A troca de lugar (insuficiência)

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De todas as dores que senti com a partida de nós, a troca foi a pior das dores, porque você trocou o meu amor pelas migalhas de pão que caiam de uma mesa que parecia farta, e você? Parecia faminto com uma fome que eu não podia matar, ou que pelo menos você achava que não, então eu vi você andar a passos largos para fora de mim mesmo quando ainda estávamos a dividir o mesmo lençol, a mesma cama, a mesma alma, eu vi você escorrer pelos vãos dos meus dedos mesmo quando eu ainda desnuda escorria pelos seus aos finais de semana e nos dias da semana em que o seu peito era minha morada mesmo que ainda cheio de confusões, e nada poderia eu fazer para impedi-lo, sendo sua eu já não era mais.

Quando você me abandonou, abandonou a nós, os sonhos, os acordos, abandonou o amor e trancou meu coração jogando a chave fora, quando você me abandonou as minhas ruas ficaram tão vazias como quando acabam as festas de carnaval, os limpadores vão chegar com seus esfregões e limpar os retalhos, os confetes, as garrafas de bebidas quebradas e vão varrer para longe todas as lembranças do que um dia fomos nós.

Eu entreguei a você os meus dias e você os rasgou e despedaçou como aqueles panfletos inoportunos que nos entregam nos grandes centros dizendo "trago o amor verdadeiro em sete dias", mas agora nesses dias em que vivo com o peito em carne viva quase que para fora do corpo quem poderá trazê-lo de volta a mim? Será que vale a pena a sua volta? Será que volta? Você passou por cima de mim como os foliões fariam depois de notar que o calor do carnaval já estava acabando assim como o nós que acabou num piscar de olhos e que no dia seguinte teriam de encarar a vida monótona e cinza se rastejando pelos corredores das estações de trens e metrôs da cidade.

Você me abandonou e eu nem pude me despedir do seu corpo, do gosto do seu beijo que tinha aroma de cerveja e cigarro, dos seus braços que me abraçavam e me tiravam os pés do chão porque estando com você eu não precisava que eles sentissem o chão de fato porque eu só precisava sentir você.

Mas quando você escolheu a grama do vizinho, o colo de outro destino a vida por outra ótica, quando você decidiu por outro calor humano, outro sabor, outra curva ou outro relevo o que ficou foi o meu chão aberto com meus pés fincados em cacos de vidro fazendo a dor da troca ser ainda mais insuportável.

Depois de você, depois da troca, depois da outra eu quis gritar aos quatro cantos do mundo que só o seu amor, ou a falta dele me destruiu, mas não. Recolhi todos os pedados jogados no chão da sala que foram pisoteados por você sem amor e reconstruí em mim uma fortaleza inabalável, quando você foi embora eu decidi que ali eu seria minha e que não mais voltaria atrás.

Quando você voltarOnde histórias criam vida. Descubra agora