Capítulo V - A armadilha

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308 d.C.

Davos ainda sentia o molhado das lágrimas de Marya sob seu gibão.

A última guerra não apenas devastou o reino, mas os separou por mais de cinco anos. A mesma guerra que lhes roubou o vigor da juventude, e cinco, dos seus sete filhos. Era compreensível que ela chorasse, que negasse com a cabeça, mesmo quando tudo o que seus lábios proferiam eram palavras de boa sorte e alento. Seu olhar apesar de afetuoso e cheio de devoção, carregava também relutância. Ela não queria que Stannis e Steffon o acompanhassem, não quando Davos era incapaz de prometer que os manteria a salvo. Essa mesma promessa ele havia falhado em cumprir não uma, mas cinco vezes.

A mesma relutância se misturava ao violeta dos olhos de Daenerys Targaryen. Seu delicado rosto se mantinha impassível mesmo diante das promessas mais acaloradas de Jon. Ela havia visto as marcas sob o peito do marido, e, assim como ele, havia lutado batalhas o suficiente para saber que sorte, era um componente incerto e essencial quando se fala em batalha. Sorte. Era estranho pensar em como a ausência duma palavra tão pequena, teria o poder de determinar quem vive e quem morre...

A tal ponto, não era de se espantar que Davos encarasse a possibilidade de não ter mais sorte alguma lhe sobrando. Ele havia ido mais longe do que qualquer um de seus irmãos, mais longe do que poderia alguém de nascimento tão baixo. Davos era Mestre dos Navios, e como tal, assentava-se na mesma mesa que dragões e leões. Seu Stannis se casaria com Lady Jane Celtigar, e governaria a pequena fortaleza de Mata de Chuva. Enquanto seu mais novo, Steffon, era escudeiro de Sor Luthor Tyrell. Um dia, se os Deuses julgassem justo, seu menino assumiria o manto branco, assim como o mentor.

Seus futuros estavam seguros depois dessa última batalha, um lorde e um cavaleiro... Davos havia lutado com todas as suas forças para assegurar-lhes isso. Uma vida respeitável, e meios para que pudessem se manter seguros. Poderia morrer feliz, se não fosse tão egoísta, pensou consigo mesmo enquanto aquecia suas mãos, que, a essa altura, pareciam estar congeladas as rédeas de seu cavalo.

Davos era um homem velho, os poucos cabelos que ousavam surgir como fuligem no topo de sua cabeça eram tão brancos quanto a neve dos prados de Winterfell. Mesmo com habilidades medianas ele havia sobrevivido não a uma, mas a quatro grandes batalhas... Não era a toa que pensasse tanto assim na morte. Sua idade mais do que nunca estava cobrando o preço de uma vida de abusos, por essa razão a maioria dos mercenários costumavam viver tão pouco. Seu quadril a meia légua de Porto Real já latejava de dor, o resto de seu corpo não demorou muito para acompanhar... Era como estar com febre, mas sem toda a fraqueza que acompanhava, não, ele apenas sentia seus ossos doerem. Os joelhos não tinham a mesma estabilidade, descer e subir de sua montaria era torturante, bem mais do que fingir que estava bem.

– Talvez não devesse beber mais disso, não se quiser ficar alerta. – Disse Verme Cinza antes que Davos pudesse levar o cantil aos lábios, que a essa altura já estava quase vazio. Era o que dois dias frios na estrada requeriam, sentidos nublados, dor enganada.

– Estamos em solo amigo. – Interviu Sor Andrey Dalt, o cavaleiro dornês também tinha o hábito de manter seu cantil por perto, em goladas profundas e espaçadas... Ele ainda era jovem, sequer havia completado vinte anos.

– Até atravessarmos a vigia do acampamento Baratheon, isso é terra de ninguém Dalt. – Respondeu Sor Luthor Tyrell num tom cauteloso.

– Está certo. – Disse Davos engolindo em seco ao passo que afastava o cantil de seu alcance. – Sem mais vinho.

– Farei essa promessa quando estivermos frente a uma fogueira, com roupas secas. – Retrucou o dornês bebendo mais um pouco, mesmo diante do olhar reprovador de Verme Cinza.

thought we built a dynasty (forever couldn't break up)Onde histórias criam vida. Descubra agora