Kya era a vocalista da Browns, uma banda indie de um grupo de jovens negros que, de um dia pro outro, viralizou nas redes sociais e se tornou um sucesso mundial. E não, não é exagero. Nem papo de fã. Eu juro.
Tudo começou com um vídeo gravado dentro de um quarto minúsculo na zona norte. Algo espontâneo e divertido, de poucos minutos, que mostrava exatamente o que eles sabiam fazer. E sabiam mesmo, embora não tivessem papais empresários para investir em seus talentos. Não foi preciso, afinal, porque tudo que eles precisavam era serem vistos: quatro desconhecidos misteriosos, com um certo molho diferente e picante, e muita originalidade. Originalidade, sim!, na rede das trends. Dá pra acreditar? Nem era preciso dizer o quanto o talento do grupo era hipnotizante, porque a quantidade de views só cresciam e falavam por si só.
A banda conectava diferentes gêneros musicais, elementos da cultura afro-brasileira e diversas línguas, tornando tudo uma coisa só. Além dos figurinos e maquiagens ousados e super produzidos que realçavam sua estética afrofuturista, os quatro jovens serviam beleza, carisma e personalidade. E é claro que o público, carente por essas três qualidades no meio artístico, desejou imediatamente explorá-las ao máximo. Então, em pouco tempo, a Browns ganhou palcos diferentes do que o chão de taco de um dormitório alugado, telas de tamanhos maiores e ao invés de uma só câmera, centenas de lentes viradas para eles Brasil afora.
Eles eram como irmãos, implicantes como os jovens que eram, mas sempre unidos e em harmonia. Sua arte era construída em cima de uma amizade de anos, ligados pela ancestralidade e amor pela música, o que aquecia aquecia os corações dos fãs, que colecionavam fotos e vídeos em seus perfis.
Mas a verdade era que só um deles podia ser o preferido. Quer dizer, só uma.
Tínhamos o Elias, o mais velho. Dono de um sorriso torto de enlouquecer qualquer pessoa, formado em Engenharia e ícone da comunidade bissexual. Ele tocava diversos instrumentos, principalmente os mais clássicos, como piano e trompete. Protagonizava solos inesquecíveis seus durante os shows, como quase um minuto tocando violino na faixa principal do primeiro albúm — um R&B que lhes rendeu diversos prêmios e a estreia no Rock in Rio. Estava sempre com mantos africanos e cabelo crespo super volumoso.
O Talib era mais dos instrumentos eletrônicos. A maior parte do tempo tocava guitarra, mas também curtia cantar em dueto e backing vocal. Seu visual era repleto de detalhes espelhados, metalizados e furta-cor, usava um óculos cyperpunk que quase cobriam todo seu rosto e waves no cabelo descolorido. Antes da banda, ele trabalhava como DJ em casamentos para sustentar o pequeno Kaíque, de quem havia sido pai adolescente. Era o pai solo mais cobiçado dos últimos tempos.
O Simon trazia toda parte acústica e as fortes referências da favela e de religiões de matriz africana, que faziam parte da sua vida. Ele tocava do violão ao atabaque e também fazia trechos de rap. Era como o caçula do grupo e considerado o mais fofo pelas fãs. Constantemente mudava os desenhos de suas tranças nagô e estava sempre com a proteção de suas guias em seu pescoço.
Porém, embora os três fossem crushs de toda uma geração, ninguém poderia discordar que não haviam olhos pra qualquer outra pessoa quando Kya entrava em cena. Ela era o momento. Um meteoro que caiu em nossas adolescências e mudou tudo. A garota usava um cabelo diferente a cada show, ia para premiações de minissaia e casaco de pelúcia, tinha os sapatos mais extravagantes feitos só pra ela e era chamada de Aretha Franklin da nova geração.
Todas as garotas queriam ser ela.
Incluindo eu.
O que posso dizer, em minha defesa, é que eu não era como as suas outras fãs, levadas pela tendência. Não mesmo. Eu acompanhava a Kya desde que ela fazia covers da Rihanna e da Sza no YouTube. Desde quando ela escrevia suas próprias músicas esquisitas, as gravava com o próprio celular e lançava em plataformas de som duvidosas. Eu já a amava desde o princípio. Então, é claro que eu senti uma pontada de ciúmes quando todos a descobriram. E, no fim, estava certa em ser egoísta.
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Cada Segundo
RomanceLola quer escapar da sua vida de qualquer maneira. Com a ajuda do seu namorado, Bryan, a garota planeja se casar após se formar no ensino médio, para enfim sair de casa e se livrar da sua mãe, com quem possui uma relação desafiadora. Porém, Lorena R...