quatro

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Eu cheguei naquele lugar que chamei de lar e só então descobri que, na verdade, aquele número era um número diferente daquele que estaria normalmente no cartão do cabeleireiro. Na hora achei estranho, esquisito, curioso. Por que mais Jun precisaria de uma caneta senão para riscar e adicionar outro número? Fui meio lerdo e continuei sendo por auroras sem fim, até que tudo fez sentido e eu adicionei aos contatos.

Jun provavelmente hyung.

Quando voltei outra vez para aquele lugar com cheiro de gel e homem de academia e adentrei as portas do paraíso foi que descobri que deixou de ser um. O cara que estava lá era outro, apesar do recepcionista ser o mesmo garoto de olhos de pêssego e cabelos brancos. Eu questionei ele naturalmente, mas pensando agora com a mente um pouco mais límpida, águas de caverna, era tão provável que eu não tivesse sido tão natural quanto pensava, me assustei.

– Ele foi mandado embora. Também queria.

Pessoas são mandadas embora de muitos lugares em diferentes estados da vida mundana, do trabalho, de casa, até mesmo de presenças. Eu já fui dispensado diversas vezes, por pessoas não me atreveria a comentar, foram fantasmas da mente, inexistentes, nunca fui muito sociável e até me arrependo, mas de empregos, foram diversos. Então… por que aquela frase foi tão incômoda? A expectativa criada em relação ao futuro passageiro em tempos de espera não era dádiva, era nada mais do que castigo.

Eu me sentei naquela cadeira e deixei que um homem que para mim não passava de um homem qualquer cortasse os fios e passasse a máquina. Curto, raspado na nuca, mais curto do que tudo que já fiz antes, ainda que não mudasse muita coisa. Era um pedaço de dia, estação e pedaços de mim mesmo indo embora e eu deixei que fosse, mesmo que a ida fosse curta.

Quando saí de lá feito uma pluma leviana, pensei em fazer diversas coisas, porém já sabia que acabaria em uma lanchonete de alimentos de alta propensão à gorduras e industrializados. Não era algo que me fazia feliz a longo prazo, mas a felicidade funcionava assim, eu acho, pequenos picos e pedaços quebrados de diamantes roubados.

– Ei. Você.

Eu me assustei com o chamado repentino, levei as mãos ao coração que bateu loucamente feito boxeador frustrado, como se fosse o suficiente para que eu não caísse duro feito concreto no chão em consequências de ataque cardíaco.

Não foi proposital, eu quem era muito ansioso, andando por caminhos sem rumo em altos níveis de desatenção, dispersão da mente em mundo irreais e existentes em outros planos ou universos. Virei-me, encontrei o rapaz cujo nome não sabia, mas que o apelido soava tão doce em meus lábios quando o pronunciei em altos decibéis.

– Jun?

De repente, uma explosão de fogos de artifício pôde ser ouvida, moveu alma e toda a base dela era minha por si só, era natal, ano novo, tempos de comemoração, tempos de se apaixonar por sorrisos discretos, olhares gentis e homens de suéter amarelo. 

– Ficou bom o corte. Eu gostei.

– Você acha? Obrigado. – Sorri em tons de verão e andamos lado a lado, cada um seguindo seu próprio destino enquanto o caminho permanecia o mesmo. Algo nele me passava a sensação de conforto da infância dourada e primeiro amor e saudade e toda a melancolia contraditoriamente feliz que vinha com ela. Era confortável como quartos de lar e xícaras no inverno. – Eu acho que ficaria melhor se fosse você que tivesse cortado.

– Simpático da sua parte, mas me dou melhor com cabelos longos. Pode parecer estranho, levando em conta que é uma barbearia.

– Eu… eu realmente estava esperando te ver lá. – Cocei a testa.

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