CAPÍTULO 32

207 36 5
                                        

Eu estava indo até a cabana de Gabriel ajudar a carregar pedras quando senti cheiro de carne assada e sorri. Aqueles pestinhas!
Eu fui até onde meus sobrinhos estavam e cruzei os braços fazendo a cara de mau pela qual eu era conhecido, mas eles só riram e me estenderam um pedaço. Eu balancei a cabeça e acabei comendo. Porquinhos da índia eram mesmo gostosos.
"Mas Nove não conta eles?" Eu disse olhando em volta, era um lugar bonito, uma clareira pequena com algumas árvores e um dos afluentes do grande riacho que passava pela Reserva desaguava ali. O cheiro da água, do barro da margem e das folhas eram... Chimes adoraria.
"O nosso Nove e o Nove Pai estão distraídos, a tia Breeze está aqui. Gabriel adora eles, então vamos dar esse pra ele." Eu sorri da explicação de Castor.
"Eu vim carregar pedras e ajudar." Eu disse, Polux fez que não.
"Eles já carregaram tudo. Nove e o pai dele são muito fortes. E levantar paredes não é tão fácil quanto parece, melhor deixar Nove fazer isso." Ele disse, eu olhei em volta. Eu estava ali para não ir atrás de Chimes. Eu estava a uma semana longe dela e... Eu olhei para Polux e o vi sobre o telhado da sala de treinamento.
"O que estava fazendo em cima do telhado da sala de treinamento?" Eu perguntei os dois riram, eu acabei rindo ainda contagiado pela visão. O que quer que Polux tenha feito o deixou bem satisfeito.
"Fiz meu irmão se estabacar no chão." Ele disse rindo eu me arrependi de ter rido no começo e fiz minha cara de mau.
"Não devia ter feito isso. Sheer é um ótimo irmão. Ele cuida muito bem de vocês." Eu disse, Castor franziu o narizinho.
"Cuida nada! Ele nos deixa correr por aí e nem liga pra gente." Eu encarei Castor e uma visão de Sheer andando com os dois, um no ombro, outro nos braços me veio. Depois, tive outra de Sheer correndo e eles correndo atrás e então, Sheer parou e ficou conversando com Lunna. Em outra visão Sheer conversava com Ella.
Eu vi várias vezes em que Sheer conversava com alguma fêmea e eles ficavam o esperando. Ciúmes, era isso.
"Vocês estão crescidos, podem muito bem brincar sozinhos, são dois. E Sheer está na idade de gostar da companhia das fêmeas." Eu disse, foi a vez de Polux franzir o nariz. Eu me lembrei de Honest e meu coração desejou que ele estivesse bem.
"Não ficamos atrás dele o tempo todo, mas quando ficamos sempre aparece uma fêmea!" Polux disse, eu sorri.
"Pensem que vão fazer isso com Heitor. E os outros que Lily disse que virão. Ainda faltam cinco, não é?" Eu disse, eles rosnaram.
"Nem pensar! Cuidar de um monte de filhotinhos? Talvez Lily tenha visto errado." Castor disse, mas Polux suspirou.
"Eu vi um coelho ontem perto de nossa casa. Quando mamãe engravidou de Heitor, ela os fazia subir a montanha. Acho que Remo e Romulus já estão a caminho."
Eu sorri me lembrando de Livie dizendo que daria o nome do irmão que ela mais amava para seu próximo filhote num almoço lá em casa. Esse almoço aconteceu quando Rom tinha terminado com Daisy e estava mal, triste e desanimado. Lily a lembrou de que seriam dois, mamãe sugeriu que fossem chamados de Romulus e Remo.
E na ocasião eu me senti feliz por Rom pela honra e com muita inveja de Honor por ter tantos filhotes. Segundo Lily seriam oito.
E agora meu filhote estava a caminho e eu não conseguia parar de sair quebrando a cara de quem tocou na minha fêmea.
Papai me bateu e disse que era pra eu parar de burrice. Noah me bateu e disse que eu deixasse de ser frouxo. Quinze não me bateu, mas disse que ainda devia ter muitos machos para eu bater, então me jogou para fora de casa e disse que eu terminasse logo. Peace me bateu e disse que uma gostosa como Chimes não ia ficar sozinha por muito tempo. Quando Romulus foi me bater, eu bati nele, por que apanhar de papai, Noah, Quinze e até Peace, tudo bem, mas de Rom, não.
Peter só sorriu e disse que não passou por isso uma vez que Charlie era virgem. E eu passei o resto da semana tentando domar minha visão. Por que Chimes ainda me queria, ela poderia só chutar o meu traseiro, mas ela não fez isso.
Então o problema era eu. Por que eu não via só ela abraçada, ou beijando um outro macho, mas eu a via nua, eu a via sobre os machos, debaixo deles. E pior: eu sentia o que ela sentia.
Polux limpou a área em que fizeram a fogueira, Castor pegou a carne que iam levar para Gabriel e nós fomos até as cabanas. Breeze já tinha ido embora, havia um silêncio estranho no local.
Os gêmeos deram a carne para Gabriel ele entrou em sua cabana e deve ter guardado para depois, pois saiu de novo. Nove, o filho, fechou a cara. Ele era muito parecido com Silent, ele era obediente e Livie tinha pedido a ele para cuidar dos porquinhos.
"Pegamos os mais velhos, Padrinho, eles não iam viver muito mesmo." Polux explicou, Nove balançou a cabeça.
"Porquinhos da índia vivem de quatro a oito anos. Não iam morrer tão cedo." Ele disse.
Todos olhamos para ele, ele deu de ombros.
"Livie pediu para cuidar deles, eu não ia fazer isso de qualquer jeito, estudei sobre eles, Lily me ajudou com o computador." Polux foi até ele, Nove o abraçou. Ele simplesmente amava meus sobrinhos. O pai dele ficou olhando, seu rosto sem expressão.
"Não vamos comer mais nenhum deles." Ele disse, Nove o beijou.
"Querem ir para Casa? Eu os levo correndo. Tenho de pegar algumas ferramentas que esqueci e mostrar um detalhe na planta." Nove perguntou, Castor saltou nas costas dele, Polux se ajeitou em seus braços, Nove sumiu correndo com eles. Os gêmeos riam.
Nove pai sorriu, triste, Gabriel lhe apertou o ombro.
"Ele tem tanto jeito com os filhotes! É bonitão e forte. Por que ela não gosta dele?" Ele disse para Gabriel, o médico ergueu uma sobrancelha.
"Talvez por que ela goste de você?" Gabriel disse e entrou, ele não esperava resposta.
"Você é o da outra, não é? O que está batendo em todos os machos que tocaram nela." Ele disse, eu assenti.
"Eu tenho visões..." E a pior visão que eu já tive me veio, era de Nove Pai matando um monte de humanos. Haviam mulheres e até crianças. Eu fiquei tonto, ele se aproximou, eu o soquei. Por que eu senti um pânico e um medo de morrer gigantes, além de parecer estar no meio das pessoas que ele matava e então me lancei sobre ele. Nove Pai não lutou comigo propriamente, ele só se defendeu e com isso eu o machuquei muito, eu estava desesperado, os gritos das pessoas soavam em meus ouvidos. Gabriel entrou no nosso meio e me tirou de cima de Nove Pai me segurando pelo pescoço gritando meu nome, eu uivei com tudo o que eu tinha, Nove e Gabriel taparam os ouvidos, mas eu só parei quando perdi as forças.
Eu fechei os olhos, a dor da visão me corroendo por dentro, eu sentia que a razão estava me deixando.
"Adam! Adam, olha pra mim, Adam!" A voz do meu pai chegou até minha mente, mas eu não conseguia ver onde estava, eu estava no meio dos humanos, eles corriam, mas não havia para onde irem, eu uivei de novo.
"Adam!" Alguém gritou eu não sei quem.
"Adam! Sou eu, Adam, sou eu, a Chi! Olha pra mim, Adam!"
Chimes. Chimes? Ela estava aqui? Ela estava no meio das pessoas? As pessoas que Nove Pai massacrava? Eu uivei de novo.
"Calma! Por favor feche os olhos, venha até mim. Por favor Adam!
Eu fechei os olhos e me calei, procurei em minha mente uma memória boa.
E a vi no dia em que fomos para o riacho, quando ela ia tirar a blusa e seu estômago roncou. Eu me apeguei a essa memória, meus olhos continuavam fechados com força, até que onde eu estava foi ficando escuro, as pessoas foram sumindo, sumindo e então só a escuridão restou. Chimes me chamava, sua voz foi aumentando até que eu a senti perto de mim e o cheiro dela me envolveu.
Eu abri os olhos ela sorriu, os olhos dela estavam cheios de lágrimas eu estava no chão, no colo do meu pai, Chimes estava ajoelhada ao meu lado.
Eu inspirei, me inundando no cheiro dela, a puxei e nós dois ficamos no colo de papai, ele nos ajeitou.
"Tudo bem?" Chimes me perguntou, eu a abracei mais forte e encostei o lado de minha cabeça no rosto do meu pai.
"Sim. Eu estou bem. Só me deixe ficar um pouquinho assim. Vocês são as pessoas que eu mais amo nesse mundo, só... Fiquem assim, por favor." Eu fechei os olhos, tentando esquecer o que eu vi.
"Eu ouvi isso, viu?" Eu levantei meus olhos e vi Noah, ele tinha a cara fechada.
"Sabe que eu te amo como amo a mim mesmo." Eu disse, Chimes sorriu, eu suspirei e a beijei.
"Bom, Noah, dá pra ajudar a tirar esse peso de cima de mim?" Papai disse, Noah riu e deu a mão para Chimes e a puxou, depois eu me levantei.
Ela me abraçou, eu voltei a me inundar do cheiro dela, era tão certo ela estar ali!
"Como você..."
"Eu fui na sua casa, você tinha saído, tinha vindo pra cá, seu pai e seu irmão vieram comigo e quando chegamos..." Eu colei minha testa na dela e ficamos assim.
"Me desculpa." Eu disse, ela ergueu meu rosto e me encarou.
"Não há o que desculpar. Isso é só algo pelo qual temos de passar juntos. Eu passei esse tempo pensando em como deve ser para você. Eu me lembrei de Rosalie dizendo que fêmeas não se vinculam e eu acho que ela está errada." Chimes disse, eu a apertei em meus braços.
"Vamos pro meu apartamento? Eu senti tanta saudade!" Ela disse, eu sorri.
Eu me situei e vi que estávamos no meio de umas árvores, as cabanas estavam a direita. Fomos pra lá e Noah estava colocando o braço esquerdo de Gabriel no lugar, ele estava com os olhos roxos e parecia ter tido o maxilar quebrado.
"Gabriel, pode me desculpar?" Eu perguntei, ele sorriu.
"Sim, é claro. Eu não deveria ter me metido, Nove Pai é muito forte, ainda que tenha ficado muito machucado, parabéns por isso."
"Por que está dando parabéns para ele? Gostou dele ter me machucado?" Nove Pai disse, eu fui até ele, ele me olhou nos olhos.
"Por que fez aquilo?" Ele baixou os olhos.
"Por que mandaram. Não foi, Nove?" Papai disse indo até Nove Pai e eu me afastei. Minha coluna começou a arrepiar, eu fechei os olhos e abracei Chimes escondendo meu rosto no pescoço dela.
"Nem todos ficaram protegidos nas instalações." Nove Pai disse.
"Protegidos?" Papai perguntou, Nove suspirou e lhe tocou o rosto, uma lágrima escorreu por meu rosto e mais uma e outra. Chimes ergueu meu queixo e beijou meus olhos. Não eram lágrimas minhas.
"Sim, protegidos. Protegidos da maldade do mundo e das consequências de sermos o que somos. Vocês foram abusados, eu sei, lhes tiraram a liberdade, mas ainda assim foi melhor que ser um cachorro deles. Um capacho, um pau mandado a quem mandaram fazer as coisas mais abjetas. Você foi protegido." Ele disse para o meu pai.
Papai o abraçou, ele abraçou papai de volta. Eles ficaram assim por um tempo, até que papai o soltou e sorriu.
"Amanhã, vai almoçar lá em casa. Todos estarão lá. Vou chamar Breeze e você e ela vão se acertar."
"Eu vou. Posso levar Gabriel?" Nove perguntou, papai sorriu de novo.
"Eu disse todos, Nove. Gabriel faz parte desse todos. Eu o amo, sempre amei."
Fomos embora e no jipe enquanto abraçava Chimes e contava cada metro até o apartamento dela, eu tive outra visão olhando para a nuca de papai.
"Pai..." Ele se virou, me encarou e eu entendi.
"Eu sentia um pânico grande e muito medo. Eram os sentimentos dele não eram?"
"Sim, filhote. Eram."
"Eu acabei de ver outra coisa. Você sabia?" Eu perguntei, Chimes se mexeu, eu sentia a curiosidade dela, mas ela iria esperar, ela era sábia, eu adorava isso nela.
"Não filhote, eu não sei de tudo. Mas agora entendo muita coisa."
Eu abracei Chimes e a beijei. Não do jeito que eu queria, apenas para sentí-la ali.
"Seu dom é perigoso, filhote. Mas estamos aqui, sempre estaremos." Papai disse.
Eu nunca tinha tido uma visão daquele jeito foi como se eu estivesse no meio das pessoas. Eu sentia o desespero delas e o de Nove.
"Eu também sempre estarei com você. Sempre." Chimes disse e eu a beijei lamentando que a porra daquelas cabanas ficassem tão longe.

FÊMEAS Onde histórias criam vida. Descubra agora