Capítulo 47 - Abismo Profundo (2)

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Qiang Yong se agachou diante do corpo desacordado do médico. A neve caia suavemente, começando a cobri-lo devagar. Sem hesitar, o Imperador retirou seu roupão externo e o usou para enrolar Su Ning e aquecê-lo. Seu corpo estava tão frio que ele sentiu um grande medo, mas ao ver que uma leve respiração quente ainda saia de seus lábios entreabertos, ele relaxou um pouco.

O rosto jovem começava a voltar ao aspecto familiar que ele conhecia, de um adulto já formado. Ele tinha que admitir que em todas as idades Su Ning era lindo. Quando criança já era possível reconhecer em seus traços infantis a delicadeza e singularidade de suas feições no futuro, além daqueles olhos grandes e ternos.

No fim da adolescência, apesar de todas as provações pelas quais passou e o constante peso da responsabilidade sobre seus ombros, havia aquele florescer e frescor juvenil que o acompanhava, principalmente na forma como ele prendia os cabelos despreocupadamente, deixando algumas mechas soltas.

E quando adulto, seus traços já estavam solidificados como uma jade polida, ele nem se importava mais em prender o cabelo, deixando aqueles fios escuros e azulados como o oceano emoldurarem sua pele pálida e acetinada.

Qiang Yong o segurou, para carregá-lo de volta para a superfície, porém em um impulso repentino enquanto observava aquele rosto que mudava sutilmente, ele abaixou o rosto e beijou-lhe os lábios com delicadeza. Ele sentiu um medo absurdo de acabar quebrando essa pessoa se fosse um mais brusco, porém aquele ímpeto era incontrolável e se tornou um uma invasão voraz. Su Ning arfou um pouco inconscientemente por ter a respiração retida por tanto tempo.

O coração no peito do dragão não parava de bater freneticamente e sua respiração se tornou caótica. Ele experimentou com a língua o interior quente e úmido da boca do outro, provando a doçura que ele tanto ansiava. Assim, devagar, era melhor do que no "sonho" de primavera que ele tinha tido quando ele o conheceu. Uma de suas mãos livres desceu lentamente pela cintura fina e delineada, mas ao sentir a temperatura corporal baixa ele se lembrou que não poderia perder mais tempo.

Ele recuou e abraçando-o com força, saltou sobre as paredes da cratera usando seu qinggong. Em pouco tempo, ele chegou até a superfície do pátio. Ele sentia cada centímetro de sua pele queimar. Ren Loo encarou a expressão desordenada do irmão e não pode deixar de sorrir. Qiang Yong desviou o olhar imediatamente para o pátio semi destruído.

"Amanhã, vou pedir para soterrar esta cratera. Por hora, vou chamar o dr. Han Chia para avaliar a todos." Ele marchou para dentro da residência com passos duros. Huang Jia e An Shu também estavam de guarda. No início eles viram o encanto da neblina e se ofereceram para entrar juntos, entretanto os dois dragões os convenceram a ficar de fora e resguardar a segurança da Imperatriz.

An Shu ficou bastante transtornado com a condição de Su Ning e foi difícil conseguir acalmá-lo. Qian Young deitou o médico com cuidado na cama de um dos quartos de hóspedes enquanto Ren Long explicava a situação a cobra. Pouco depois, Hu Long anunciou a chegada do médico raposa. Os dois membros da família Ren tiveram uma costela quebrada e Madame Ren ainda tinha algumas escoriações leves que já estavam se regenerando por si mesmas.

Qiang Yong recusou o atendimento, alegando já estar bem. Ele apressou o médico para ver Su Ning. Dr. Han Chia tomou-lhe o pulso e balançou a cabeça com desagrado. Afinal, humanos não tinham como se regenerar. Su Ning estava com uma hemorragia interna e hipotermia. Contando somente com o qi necessário para o funcionamento do corpo, ele não estava conseguindo controlar a deficiência de sangue e calor.

Então a raposa rapidamente se colocou em ação, aplicando suas agulhas de acupuntura. Qiang Yong correu para pedir aos criados novas roupas e cobertas para Su Ning, além de um aquecedor de pés. Rapidamente eles conseguiram normalizar a temperatura e o sangramento, mas no fim o dr. Su ainda estava sob resquícios do encantamento da memória e um dos efeitos colaterais era que mesmo ele tendo voltado a sua forma atual, ele seria atormentado por pesadelos decorrentes das memórias.

Uma pessoa normal geralmente deixava memórias ruins escondidas por muito tempo, até que elas se tornassem tão distantes que não poderiam mais feri-las. E com Su Ning não era diferente, porém com um agravante de que uma parte delas havia sido seriamente danificada por ele mesmo. Então a maldição da memória ao invés de ser uma facada foi como cutucar uma ferida já fechada para ele e sua mente estava um caos de lembranças dolorosas revividas.

Su Ning estava gemendo baixo, com as sobrancelhas elegantes fortemente franzidas. Algumas vezes ele chamava pelos pais, outras vezes sua expressão transparecia estar muito infeliz. Ele parecia muito frágil e lastimável nesses momentos. Ren Loo havia arrastado An Shu consigo, convencendo-o a descansar para ser de alguma ajuda quando o médico se recuperasse.

Han Chia depois de concluir seu serviço também foi para seus aposentos depois de uma longa noite de trabalho duro para estabilizar Su Ning. Qiang Yong foi para seu quarto em seguida, depois que não havia mais ninguém, retornou para ver o médico. Su Ning estava mordendo os lábios em aflição, como se suportasse uma grande dor. O dragão não sabia se era dor física mesmo ou alguma lembrança que estava o perturbando.

Ele se lembrou que Han Chia também tinha ministrado analgésicos, então só poderia ser a segunda opção. Ele segurou a mão do médico acamado e a acariciou, demorando-se nos dedos longos e finos. Ele o chamou próximo ao ouvido, tentando despertá-lo deste sonho ruim. Para sua surpresa, Su Ning abriu os olhos, porém seu olhar era embaçado, como se ele realmente não estivesse vendo.

"Su Ning... o que está te atormentando?"
O médico não respondeu permanecendo com aquele olhar distante. Uma lágrima lentamente escorreu-lhe pela face e ele gemeu baixo novamente.
Qiang Yong segurou a mão dele com firmeza. "Eu estou aqui, você pode me ouvir? Por favor, me ouça..."
Os olhos nublados do médico estreitaram-se para se fechar aos poucos.

Sua consciência flutuava. Ele tinha a impressão de ouvir alguém o chamando. Mas ele estava só... Não havia mais ninguém para estar com ele nesse mundo. Por que ele tinha que continuar a viver? Sua família se foi, seu Shifu e seu shixiong também estavam mortos. Sua mente estava repleta de dor e solidão. Eu quero morrer!

Então aquela voz o chamou suavemente. Eu estou aqui. Havia alguém o esperando. Mas quem? Ele não conseguia se lembrar. Su Ning...
Aos poucos a expressão do médico se suavizou e seus sonhos começaram a se dissipar. Vendo o peito do humano subir e descer sem impedimentos e seu semblante sereno recuperado, Qiang Yong respirou aliviado.

Porém, ele chegou à uma conclusão ao final disso. Ele gostaria de saber mais sobre o passado do médico. Esclarecer certos pontos ainda obscuros. Só que ele teria que fazer isso sem ter que interpelá-lo. As lembranças do passado eram dolorosas demais para serem remexidas mais uma vez. Ele estava disposto a investigar por conta própria.

E faria isso indo até a Seita de cultivo quando o medico estivesse completamente bem disposto, sem que ele soubesse disso. Qiang Yong apoiou-se ao lado de Su Ning, admirando o rosto adormecido. Ele esperou tanto para encontrar esta pessoa... ele poderia suportar um pouco mais a ansiedade de possuí-lo para si.
Com estes pensamentos, Qiang Yong adormeceu ao lado da cama de Su Ning sorrindo abertamente.

Nota da Autora:

Que pena... achei que eles já iriam se resolver, mas ainda há muitos nós nesse enrosco... afinal, Su Ning nunca procurou Qiang Yong e nem falou que o conhecia, ele não poderia apenas tê-lo esquecido, né? Quem esqueceria um homão destes kkkkkk?

O Imperador Yao e Seu Médico HumanoOnde histórias criam vida. Descubra agora