Murilo - Um anjo do céu

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A semana e os dias passam depressa. As coisas para o evento beneficente estão quase todas prontas e vistas.

Tive a brilhante ideia de chamar Heloísa para ser minha acompanhante. Espero que não dê nada errado. Gosto da presença dela, ela não parece como uma mulher da vida, ela tem mais a oferecer, sabe? E confesso, tem um mistério em seu olhar que eu quero desvendar ainda. Por que ela foge tanto dos assuntos sobre ela? Por que tanto medo do amor? Tão jovem e ainda assim, tão fria.

Na última vez que estivemos juntos, descobri algumas coisas sobre ela. Ela tem mãe mas não fala com ela há dez anos, filha única. Foi criada pela mãe solo, teve uma infância e adolescência não muito fácil, mas não aprofundou.

Mora sozinha e seu sonho, é ter um bichinho de estimação, ela diz que gosta de gatos e que ainda não tem porque quase não fica em casa, só quer ter quando puder dar atenção ao bicho. Não pretende ter filhos tão cedo, tem medo de não ser uma boa mãe ou de contar a vida que leva para seu filho. Contou também que pretende sair da vida assim que se formar e conseguir um trabalho na sua área de formação.

Comprou seu apartamento e agora está planejando comprar um carro com o tempo, disse que apesar da vida dar dinheiro, ela passa por muita coisa difícil de engolir.

Três batidas na minha porta e logo Aline surge na sala.

— Senhor, reunião com os parceiros de fora, daqui a dez minutos. Já enviei o link para seu e-mail — Aline diz e logo se retira.

Estamos expandindo a empresa para os Estados Unidos. Apesar de já termos parceiros lá há algum tempo, investidores, agora estamos abrindo uma filial lá, então estou sempre em contato com eles.

Carlos e eu sempre dividimos assim, eu cuido das relações internacionais, do comercial, mídias sociais e RH. Ele cuida do financeiro, do operacional e números. Eu sempre gostei mais de lidar com pessoas e ele números.

A reunião foi ótima e produtiva, então assim que encerramos, eu já começo a resolver as coisas combinadas. Mais três batidas na porta e Aline entra novamente.

— Senhor, é...visita — ela diz, mas antes que possa terminar, meu pai aparece atrás dela.

Fico surpreso ao vê-lo. Nos falamos uma vez por ano e olhe lá, normalmente no natal.
Ele parece bem, até.

— Olá, meu filho! Vamos almoçar juntos? — ele diz sorrindo.

•••

— Não acredito que separou da Camila, ela sempre foi uma ótima esposa. Vocês eram tão apaixonados — ele diz, bebiricando seu vinho.

— Éramos, quando jovens. Faz tempo que não temos nada e por fim, peguei ela com outro na cama — digo, comendo minha entrada.

— Ah, mas o que tem? Casamento é um negócio, Murilo, um negócio onde o divórcio é cheque mate. Você perde — ele diz.

— Deve ser por isso que traía tanto a minha mãe. Até ela ficar doente e morrer e você finalmente você poder ficar com suas novinhas — eu digo em tom amargo. Odeio o jeito que meu pai tem de ver a vida, odeio ele ter feito tanto a minha mãe sofrer engolindo suas traições óbvias.

— Não, sua mãe teve uma excelente vida. Eu não tenho culpa do câncer dela e uma fugidinha de vez em quando não mata ninguém — ele diz rindo.

— O senhor veio da Suíça pra cá pra falar da Camila, é isso? Aliás, como ficou sabendo? — pergunto, realmente e intrigado. Não parei pra pensar mas, como ele soube?

— Edgar me contou (pai de Camila), ele me ligou pra falar que ele e Helena estarão viajando pra Europa em breve, daí comentou.

— Entendi! — respondo seco.

— Mas não vim pra isso, tem razão. Vim porque estava com saudades da grande São Paulo. Trouxe Emily pra conhecer — ele disse.

— A francesa de vinte e seis anos que você está namorando? — pergunto em tom mais amargo do que mais cedo. Meu pai tem 60 anos e sempre fica com garotas com idade para ser minhas irmãs ou até mesmo netas dele. Isso me irrita profundamente.

— Ela mesma! — o celular dele toca e eu dou graças — Ah, é ela.

Ele sai para atender, logo volta e diz que a namorada quer ir ao shopping comprar algumas coisas. Ele deixa algumas notas de cem na mesa e vai embora.

As visitas dele são sempre um pesadelo. Normalmente acontecem a cada dois anos, mas pelo visto, ele não se conteve, precisava vir se meter na minha vida pessoalmente.

Termino meu almoço calmamente e pago a conta. No caminho para a empresa eu dou uma olhada em algumas vitrines de lojas de mulheres, vejo alguns vestidos, pensando no evento beneficente. O que será que combina com Heloísa?! O vermelho lhe cai bem. O evento será um baile de máscaras, então é bacana ela ir com um vestido longo e uma máscara.

Ligo para Aline e peço pra ela procurar por vestidos longos que combinem com o terno que vou usar no evento. Pedi pra ela ver tudo completo, vestido, salto, joias e máscara.

Não vou voltar para o trabalho agora, já está anoitecendo, então vou até Heloísa para descobrir o tamanho que veste e mandar para Aline. Já faz uma semana que não falo com ela.

Dirijo com calma até lá e vejo que ainda está fechado, então fico dentro do carro aguardando. A vejo chegando depressa, com uma mochila de rodinha e uma bolsa.

— Heloísa? — grito saindo do carro. Ela olha ao redor como se preocupada e vem até a mim.

— Por favor, não me chame assim aqui perto. Algum cliente pode ouvir — ela diz, baixo. Um nó se forma na minha garganta. Por alguns instantes, me esqueci que ela tinha outro nome, que ela tinha clientes e que eles não podem saber quem ela é de verdade. Esqueci da vida que leva.

Não não! Eu não posso me esquecer disso.

— Desculpe, eu, é...eu preciso saber quanto calça e veste — digo, pegando o celular — é pro evento beneficente.

— Ah, verdade! Já está chegando? — ela pergunta, parecendo interessada — Estou animada. Se você quiser entrar, pode me explicar um pouco como vai ser...

Penso na proposta dela, olho pra ela que está com um sorriso tranquilo e olho para a porta. Olho também ao redor e ela parece ter reparado, na verdade, parece ter se incomodado.

— Tudo bem se não...

— Eu quero, vamos? — pergunto e a sigo para a porta. Entramos e ela cumprimenta alguns funcionários de lá. Algumas meninas me encaram surpresas e outras, com certo interesse.

Luan chama ela num canto e os dois falam e me olham, como se eu não estivesse percebendo.

— Fique aqui um pouco, pode beber a vontade, vou só me arrumar e já desço! — ela disse e eu apenas concordei. Então fiquei ali, no bar, com um tal de Arthur. Bebo e ouço música até Heloísa resolver aparecer.

E ela aparece, depois de longos quarenta minutos, com a casa já aberta, ela aparece vestido um vestido de cetim preto, curto mas não indecente, sem sutiã e de alça. Contorna seu corpo mas não marca nada além do que deva ser marcado. Seus pés ficam perfeitamente encaixados no salto preto de tira. E ela tem uma tornozeleira de prata.

Eu fico ali extasiado por alguns minutos, vendo a imagem dela descendo a escada e não seria exagero dizer que tinha uma luz em volta dela, como se ela descesse diretamente do céu.

Amor proibidoOnde histórias criam vida. Descubra agora