Capítulo XII - O príncipe de Solarestival

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322 d.C.

A saleta do Grande Meistre contava com altas estantes, repletas de livros grossos e bem conservados. Martyn se perguntava se mesmo em uma única vida o velho Celtigar tivera chance de ler todos.

A mesa de seu caro preceptor estava notavelmente vazia, assim como parte das poções que compunham seu armário envidraçado. Em sua cadeira, o velho arquimeistre Feydor roncava com certa constância. O homem assim como Kywell possuia uma longa barba, era estranhamente magro e seu rosto ossudo era marcado diversas verrugas. Cicatrizes da varíola, Martyn tinha ouvido sua irmã sussurrar para Amarei Banefort no momento em que o vira pelas costas.

O pobre arquimeistre havia ido a corte com perspectiva de ajudar no parto do novo bebê real, e bem... Não era exagero dizer que Lady Emersande Hayford era fraca de juízo. Fazer seu velho meistre cavalgar metade de um dia, numa estrada lamacenta para um trabalho que sequer fora chamado? O homem mal havia aguentado corrigir as primeiras lições de Lyanna sem cair no sono, que dirá permanecer um dia e uma noite em vigília, esperando a Rainha Daenerys empurrar para fora mais um dragão.

Martyn não havia visto sua mãe ir a cama de parto, mas há alguns anos ele a vira perder um bebê... Sua barriga inchada por algumas luas se esvaziara numa torrente viva de sangue, seu rosto pálido como ele nunca vira. Lady Talla ficara dias acamada, a febre de leite lhe alcançara implacável o suficiente para que mandassem chamar um sacerdote em Septo de Pedra. Martyn se lembrava pouco daqueles dias, exausto, ele acordava e dormia sob uma pequena poltrona ao lado de sua mãe. Ela precisaria de alguém quando acordasse, não uma camareira ou um copeiro, um rosto conhecido, um rosto que se iluminaria ao encontrar o castanho de seus olhos. Aemon sempre que podia vinha ao encontro do amigo, mas era Lyanna quem dedicava a maior parte do seu tempo, suas mãos pequenas e macias se entrelaçavam as de Martyn de forma reconfortante. Em alguns dias a princesa lia lindos poemas em alto valiriano ou ghiscari, em outros momentos ela cantava, o alaúde tão afinado quanto sua delicada voz. Quando Lady Talla finalmente acordara contou a todos sobre as canções que a trouxeram de volta a vida.

Martyn tentou em vão não olhá-la com tanta intensidade, queria poupar-se do constrangimento de ser notado. O sol que rompia com as janelas envolvia seus cabelos castanhos escuros numa áurea avermelhada, como se estivesse rodeadapor fogo. Seu vestido era constituído do busto até saia, por uma delicada seda de tom rosa claro, suas mangas ornadas com pequenos arranjos de renda estrangeira. Seu rosto estava decididamente voltado as janelas, encantado pelo voo das feras que coloriam o horizonte. Martyn a conhecia bem demais para saber, Lyanna os adorava, a maneira como voavam altos e inatingíveis, a beleza de suas ásperas escamas reluzentes, o jeito como ferozmente se alimentavam. A princesa Targaryen suspirava diante deles, como Johanna certamente faria diante de um gatinho.

Martyn demorara um tempo para perceber que ela se voltara em sua direção, seus olhos púrpura oscilavam risonhos entre ele e o adormecido arquimeistre. Aemon se mantinha alheio a situação, talvez compenetrado demais em seu grosso caderno de contabilidade, um dos trabalhos que o Príncipe Consorte lhe havia encarregado, para que apreendesse o ofício do Mestre da Moeda.

– Ele parou... – Disse Aemon abruptamente voltando-se a figura magricela do velho Feydor, cujo ronco, já não ressoava mais pela saleta. O sorriso de Lyanna se desfez no mesmo instante.

– Acha que ele morreu? – Questionou a princesa levantando-se apreensiva, ainda incerta de como agir. Martyn e Aemon quase que imediatamente fizeram o mesmo.

– Por que morreria? Parecia bem há alguns instantes... – Indagou-lhe Martyn dividido entre se aproximar do homem ou manter sua posição próxima a porta.

– Ele é velho. – Disse Lyanna como se fosse óbvio. – Horton Redfort morreu do mesmo jeito, abraçado pelo Estranho no meio do sono...

– Maekar me disse que a jovem Lady Redfort o cavalgou rápido demais, explodindo seu coração em mil pedaços. – Disse Aemon sem desviar seus olhos violetas do arquimeistre, enquanto ousava alguns passos em sua direção.

thought we built a dynasty (forever couldn't break up)Onde histórias criam vida. Descubra agora