Su Ning sentiu uma grande tristeza em seu peito. O método de seu shifu, que deveria servir para o bem, se mostrou uma arma letal para o mundo e todo seu trabalho duro foi perdido. Duas das espadas foram destruídas, agora só faltava uma. Ele apertou a espada com toda sua força, até sua mão começar a sangrar.
Usando então a técnica de fabricação de armas, o sangue envolveu a espada como vários tentáculos e a partiu em milhares de pedaços minúsculos e brilhantes, quase a reduzindo a pó. Su Ning inclinou-se um pouco para frente, o suor também lhe escorria pela testa. Era doloroso! Terrivelmente doloroso! Ele mal conseguia respirar e com muito esforço inspirou e expirou lentamente até tentar se acostumar com a dor.
Qiang Yong franziu a testa. Era uma sensação sufocante e ele se aproximou do médico. Ele tentou tocá-lo, mas suas mãos apenas atravessaram a imagem da lembrança. Ele sentiu a impotência de não poder intervir no passado. Porém, Su Ning não havia terminado sua missão. Faltava se livrar da técnica.
Ele destruiu a espada, usando a ligação de sangue que possuía com ela. No caso de Cheng Doi ele teve que cortar essa ligação e depois destruir a espada. Agora, com a ponta dos dois dedos ele facilmente conseguia com um gesto usar golpes de ar como lâminas e então ele direcionou esse gesto contra seu próprio núcleo espiritual.
Apesar da dor de mutilar a própria alma, ele se concentrou na memória que queria remover e começou a puxá-la lentamente para fora do núcleo, como se tivesse puxando um fino fio. Esta era uma técnica conhecida como Artesão da Alma, era uma técnica proibida, obviamente o nome já indicava o porquê. Era também uma técnica muito difícil de se controlar e exigia grande habilidade por parte do usuário.
Raríssimos cultivadores eram capazes de usá-la. Tung Shiu era um desses e de seus discípulos, apenas Su Ning a aprendeu com perfeição. Nesse momento, o médico arrancou a memória do núcleo, formando a fissura que agora existia nele. A dor foi tão intensa que ele não conseguiu conter as lágrimas que rolaram quando a memória foi cortada da alma.
Ele rapidamente agarrou o fio, e como se tivesse uma agulha começou a costurar a ferida espiritual de Qiang Yong. O imperador o encarou chocado. Então foi assim que ele o curou??? Usando esse fragmento de alma?? Ele não conseguia acreditar, ainda mais porque ele estava curando-o enquanto sangrava profusamente. Mesmo quando ele bloqueou seus pontos de acupuntura, demorou muito para que o sangue estancasse.
O núcleo espiritual também estava colapsando e a única alternativa que ele tinha foi bloquear o máximo de meridianos possível para evitar a perda de qi. Por fim, quando ele terminou com Qiang Yong, ele começou a traçar de um dos meridianos outras cordas espirituais e as usou para remendar o próprio núcleo. Este cordão era diferente de sua alma e só serviria para interromper a perda de energia até que o núcleo cicatrizasse.
A respiração de Su Ning estava ofegante e terminada a tarefa exaustiva, só lhe restou a dor excruciante e a fraqueza. Ele perdeu sangue, qi, a arma espiritual e uma de suas memórias, estes dois últimos ligados a fragmentos de sua alma. Não era à toa que o núcleo foi tão danificado!
Ele olhou para o yao, a respiração dele já havia se equilibrado mas ainda poderia haver dor. A linha feita a partir de sua memória era agora apenas energia espiritual desprovida de significado. Ele não teria como obter informações sobre ela. Su Ning conseguiu que ela de certa forma fosse útil para algo, já que ele não poderia usá-la em si mesmo e também não teria mais muito qi para fazer um segundo cordão para curar o yao.
Ele tentou não pensar na dor em seu peito nem na sua visão embaçada ou no suor que não cedia. Ele estava desenvolvendo uma febre e estava desmoronando de cansaço. Como último esforço, ele retirou de uma bolsinha qiankun um frasco contendo remédio para dor, igual ao que ele havia dado para ser ministrado a Chen Doi.
Ele ergueu um pouco a cabeça do yao e ajudou-o a beber e engolir as pílulas. Ele poderia ainda sentir dor quando acordasse. Ele observou as feições bonitas do rosto agora tranquilo. Parece que é do clã do dragão, ele pensou. Essa era a primeira vez que ele via um dragão. Seus traços eram imponentes e a pele da cor do trigo. Os cabelos eram tão pretos, como tinta.
Ele o limpou, suturou e enfaixou o corte no peito. Também deixou um outro frasco, contendo água, e um pequeno bolinho de arroz embrulhado em uma folha de bambu. Ele pretendia deixar um sinal de fumaça na frente da caverna, havia um exército yao acampando por perto, eles deveriam estar a procura deste membro.
Assim, ele juntou algumas folhas secas que foram trazidas pelo vento na frente da caverna para fazer a fogueira quando saísse. Depois ele desbloqueou os pontos de acupuntura que atingiu antes no peito do yao e esperou um pouco para ver como ele reagiria. Esta era a parte que Qiang Yong se recordava. O yao despertou aos poucos, parecendo muito confuso. Su Ning ficou aliviado. Parecia que estava tudo bem agora.
Ele estava o observando à distância para evitar que o yao se sentisse intimidado novamente. Qiang Yong observou este cuidado do outro e odiou-se pela sua terrível reação inicial. O dragão conseguiu se sentar e viu o curativo feito. Ao mesmo, tempo viu o cultivador de antes levantando-se e fazendo menção de sair. Ele teve um momento de lucidez e gritou com a energia que lhe restava: "ESPERE!"
"Ah... você não precisa se preocupar. Está tudo bem agora." O médico respondeu com a voz fraca, mantendo distância. A dor parecia só piorar com o tempo. O Qiang Yong expectador podia sentir a sensação de esmorecimento e a tortura que ele estava padecendo. A ferida do núcleo queimava como se estivesse sendo queimada com ferro em brasa. Era mil vezes pior do que ele previa... O dragão sentiu o forte cheiro de sangue e com certeza não era o dele!
"Espere! Você também está ferido, não é? Me diga ao menos o seu nome."Sim! Eu cuidarei de você! Vou abraçá-lo e protegê-lo de tudo que tentar feri-lo! O outro Qiang Yong rangeu os dentes. Su Ning hesitou um pouco, mas a ferida dele era complicada, nem mesmo ele sabia se poderia tratá-la...
"Não precisa se preocupar. Eles virão logo."
"Você não precisa ter medo. Você me ajudou, eu não vou machucá-lo. Eu vou retribuir sua ajuda, deixe-me recompensá-lo."
"Não há necessidade. Esta guerra acabará logo. E é isso que importa.""Como...como sabe disso?"
"Está guerra... logo terá um fim. E humanos e yao finalmente terão paz. Você pode esperar. O imperador humano pedirá uma trégua ao imperador yao. Não faz sentido continuar com isso."Era melhor partir e se recuperar aos poucos. Eles estavam em uma guerra e ele ainda precisava ajudar o imperador humano a emitir o decreto que combinaram.
"Também há água e comida. Eu vou deixar uma fogueira aqui na entrada... há um acampamento yao por perto, eles com certeza vão vir quando a virem."
Su Ning sorriu por baixo do véu que cobria seu rosto. Na penumbra o yao captou aquela imagem. Parecia um homem jovem, talvez de uns vinte e pouco anos."Você parece estar bem informado sobre isso." O yao conseguiu se levantar, percebendo que não sentia tanta dor. Ele viu o sangue escuro tingindo o roupão azul do cultivador. Talvez se ele o segurasse, ele não seria capaz de fugir. Mas poderia revidar também. Ele precisava pegá-lo desprevenido. "Diga ao menos o seu nome... eu quero poder te agradecer."
Su Ning desconfiou das intenções do outro e afastou-se ainda mais. Afinal, os yao não tinham nenhuma razão para gostar de humanos."Você não me deve nada." Ele apenas acenou com a cabeça, estalou os dedos e as folhas secas que ele juntou se incendiaram. Então ele saltou, dessa vez, com dificuldade, para se esconder em uma das cavernas situadas nos patamares mais acima da montanha. O dragão tentou impedi-lo mas era tarde, ele não pode ver em qual direção ele foi e não poderia encontrá-lo mais.
Nota da Autora:
Que pena, mas Su Ning não tinha mesmo como confiar no dragão, eles ainda estavam em guerra e a reação de Qiang Yong a primeira vez que o viu não foi nada favorável.😢
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O Imperador Yao e Seu Médico Humano
RomanceO Imperador Dragão Qiang Yong conseguiu após anos de uma guerra incessante estabelecer a paz entre humanos e yao. Entretanto, ele ainda nutria um certo ódio por humanos. Entretanto quando a Imperatriz Viúva adoece subitamente e nenhum de seus médic...