algo tão difícil e desafiador, que por vezes preferimos as correntes, mesmo que lá no fundo tenhamos a chave.
Trecho do diário de Charlotte
5 de maio de 1913Charlotte não queria fazer aquilo, não queria ter de ir até ele, queria poder deixá-lo processar tudo em seu tempo. Mas acontece que estava demorando demais, tinha de falar com seu pai agora.
Terminou de juntar coragem e bateu na porta do escritório de Lorenzo, a ansiedade a consumia do dedo mindinho até a ponta dos fios de cabelo, enquanto esperava que ela fosse aberta.
Foi a primeira vez que viu seu pai como alguém de presença pesada, normalmente ele tornava todos os ambientes mais agradáveis, ao menos na visão de Charlotte.
Precisou novamente juntar coragem para fazer seu discurso sobre como ele estava sendo egoísta, e sobre a necessidade de que ele fosse sincero.
— O que você espera de mim? — Lorenzo perguntava enquanto se jogava em sua poltrona, parecendo completamente exausto.
Ele apenas a encarou com pesar, durante sua explicação sobre suas recentes "aventuras". Levou alguns minutos após o fim de sua história, para que seu pai desse sinal de presença.
— Eu entendo, entendo mesmo. — começou Lorenzo. — Também tentei muitas coisas quando mais novo, mas acabei percebendo que era inútil e exaustivo me dedicar a isso. Pardalzinho, você é jovem assim como eu era, já é injusto que tenha de lidar com as consequências de um erro que não foi seu, não deixe que isso lhe tome tempo de vida.
— C-como? — Charlotte lutava para dizer, não acreditando que seu pai estava agindo de uma forma tão tranquila quanto a isso. Como podia? Como não lutava contra? Conhecia Lorenzo, ele não era um covarde! Ao menos não deveria ser.
— Pardal, você precisa focar em outras coisas, isso não é sua culpa e você não é um monstro. Qualquer transformação que você possa vir a ter não dirá o contrário.
— É óbvio que sou um monstro! — foi tudo o que ela conseguiu dizer, precisou se apoiar a mesa de seu pai para se manter em pé. Como ele podia achar aquela vida aceitável? Como podia esperar que ela machucasse as pessoas sem se culpar?
— Você é muito nova e emocionada, apenas isso, confesso que provavelmente tenho culpa nisso, você me puxou em muitas coisas. Olha, com o tempo você vai começar a entender melhor esse seu lado e vai perceber que não tem nada de mais.
— Vo...você, você realmente não se importa de acabar ferindo alguém? — a única coisa capaz de ser ouvida era a indignação que Lotte carregava na voz. Ele não deveria ser capaz de machucar um passarinho!
— Ah, é disso que se trata não é? Esse medo besta, também o sentia no início. Eu não sou o melhor para acalmar temores, por isso mesmo não queria ficar a encargo disso, o que eu sei que foi algo egoísta.
Lorenzo se aproximou de Charlotte, que ainda se via escorada na mesa do mesmo, duvidando de sua capacidade de ficar em pé sem um apoio. A pegou as mãos e lhe lançou um olhar que ela já conhecia bem e sabia o que dizia. "Me desculpe".
— Você não tem de se preocupar em perder o controle, é a pessoa mais equilibrada que eu conheço.
Foi então que ela entendeu, agora sim isso fazia sentido. Ele não estava tratando por normal o fato dela ter matado uma pessoa.
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OS SEGREDOS DE CHARLOTTE JOHNSON
Teen FictionAlgumas pessoas nascem para brilhar e outras nascem para habitar as sombras. Charlotte Jhonson estava certa de que se encaixava na segunda opção. Entre florestas obscuras, lugares místicos e cidades no meio do nada. Charlotte irá descobrir que muita...