Família

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— Não sei por onde começar, filha.

— A história de vocês é tão longa assim?

Miranda riu, assentindo positivamente e, em seguida, negativamente.

— Sim, mas não deveria.

— Por que?

— Porque durante muitos anos, fomos tolas e deixamos nossos sentimentos de lado por um bem maior. Poderíamos estar juntas há muito mais tempo.

As feições de Diana mostravam a total confusão com aquelas palavras. Estavam sentadas num dos sofás externos da fazenda, observando as montanhas ao longe enquanto bebiam café e chocolate quente com os corpos cobertos por mantas grossas.

— E que bem é maior que o amor de duas pessoas?

Miranda sorriu e suspirou. Hoje, quando olha para trás e pensa nos anos que passou longe de Andrea, também não entende. Mas, naquela época, fazia total sentido.

— Bom, sua mãe é mais nova que eu. Ela sempre almejou ser uma grande escritora ou jornalista. Ou ambos. Ela sabia muito bem aonde queria chegar e como chegaria. E eu... — Miranda soltou o ar e olhou para as próprias mãos por um segundo antes de voltar a encarar o horizonte ao longe. — Eu estava focada demais em dar o sangue pela revista. Eu não estava certa se devia ou não colocar minha carreira, e a carreira de Andrea, em risco para assumir um romance com uma mulher muito mais jovem.

O Sol se punha lentamente diante delas. O som dos pássaros trazia a paz que precisavam para descansar a mente. Andrea estava escrevendo seu livro no andar de cima enquanto as gêmeas passeavam pelo vilarejo. Comprar aquela fazenda foi, definitivamente, a melhor ideia que tiveram. O casal quase não ficava na cidade e as filhas iam para a faculdade e voltavam quase todos os finais de semana, ainda que precisassem estudar. Não tinha lugar melhor para conseguir focar e descansar.

— Mas ela não trabalhava para você? E você sabia que, mesmo trabalhando na revista, ela tinha outros planos?

Miranda assentiu e sorriu, olhando para a filha.

— Sim, mas eu sempre soube que ela não ficaria lá para sempre. Além do mais, ninguém trabalhou comigo por muito tempo.

— Eu tenho tantas perguntas.

Diana suspirou e provocou risadas na mãe que voltou a beber seu café.

— Você é péssima contando histórias, meu amor.

Miranda ergueu o olhar e viu Andrea parada na porta atrás delas com um sorriso pequeno nos lábios. Ela vestia roupas confortáveis e seu cabelo estava preso num rabo de cavalo alto. Lentamente ela caminhou até Miranda e parou em sua frente, erguendo a manta para que pudesse se sentar com o corpo colado ao da esposa.

— A escritora aqui é você.

— Eu vou te dar um desconto porque nossa história é cheia de reviravoltas.

— E exatamente por isso se tornará um livro. — Diana sorriu, quase comemorando. Ela mal podia esperar para finalmente lê-lo. — Mas eu sou privilegiada e saberei de tudo agora mesmo.

As mais velhas riram e Andrea bebeu um pouco do café da xícara de Miranda, recebendo um olhar carinhoso da mais velha. Após devolver a bebida, ela beijou suavemente os lábios da esposa e encostou suas testas por um segundo. Miranda vestia roupas confortáveis e seu cabelo ainda era o mesmo, com o detalhe de que ela não se preocupava tanto em mantê-lo arrumado quando estavam em casa. Para Andrea, ela ficava mais bonita a cada dia.

— Será que vocês podem se lembrar de que estou aqui esperando e contar logo a história?

— Elas são assim, Di. — As gêmeas apareceram juntas pela escadaria principal, rindo ao se lembrar de que já estiveram naquela mesma situação. Apesar de terem acompanhado boa parte da história das mães, elas amavam ouvi-las contar, então se sentaram no sofá ao lado de Diana, se serviram de chocolate quente e biscoitos, se cobriram e esperaram que continuassem.

Please Notice | Em revisãoOnde histórias criam vida. Descubra agora