18-Ruína

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O telemóvel tocava mais uma vez, era a sétima chamada do dia e a incontável da semana e meia que se tinha passado desde a informação nova ter aparecido.

Não foi difícil de todo para Felix tomar uma posição perante a situação; ia deixar de se encontrar com Hyunjin e cortá-lo da vida, já não precisava do seu dinheiro e mesmo que precisasse, iria virar-se na vida como sempre se virou.

Em relação aos sentimentos que ainda eram negados por parte, era uma questão de tempo até a flor secar e não restar nada mais do que as flores secas no chão, uma lembrança.

O barulho era irritante, mas de alguma forma uma parte de si impedia-o de simplesmente bloquear o mundo, uma parte de si desejava haver um ínfima probabilidade de os dois ficarem juntos sem haver efeitos colaterais, desejava que Hyunjin desfizesse as palavras daquela mulher dizendo que era tudo falso e que na verdade ele queria-o e desejava-o tanto como ele deseja o outro.

Rejeitou a chamada e pegou no saco do lixo para o ir deitar ao contentor.

Abriu a porta do corredor encontrando Mel atarefada, rodeada pelas crianças.

-Oh! Aqui está ele. Felix, este rapaz andava à tua procura. -Mel apontou para uma figura de fato preto, carregado com sacas de plásticas cheias de produtos.

Chocado, arregalou os olhos, agarrando melhor o saco na sua mão.

-Obrigado, meu doce. -ouviu a voz da mulher dentro do apartamento de onde saiu Hyunjin, fechando a porta atrás de si.

Reticente o mais velho manteu a distância durante uns segundos, respirando profundamente, descaindo a cabeça para depois a erguer, fazendo o cabelo negro amarrado num mini ponytail seguir o movimento, mordiscou o lábio e aproximou-se do corpo petrificado.

-Não me respondes às mensagens nem atendes as chamadas, tinha que ter a certeza que estavas bem. -esfregava as mãos uma na outra de forma embaraçosa.

-Entra. -foi a única palavra que lhe dirigiu, dando espaço entre a batente da porta e o seu corpo para o maior passar.

Deixou o saco na entrada e trancou a porta de saída, guiando o convidado para a cozinha onde lhe indicou para se sentar.

-Queres café? -perguntou estável, virando as costas para o outro.

-Pode ser. -ajeitou o corpo na cadeira, fazendo-a ranger no silêncio cerrado.

Com as mãos levemente trémulas, colocou a cápsula de café na máquina, que pedia por uma reforma atrasada, alinhando as canecas na bancada.

Precisava de expor a sua percepção das coisas se queria encerrar este capítulo, mas saber que era o Hyunjin de quem se tratava tornava toda a situação complicada.

O mais velho era muito imprevisível, trazer este assunto pessoal ao de cima tinha muitas vertentes de como ele pode reagir, desde a uma explosão raivosa até a um arrependimento e desculpas por lhe ter mentido, isto é se ele for capaz de se desculpara perante alguém.

Agora que Felix pensava, nunca tinha visto Hyunjin vulnerável ou algo semelhante, era como se para ele, Hyunjin fosse impenetrável nesta parte a que todos chamamos a sensibilidade humana.

-Quando é que me ias contar que és casado? -começou com o pé esquerdo e abruptamente a conversa, descendo a probabilidade desta conversa ter uma "boa" continuação.

Não houve resposta, por isso expectante virou-se para trás, observando Hyujin.

Uma postura reta e petrificada, as mãos interlaçadas e um semblante sério, com os olhos vidrados no loiro era como se lhe tivessem tirado o chão debaixo dos pés ou algo parecido.

-Ela encontrou-me na entrada do prédio e ofereceu-me dinheiro para me afastar de ti...

-Foi por isso que deixaste de responder? Aceitaste a proposta? -interrompeu.

-Não. Deixei de responder porque era o mais correto a fazer e porque ainda tenho uma pinga de decência e dignidade para usar e proteger.

Voltou a virar-se para a máquina, tirando o outro café. Uma desculpa para tentar manter a calma, enrolando a língua vezes sem conta e não disparar palavras na direção do outro, precisava de branquear a mente, de a bloquear e travar os pensamentos a prego fundo.

-Felix. -suspirou, não sabia o que dizer. -Eu não podia propriamente partilhar este detalhe da minha vida contigo. Sei que não sou correto de todo nesta situação, até porque fui eu que a criei, mas..

-TU TORNASTE-ME NAQUILO QUE EU MAIS ODEIO! -berrou, virando-se bruscamente. -TU NÃO TINHAS O DIREITO DE ME METER NESTA MERDA!

Aproximou-se da mesa, o tom de voz descendo de raiva para um desprezo.

-Tu não tens noção do quão merdoso foi ser parado na rua pela mulher da pessoa com quem fodes por dinheiro onde tudo o que ela quer é que tu saias da vida do marido, estando disposta a pagar qualquer quantia para que isso aconteça, algo que para ela já é tão normal como ia deitar o lixo ao contentor. Uma repetição do processo para ela, para ti e para a tua família, uma que estás a destruir e a tua mulher tenta reconstruir, encobrindo as merdas que fazes.

-Nunca me senti tão humilhado na vida e agora dou-lhe razão, mais cedo ou mais tarde esta merda toda ia acabar e eu ia sair disto com as mãos vazias, só foi mais cedo do que o esperado. E entendo, entendo mesmo que este não é o tipo de informação que partilhas com a tua putinha de uns meses, mas não te tornas menos merdas por isso e não fodes menos vidas por omitires informação. Tu és um filho da puta, Hyunjin, que destrói o que se aproximou de ti e o que dói mais é que destróis os teus próprios filhos no meio disto.

Notava-se a irritação na face, o morder de lábios e o abanar de cabeça afirmativamente de forma sistemática, com o olhar desviado para a parede.

-O que queres que faça então? Que volte para casa e peça desculpas? Que passe a amá-la? Que não lhe peça o divórcio? Que ignore os sentimentos fudidos que arranjei de ti neste últimos tempos? -começou num tom calmo que a cada palavra dita apanhava balanço e irritação.

-Nem te atrevas a usar-me com desculpa para não amares a tua mulher...

-Tu não és a desculpa. Já não a amo faz anos! 

Silêncio, ninguém sabia o que fazer ao certo neste momento, não havia muito mais a declarar, Felix já tinha deixado a sua posição bem marcada.

-Felix! -levantou-se, parando ao lado do loiro. -Eu, tu... foste tu que me fez entender o quão na ruína esta casamento estava e que me levou a entender que amor é uma das palavras mais ausentes no meu casamento. Não foste a ruína porque ele já estava arruinado, foste mais uma... resolução.

Tentou pegar nas mãos pequenas que o repeliram.

-Dispenso as tuas palavras de galante e tranquilização. Já deixei claro a minha posição por isso peço-te que saias da minha casa e nunca mais tentes entrar em contacto comigo.

-Vai antes resolver a tua ruína...

Wrong Service-HyunlixOnde histórias criam vida. Descubra agora