Capítulo 8: Conversas e confusões

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De algum jeito, Sol conseguiu o número de celular de Anthony. Os CDFs estavam sendo bastante eficientes com relação a fazer alguns "servicinhos". O motivo dela querer o telefone do rapaz? Simplesmente não tinha. Ela só queria e pronto. Talvez algum dia fosse necessário
Ela agora relaxava no salão de beleza, arrumando os cabelos e as unhas, fazendo a maquiagem e fofocando no telefone com uma de suas amigas.
Um dia perfeitamente normal para ela, se não estivesse ardendo de vontade de ler o maldito livro.
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Anthony chegou em casa um pouco mais tarde do que o habitual. Havia passado na loja de ferramentas e comprado algumas coisas que faltavam para suas invenções. Ao entrar, pediu a criada que levasse tudo para o seu quarto; depois foi até o escritório do pai no andar de baixo.
- Lionel! - O homem levantou se sua poltrona e veio abraçar o filho. Os dois eram muitíssimo ligados.
Eles sentaram na varanda em poltronas aveludadas e admiraram juntos o pôr do sol.
- Você está sumido esses dias, filho...
- Não todos. Foi apenas ontem.
O pai olhou para ele.
- Lionel, sabe que eu não gosto de me meter na sua vida, ainda mais agora que você já é um homem. Mas me preocupo com você, e sua mãe também. E você nunca sai sem nos avisar...
- Tudo bem pai. Eu vou contar o que aconteceu.
O rapaz respirou fundo.
- Eu estava na biblioteca, como sempre faço quando as aulas acabam. Só que eu fiquei tão envolvido na leitura que acabei saindo apenas quando a bibliotecária me chamou.
- E por isso chegou tarde... - deduziu Gregory.
- Não exatamente. Eu encontrei alguém...
O homem deu um largo sorriso.
- Ah, encontrou alguém... e esse alguém era uma garota?
Anthony baixou a cabeça. Ele era bastante tímido para falar disso com alguém, mas além de ser seu pai, ele era seu melhor amigo.
- Sim, pai. Era uma garota.
- Então não precisa mais me contar nada.
- Não pai. Eu quero contar. Você é o único amigo que eu tenho.
Gregory sorriu.
- Estou ouvindo.
- Ela não estava bem. Parecia estar chorando, e fraca. Então eu a levei para comer e depois a levei para a montanha. O pai estranhou:
- Você nunca levou ninguém na montanha além de nós...
- Ela parecia triste. Eu só sei matemática, álgebra, engenharia, mecânica. Mas não sabia muito bem como ajudar uma garota a se sentir feliz. Por isso a levei para a montanha.
- E ela ficou feliz?
- Bastante. Nunca pensei que uma garota fosse ficar feliz com hambúrguer e uma vista parcial da cidade.
- Existem garotas que se satisfazem com pouco.
Anthony sorriu.
- Ela é uma patricinha. Eu acho que o senhor deve conhecer os pais dela. Seu sobrenome é Wiggins.
O homem estacou.
- Está me dizendo que a garota com quem saiu ontem é parente de Edward Wiggins?
- Deve ser.
- Estamos trabalhando juntos em um projeto. Ele marcou um jantar na casa dele para semana que vem.
Ele olhou para o pai e disse:
- Ela acha que eu sou um bolsista que mora no subúrbio.
- Não quer mudar essa opinião?
- Por enquanto, não.
- Gosta dela? - perguntou Gregory, sem rodeios.
Anthony sorriu.
- No começo, eu a odiava. Mas agora acho que estou começando a ver um lado de Sol que eu nunca imaginei que ela teria...
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O som e as fileiras de carros parados na calçada identificaram a casa de Adams Sammer. As luzes brilhavam intensamente, dando um glamour especial. Sol parou o conversível vermelho uma quadra de distância, numa vaga reservada. Ela estava bastante bonita, com um vestido de alça preto que ia até os joelhos, sapatos e bolsa dourada, e uma pequena coroa dourada na cabeça. Ela entrou, e foi recebida pelo anfitrião.
- Finalmente Sol! Achei que talvez não viesse.
- Eu não poderia faltar a sua festa. Como está tudo por aqui?
- Por enquanto, tranquilo.
- Vou atrás de um drink.
- Bar à direita.
Ela andou por entre a massa de pessoas que dançavam no salão. Pediu uma piña colada, e sentou na bancada para apreciar o movimento.
Depois de algum tempo, resolveu dançar. As coisas pareciam ir muito bem, mas a meia noite, o clima começou a pesar. Ela sentia no ar o cheiro nítido de maconha, e apesar de ter bebido apenas um drink, não se sentia muito bem. De repente, uma briga começou, tudo ficou muito confuso. Com muita dificuldade ela saiu e andou trôpega até onde estava seu carro. Entrou é procurou o celular. Não podia ligar para os pais e dizer que estava bêbada demais para dirigir. E todos os seus amigos estavam na festa.
Até que lembrou.
Procurou o número no celular e ligou.
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Apesar de ser bem tarde, Anthony ainda estava no laboratório. Seu paletó de tweed preto estava jogado encima da mesa, e sua blusa branca impecável estava com as mangas arregaçadas, e a gravata vermelha frouxa. Acabara de sair de uma reunião com o pai, e viera direto para o laboratório.
- Seu protótipo do lápis adaga foi aprovado, Thony.
O seu ajudante de laboratório era um robô de 1,50m de altura, criado por ele mesmo com a ajuda do pai. Além de mantê-lo informado de tudo o que acontecia na casa, ele o ajudava com as invenções, e coordenava os computadores de seu laboratório, monitorando as câmeras de segurança, e rastreando seus carros e motos.
- Muito obrigado, Leo. Como está indo o andamento do meu projeto para melhorar a minha moto?
- O nitro está sendo preparado como o senhor pediu.
- Estarei soldando a descarga e calibrando os pneus. Qualquer coisa, me chame.
Ele colocou a máscara e pegou a solda. Assim que começou a trabalhar, Leo o interrompeu.
- Senhor, tem uma ligação.
Anthony estranhou.
- Pode colocar no viva voz. - Depois de alguns instantes, ele falou. - Alô?
- Anthony?
Ele sentiu o coração parar e soltou a chave de fenda. A pessoa na linha era a última voz que esperava ouvir, principalmente aquela hora.
Sol.
- Sol? Como descobriu meu número?
- Tenho meus contatos. - ela falou com voz fraca. - Estava dormindo?
- Não. Estava trabalhando. Aconteceu alguma coisa?
Tosse e som de vômito foram a resposta que ele obteve.
- Sol, onde você está?
- Perto da casa de Adams. Teve uma briga e eu saí...
- Não saia daí. Chego em cinco minutos.
- Você sabe onde...
Mas ele já havia desligado.
- Leo, ative o rastreador S.
Logo, uma luzinha começou a piscar no telão.
No dia anterior, quando saiu com Sol, o rapaz deixou cair de propósito um minúsculo dispositivo em seu carro. Ele estava se sentindo culpado até aquele momento, mas agora, agradecia a Deus por ter feito aquilo.
- Passe as coordenadas para o GPS da minha moto.
- Qual delas senhor?
Ele estava vestindo o paletó apressadamente, e digitou algumas coisas num tablet.
- Sei lá. A prateada.
As chaves foram liberadas num instante. Ele saiu, deixando o laboratório aberto. Desceu as escadas quase correndo, e discou alguns números na tela do celular.
- Jack? Preciso de você agora!
- Claro, senhor. Onde está?
- Ainda estou em casa. Me encontre na garagem.
O jovem desligou e guardou o celular no paletó. Digitou o código da garagem e procurou a moto. Ligou-a e pegou dois capacetes. Logo, um homem usando uma farda de motorista chegou na garagem.
- Suba na moto. - disse Anthony. - Preciso de ajuda.
Ele entregou um capacete a Jack, que, sem discutir, subiu na moto e acelerou. O homem segurou no rapaz e perguntou:
- Pra onde vamos senhor?
O GPS indicava algum lugar perto do centro.
- Rua das Tulipas.
Ele empinou a motocicleta e acelerou mais ainda nas ruas vazias.
O rapaz foi diminuindo, prestando bem atenção na luz vermelha que piscava no painel. Até que avistou o carro de Sol.
Ele parou a moto em frente ao carro e desceu rapidamente.
- Sol?
Ela estava deitada no banco de trás, e levantou quando o rapaz chegou e sentou ao seu lado.
- Pontual. - disse ela, com um fio de voz.
- Não se preocupe, vai ficar tudo bem. - Anthony tranquilizou-a. - Vou levar você pra casa.
- Não! - ela cravou as unhas em seu braço, que mesmo com o paletó e a camisa, tinha certeza de que havia ficado marcas.
- Devo levar sua moto para casa, senhor? - perguntou Jack.
- Você está de moto? - perguntou Sol.
- Sim Jack. Mas aguarde minha ligação. Vou levá-la para casa.
- Ah... - ronronou ela, aninhando no braço do rapaz. - Porque não me leva para dar uma volta? Estou com fome... Sede...
- Posso levá-la de carro.
- Quero ir de moto. Na sua moto.
Anthony suspirou.
- Tudo bem. - ele pegou as chaves do carro e entregou a Jack. - Leve o carro para a lavanderia, e depois para a casa dela. O endereço é o mesmo que você foi me buscar ontem...
Eles sairam do carro e pegaram os capacetes de Jack, e as chaves da moto. Esperaram ele sair com o conversível, pra depois ir.
- Falava sério quando dizia que estava trabalhando... - disse Sol, tocando na gravata.
- Não costumo mentir.
- Quero comer de novo aquele hambúrguer. Pode me levar?
- Sim.
- E depois para a montanha?
- Não acha que está tarde?
Ela balançou a cabeça, sorrindo.
- Não, e a não ser que você tenha uma namorada que o esteja esperando, acho que pode dedicar um pouco mais do seu tempo para sua mais nova amiga...
Ele sorriu.
- Sabe mesmo como conseguir o que quer, Sol Wiggins.
- Eu tento.
Ele colocou o capacete e subiu na motocicleta. Ela segurou na cintura do garoto e recostou a cabeça em seu ombro. Anthony girou a chave e acelerou.
Sol apertou os braços ao redor do garoto, sentindo uma barriga definida por debaixo daquela camisa. O perfume amadeirado. O toque suave do tecido do paletó.
Anthony parou na lanchonete e pediu dois x-salada, duas sodas e de sobremesa, torta de morango e brigadeiros com castanha do Brasil. Ele pagou e recebeu o pedido sem sair da moto. Em seguida acelerou rumo a montanha.
O céu estava magnífico, cheio de estrelas e com a lua quase cheia gigantesca se pondo em frente a clareira que eles pararam. Os dois desceram da moto, e Sol entregou o capacete para Anthony, que guardou.
- Desculpas por ter te incomodado tão tarde. - Sol sacudiu os cabelos e retirou a coroa.
- Eu ainda estava bem acordado. Nos fins de semana eu costumo dormir as quatro da manhã.
Ela espantou-se.
- Tão tarde?
- O trabalho exige muito.
Ele desembrulhou o lanche e deu a ela, com uma lata de soda.
- No que você trabalha, Anthony?
Ele pensou um pouco e respondeu:
- Com um pouco de tudo. Tecnologia, mecânica, engenharia, física, química...
- Você é realmente inteligente.
Ele ficou admirado.
- Não me chamou de nerd...
Ela pensou um pouco antes de responder.
- Não sei. Acho que eu não vejo mais você como um nerd.
- Então, como você me vê?
Sol não esperava aquela pergunta, e ficou rubra. Ele riu.
- Não responda, por favor.
- Digamos que eu ainda esteja formando minha opinião. Mas você é legal, Anthony.
O jovem tomou um grande gole da soda, e comeu mais um pouco do sanduíche.
- Porque me chamou Sol? - perguntou de repente.
- Eu não confio meu bebê a mais ninguém além de você.
- Mas quem levou o seu "bebê" não fui eu.
- Mas você deve confiar que nas mãos dele estará seguro. Se você confia nele, eu também confio.
Ele fitou o rosto da garota. Ela estava muito bonita, os cabelos ruivos soltos, com os olhos desenhados de gato, um leve rubor na face, o batom vermelho. O vestido preto, que deixava ver o quanto ela era bonita de corpo.
- Quer torta? - perguntou ele.
- Sim.
Ele deu uma a ela e mordeu a sua própria. A massa crocante estava deliciosa, e a calda escorreu pelo canto de sua boca.
- Parece sangue. - disse Sol, passando o dedo no queixo de Anthony.
Foi como se um fio elétrico tivesse passado por ali, deixando um rastro de pontos sensíveis. Ele nunca havia sentido aquilo com nenhuma outra garota.
- Sangue? - perguntou ele meio confuso.
- Quando os vampiros mordem suas vítimas nos filmes, sempre escorre pelo queixo, como agora. - ela respondeu, chegando cada vez mais perto do garoto, que estava encostado em sua motocicleta.
- Gosta de histórias assim?
- Depende. - a moça respondeu, brincando com a ponta de sua gravata. Ela parecia ainda estar meio tonta por causa da bebida. Talvez estivesse se aproximando dele apenas para se divertir. Ou talvez não. - Eu gosto quando a mocinha se apaixona pelo vampiro, e ele por ela. Sem mordidas.
- Isso não é "Crepúsculo"?
- Claro, Edward. E eu serei a sua Bella... - sussurrou ela, enlaçando os braços ao redor o pescoço dele e o beijando.
Ela mal havia tocado os lábios dele quando sentiu o rapaz recuando.
- O que foi? - perguntou ela, ainda com as mãos enlaçando-o.
- Eu seria um canalha se te beijasse assim como você está.
Ela mordiscar a orelha dele e falou baixinho:
- Uma vez alguém me disse que não fazia mal sair da rotina uma vez na vida. Então acho que, pelo menos por cinco minutos, você poderia deixar o cavalheiro perfeito de lado e ser um canalha.
Ele suspirou. A idéia era extremamente tentadora.
- Eu não conseguiria dormir se tocasse em você bêbada. - e consultando o relógio, concluiu. - São quase duas. Acho melhor irmos embora.
- Estou com frio.
Ela esfregava os braços nus, que se arrepiaram com o vento. Ele tirou o paletó e a ajudou a vestir. Ela parecia uma menininha brincando de vestir as roupas do pai.
- Vamos.
Ele entregou-lhe o capacete, os dois subiram na moto e foram embora.

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