As pequenas partes de mim espalhadas pela cidade

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No momento que me olhei de longe e percebi o quanto minha pele era vulnerável parei, me observei mais alguns segundos tentando capitar toda aquela fragilidade voando pelas ruas como panfletos velhos em dia de eleição, esparramada no meio da rua, esparramada ali sem que ninguém pudesse me ver, sem que ninguém pudesse me salvar de mim.

No momento que percebi sua partida eu quis rasgar a pele por onde suas mãos passaram, eu quis fazer novas marcas em cima das suas, em cima de todas aquelas que você por descuido ou por amor deixou em mim, eu quis me desfazer das camisetas de super heróis que você me deu de presente pois naquele momento parecia que nenhuma delas me cabia mais e que nenhum daqueles heróis me salvaria, eu quis me desfazer dos textos, das poesias e de todas as musicas que escrevi pra você em silencio enquanto você dormia.

Eu quis arrancar da memoria cada rastro que ainda existia de você e de nós, cada lembrança por mais embaralhada que fosse pra que em nenhuma madrugada fria do ano elas pudessem me acordar depois de um pesadelo, eu quis te arrancar de mim, quis cortar as unhas e pintar os cabelos, mudar o estilo das roupas, e fingir que todo aquele meu senso estético tinha evaporado e agora só me fazia usar roupas sutis e cafonas, eu quis mudar de emprego, de academia, eu quis mudar de cidade e de país, eu quis parar no meio da avenida mais famosa da cidade e que ainda era o nosso lugar preferido e gritar, gritar aos quatro cantos da cidade, a todos os ventos de que o nós não existia mais e isso era uma lastima.

Mas no minuto seguinte eu quis abandonar todas as minhas constatações, quis ligar o celular e curtir sua ultima foto, quis olhar no fundo dos seus olhos e dizer "fica ?" será que as coisas serão diferentes daqui em diante, eu te quis, eu te quis tão absurdamente que respeitei todos os seus desejos sobre mim, dos mais obscenos aos mais específicos como quando você me disse que queria ir embora, e foi. Como quando você com seu desconforto estampado no rosto pegou suas coisas e foi embora, deixando um buraco na comoda do quarto e outro ainda maior no meu peito, como se o seu partir fosse o mundo me atravessando e me avisando que quando alguém parte de nós, nos parte em pequenos micro pedaços que agora ficam vagando pelo espaço na cama, pelo vazio no banheiro e em cada comodo da casa por onde fizemos amor, por onde fizemos nós, por onde passamos, por onde nos derramamos, por onde existimos, e que agora estão espalhadas, por aqui e por cada canto dessa cidade.

Quando você voltarOnde histórias criam vida. Descubra agora