XIV- Eu não sou e jamais seria o rosto da morte que tanto temem

3 0 0
                                    

Depois de procurar por todo o baile e não encontrar sua esposa, Pedro voltou à casa de Rodrigo e estranhou que várias luzes da casa estavam acesas, mas não a do quarto onde ele e Lena estavam dormindo durante a hospedagem. Subiu as escadas, preparando seu coração e discurso para esperar que ela chegasse para contar toda a verdade sobre André.

Mal contava que, ao abrir a porta do aposento, lá estaria sua dama dourada: deslumbrante, linda, brilhante. Ele já não conseguia se lembrar das palavras que tão cuidadosamente tinha decorado e ensaiado, só desejava arrancar com os dentes aquele vestido dourado que, encharcado pela chuva, marcava cada curva esculpida no corpo de Lena, e amá-la até o dia amanhecer.

Mas ela não desejava aquilo. O brilho do vestido se apagou quase automaticamente quando ele olhou para aqueles olhos verdes à sua frente: sem vida, tristes. E nesse instante ele teve a certeza de que já não importavam mais as palavras decoradas ou o que elas tinham a dizer, Lena já sabia o conteúdo da carta de André.

— Meu amor, eu lhe busquei a noite inteira, e peço desculpas por não conseguir chegar a tempo, sei o quanto esse momento era especial para você. - Pedro dissimulou e se aproximou para beijá-la, mas Lena não esboçou reação.

— Não se preocupe, não teve importância.

Nesse instante, Pedro ficou em dúvida se ela realmente lera a carta. Conhecia sua esposa e sabia que, tendo lido aquela carta, jamais perdoaria seu erro do passado. Mas por qual motivo ela estaria tão fria e distante, senão a notícia de que o afilhado era, na realidade, seu enteado?

— Está tudo bem? — Ele continuou tentando arrancar uma resposta para sua pergunta.

— Sim, estou apenas cansada.

— Quero me redimir por não acompanhá-la hoje na festa. — Estendeu a mão — Me concede uma dança sem música?

Pedro não sabia, mas Lena estava destruída duplamente e sequer sabia qual sentimento lhe fazia mais mal: a dor da traição ou a culpa de ter beijado seu antigo amor por despeito. Ela não sabia fingir, mas precisaria se secar e dormir, para acalmar seu coração e conseguir ter a conversa mais importante de sua vida na manhã seguinte.

— Me desculpe, eu acabei me molhando na chuva e preciso me secar para dormir. — Ela se levantou, e a nudez sob o vestido ficou ainda mais evidente graças à transparência do pano ensopado — Talvez na próxima vez possamos dançar.

— Esse vestido lhe cai muito bem, ainda mais transparente dessa forma. — Ele se aproximou, sorrindo maliciosamente.

— Eu não sabia que ficaria transparente quando molhado. — Ela ficou nervosa ao perceber esse detalhe.

— Ao menos você não se molhou antes da festa, fico feliz que ninguém além de mim tenha tido a oportunidade de vê-la assim. — Ele se aproximou ainda mais, até que seus corpos se tocassem.

— Realmente, uma grande sorte. — Lena se afastou ao lembrar que Henrique não somente a havia visto daquela forma, como também tocado e beijado.

Sem sequer olhar para o marido ou lhe dirigir a palavra, ela foi até o banheiro, se secou e logo se deitou para dormir.

— Se esqueceu de me desejar uma boa noite?

— É claro que não. — Ela se virou para o marido e lhe deu um suave beijo na boca — Tenha uma boa noite, amanhã conversaremos melhor.

...

Já era tarde quando o carro do prefeito adentrou a enorme casa. Lilian entrou primeiro, visivelmente mareada e cambaleando, e se dirigiu diretamente ao seu quarto.

O Destino de LenaOnde histórias criam vida. Descubra agora