- Aqui - Ela coloca a caneca de café na mesinha de centro na minha frente, se sentando no sofá ao lado da poltrona onde eu estava.
Eu pego a caneca com a mão tremendo um pouco, olho em volta enquanto bebo um gole analisando o apartamento um tanto pequeno, mas confortável. Algumas roupas estavam jogadas pelo chão, nada parecia muito organizado pra dizer a verdade.
- Aluguei. - Ela comenta parecendo perceber minha análise - Desculpa pelas roupas, não tive tempo de arrumar...O que aconteceu? - Ela para de falar do apartamento e me encara, esfregando as mãos nervosas.
Eu coloco a caneca de café na mesa novamente e a olho, rindo.
- O que você quer quê eu diga, mãe? O que você espera que eu diga? Que eu faça? - Eu digo ainda rindo um pouco, ela olha para os lados - Você...você surge do nada, depois de sumir por dias da minha vida, e quer quê...eu desabafe com você? Com você?! - Eu rio mais e tampo meu rosto - Cara, o quê tá acontecendo...
Eu falo baixo e ouço a mulher na minha frente suspirar pesado, eu tiro as mãos do meu rosto e meu riso cessa. Nada ali era engraçado pra falar a verdade, mas era tão absurdamente irônico minha mãe estar na minha frente pagando de preocupada.
- Cecília...eu quero pedir desculpas. Por tudo. - Ela começa e eu deixo um suspiro escapar, preparada para corta-la - Deixa eu falar antes, por favor. - Ela pede e eu desisto - Eu sei que eu não fui uma boa mãe, eu não sou uma boa mãe, mas depois daquela briga que tivemos, eu percebi que não dava mais pra fingir que eu estava feliz e consequentemente te deixava infeliz, e a seu pai também claro. Me perdoe por ter sumido da sua vida, mas eu...não conseguia ter coragem de te visitar depois de tudo. Sei que talvez você não me perdoe, mas eu só queria dizer que eu ainda sou sua mãe, mesmo depois de tudo. Você ainda é a minha filha e é claro que se eu vejo você na rua de manhã, jogada na calçada dormindo com a cara inchada de choro eu vou me preocupar.
Ela pega minhas mãos e eu as afasto, ela morde os lábios e vejo seus olhos lacrimejarem. Ela abaixa a cabeça.
- Me deixa tentar de novo, por favor. Me dá uma segunda chance... - Ela chora e eu fico olhando seu corpo chacoalhar conforme soluçava. Ela coloca as mãos no rosto e eu reviro os olhos, desvio o olhar para o cacto em cima de uma mesa.
- Eu provavelmente fiz a menina que eu amo me odiar. - Eu digo, minha mãe levanta o rosto - Não sei o quê a Lexi tá pensando de mim, mas ela não tá feliz comigo. - Eu sorrio fraco - Eu ignorei todas as ligações do meu pai, nem ligando se ele ia se preocupar mesmo depois de tudo que ele fez por mim - Eu cruzo os braços e abaixo a cabeça, o choro da minha mãe já tinha se silenciado - E agora eu tô aqui, na sua casa.
Eu rio fraco e tampo os olhos.
- Então, boa pergunta mãe, o que aconteceu? - Eu repito o que ela disse e a encaro, ela secava as lágrimas me olhando.
- Você... - Depois de um silêncio que durou segundos, ela inicia - Você tem certeza que a menina...que você gosta, te odeia?
- Eu destruí a família dela, mãe. - Eu sorrio irônico ao dizer - Igual você destruiu a nossa, sabe? Mas eu fui longe na típica história do abusado que se torna o abusador, e destruí a família de outra pessoa em vez da minha. Mesmo que não possa chamar aquilo que ela tinha de família. - Eu desvio o olhar do rosto constrangido da mulher a minha frente e encaro minhas mãos - Não quero seus conselhos. Você não vai me ajudar em nada.
- Então o que você quer? - Ela pergunta, com a voz fraca e envergonhada.
- Um celular pra ligar pro meu pai. O meu descarregou. - Ela assente e pega o celular dela na mesinha, desbloqueia e me entrega. Eu agradeço com a cabeça e me levanto da poltrona, me afastando dela um pouco enquanto disco o número dele.
Coloco no ouvido enquanto chama, depois de alguns toques, ele atende e posso ouvir a sua voz confusa.
- Verônica?
- Oi pai, sou eu, na verdade. - Digo e posso ouvir o suspiro dele de aliviado.
- Cecília! Por Deus, onde você se meteu? Eu liguei pra Alexia mas ela disse que você tava no hospital, fui pra lá e não te achei minha filha. Tinha cogitado ir a policia, onde você está?!
- Tive um contratempo...tô no apartamento da minha mãe. Longa história. - Eu suspiro.
- Me passa o endereço, vou ir aí te buscar.
- Vou falar pra minha mãe te enviar por WhatsApp. Tudo bem?
- Ok, já já chego ai.
Eu desligo e me aproximo, entrego o celular pra ela.
- Vou passar pra ele. - Ela fala, tendo escutado o que eu disse.
- Onde é o banheiro? - Ela me aponta a porta, e eu me viro entrando no mesmo, assim que fecho a porta sinto meu corpo relaxar.
Encosto a testa na madeira da porta e respiro fundo algumas vezes enquanto acaricio a região do meu coração. Era muita coisa pra processar pra tão poucas horas, me afasto e vou em direção à pia. Lavo as mãos e levo a água até meu rosto, esfrego elas no mesmo e fecho a torneira me olhando no espelho.
Eu estava péssima.
Ainda de pijama, que estava todo sujo pela noite passada e meu rosto abatido não ajudava. Olheiras pesadas em baixo dos olhos e, mesmo depois de um tempinho, meu rosto ainda permanecia inchado.
Admito que, estava bastante cansada. Seco minhas mãos e meu rosto na toalha, e abro a porta indo de encontro a minha mãe que estava na porta de entrada me esperando.- Ele chegou? - Eu pergunto.
- Tá vindo. Daqui a pouco ele chega, vamos descendo. - Ela diz e eu assinto. Também não queria permanecer naquele cubículo sozinha com ela.
Pegamos o elevador em silêncio, pra ela provavelmente desconfortável mas pra mim um alívio.
Saímos do prédio, e paramos na porta. Cada uma se encostando de um lado da parede.
O silêncio que eu pensei que continuaria, é quebrado.- Você pode pelo menos me manter atualizada sobre sua vida? - Ela pede e me olha, eu suspiro a encarando - Eu não quero mais nada. Por favor, só isso. - Ela insiste.
- Você me machucou muito. - Eu digo e ela assente.
- Eu sei.
- Você me fez pensar em suicídio.
- Eu sei. - Ela abaixa a cabeça.
- Você me abandonou, mãe.
Ela não diz nada. Eu fico a encarando, esperando que ela chore, que grite, que me bata, que me pergunte o que está acontecendo mas nada acontece. E o silêncio que eu queria que tivesse aparecido antes dessa conversa, invade nesse momento a situação.
Escuto uma buzina, olho pra frente e vejo meu pai no volante, intercalando o olhar entre mim e minha mãe, percebendo a situação que nos encontrávamos.Eu começo a andar em direção ao carro, mas paro e olho pra trás. A mulher se mantinha parada me encarando com lágrimas nos olhos ir embora, eu suspiro.
- A gente pode marcar um café, qualquer dia desses. - Eu digo, e ela se tranquiliza mais.
- C-Claro, quando você quiser. É só me mandar mensagem.
Eu assinto, voltando a andar em direção ao carro. Entro no banco da frente, coloco o cinto e me encosto no vidro da janela. Meu pai acena pra minha mãe e ela também acena, constrangida novamente.
Sem dizer nada, dá partida indo embora daquele lugar.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Eu odeio amar você.
RomanceCecília é uma jovem prestes a terminar o ensino médio, depois de anos tendo vivências pacatas, seu último ano parece sacudir seu mundo quando de repente começa a perceber sentimentos mais profundos pela garota que fez sua vida na escola um caos. ⚠️...