Eu não sabia dizer se era alívio ou medo, aflição, só foi tão natural a forma como seu nome saiu de meus lábios que simplesmente fingi não me importar quando os olhos recém chegados me miraram.
Eu não sabia ler aqueles olhos como quem lia poemas, mas ali dentro enxerguei uma devasta poesia que perambula pelos sentimentos mais profundos e enraizados num coração. Lá dentro parecia chover, mas no fim o sol ainda permanecia estrela existente em seu mundo e ele sorriu com o canto de cerejeiras.
– Você se lembra disso?
– Eu… sim, eu, uh…
– Isso é bom – interrompeu. – Eu gosto muito desses pompons. O amarelo é o meu favorito. Foi você que fez.
Eu não tinha os detalhes, como poderia, mas a lembrança translúcida se fez presente no momento em que vi pequenos pompons caindo como se formassem uma cordinha pendurada naquele teto banhado em nostalgia apagada. Eu sorri, lembrei dos tempos de oito anos, tempos de escola e de horário vago para brincar com lã e com tudo o que tínhamos direito.
– Eu nem percebi que você gosta de amarelo.
Yeonjun, o mesmo Yeonjun que usava jaqueta amarela e roupas pretas. O mesmo Yeonjun cujo seu canto de lar tinha paredes manchadas em amarelo velho e adesivos de parede de patos amarelos e lagos azuis bem lá no canto, como se tentasse esconder sua essência infantil, com um abajur de cogumelo ao lado do computador, o mesmo abajur que acendia amarelo de conforto outonal em um sol que beirava toda sua existência acalentadora.
Ele não me respondeu, ao invés disso ele preferiu me julgar com seu silêncio de quem não tinha mais nada para dizer, silêncio de florestas à meia noite, se sentou ao meu lado naquela cama e finalmente pude perceber o balde de pipoca caramelizada em suas mãos macias de pelúcia.
– Eu espero que você goste de pipoca, porque só tem isso. – Eu ia concordar, ainda que eu não gostasse de pipoca, porém ele continuou falando e, até certo ponto, eu gostaria de ouvi-lo falar por horas. – Quando você se lembrou de mim, Soobin?
Tantas questões e quase nenhuma resposta, esse era o meu mundo e o mundo de tantos outros e, talvez, até mesmo o mundo de Choi Yeonjun.
Quando foi, mesmo? Quando foi que liguei seus olhos castanhos aos olhos que vi em sonhos laranjas, lembranças longínquas como o fundo do oceano e tão serenas quanto a manhã do primeiro dia de inverno? Quebradas, dilaceradas e rodando para sempre em algo que, por muito tempo, quis esquecer de me recordar.
– Foi naquele dia que eu te levei pra casa. Quando você começou lá, no posto de gasolina.
– Engraçado, no dia em que fui embora você também me levou pra casa.
– Eu não lembro muito bem.
– Você considera isso bom ou ruim?
– Eu considero ruim, tem tantas coisas que eu… que eu só gostaria de lembrar.
– Eu considero bom, tem tantas coisas que eu gostaria de esquecer. Toda memória é um pedaço de morte até que você aprende a vê-la com olhos de vida, até que você aprenda a enxergá-las através de fotos que só são inexistentes. Toda memória é boa até que seja esquecida. Todo esquecimento é bom desde que não seja lembrado. Memórias matam e também ressuscitam. Eu morri um dia por causa delas.
– Hyung…
Eu não sabia o que responder, palavras ou olhos que brilham em lágrimas que não derramei. Ele me observou por segundos de fim e abaixou seus cílios como sempre fazia, então jogou-se de mãos sobre a barriga e assim tornamo-nos dois seres de existência breve deitados próximos um do outro, como quem deita na grama verde e olha para um céu azul de dias felizes e noites de Van Gogh.
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Inefável
FanfictionEu o puxei sem segundas intenções, deixando que ele deslizasse por entre minhas pernas, era sem intenções de torná-lo meu, sem intenções de deixá-lo ir. O que é a vida senão retornar para os lugares dos quais não queríamos ter ido embora? A vida ain...