Capítulo 39 -Tentativa de Aproximação

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Su Ning terminou seu relato de uma forma breve. Era tudo que ele conseguia se lembrar. Depois do café da manhã, ele foi conduzido até uma sala e estava sentado em um sofá arhat cercado pelos olhares atentos de todos. Até então ele se preocupou em se lembrar de todos os detalhes essenciais daquela manhã, porém, agora que tinha encerrado a estória, vendo todos olhando para ele, seu rosto corou de vergonha.

As servas perceberam isso e riram baixinho na manga. Tão fofo! Os outros pareciam ocupados demais perdidos em seus próprios pensamentos.
"Então a última lembrança sua foi de ir colher ervas para tratar dos seus irmãos doentes?" Ren Loo murmurou pensativa. Qiang Yong estava acompanhando o raciocínio da irmã. Primeiro uma epidemia de fungo negro assolando as planícies centrais e depois as montanhas do norte e agora duas crianças doentes repentinamente. Isso com certeza não havia acabado bem.

A Imperatriz suspirou ao lado da criança, acariciando-lhe o ombro.
"Gostaria de ter conhecido seus pais. Como eles eram?"
Essa resposta era fácil para um Su Ning criança dar. "O meu pai era bem alto e bem forte. Mas ele era muito tranquilo e falava pouco. A pele dele é um pouco mais escura, por causa do fogo eu acho."

Ele sorria ao descrevê-lo mas no fundo sentiu um aperto desconhecido no peito. "Algumas pessoas dizem que eu me pareço mais com a minha mãe. Nossos cabelos são parecidos. Ela também é alta e as sobrancelhas dela estão sempre arqueadas. Ela sempre ri, mesmo quando está nervosa." Ele fez outra pausa. "Ela também é muito inteligente!"

A Imperatriz riu. "Eu entendo. Você só poderia ter sido criado por pessoas maravilhosas mesmo."
"Su Ning, você disse que sua mãe estava estudando o fungo negro." Qiang Yong disse lentamente. "Vocês estavam tomando cuidado para que ele não se espalhasse?"
"Sim!" O menino arregalou os olhos assustado. "Mais ninguém sabia onde ficava a cabana e quando não estávamos lá ela ficava trancada. Eu mesmo nunca toquei no fungo, porque ele parecia ser capaz de crescer em tudo..."

Su Ning abaixou a cabeça, triste.
"É horrível não é? Nós não somos nada diante de uma doença assim. Até os yao ficaram doentes... Alguns humanos não gostam de yao, mas diante da doença, estamos todos sob a mesma sina."
Qiang Yong ergueu os olhos perplexos. Como essa criança tinha esse tipo de pensamentos??? Vendo aqueles olhos tristonhos ele sem querer estendeu a mão e bagunçou-lhe o cabelo.

"Voce tem ideias pesadas demais para uma criança."
Su Ning virou a cabeça para olhar para aquele yao. Ele queria poder entender o sentimento de segurança e conforto que ele lhe transmitia, que o fazia querer estar ao lado dele. Ele conheceu muitos yao e não os temia. Inclusive, os levava até sua mãe para atendê-los. Su Xue não fazia distinção entre seus pacientes, fossem eles yao ou humanos, estrangeiros ou residentes da vila.
"Se é um ser vivo, então é igual a mim." Su Xue disse uma vez ao filho enquanto atendia um yao.

Su Ning nem precisava anotar as palavras de sua mãe, ele as guardava na memória e principalmente no coração. Mas poderia muito bem escrever um livro com tudo o que ela dizia. Su Xue parecia falar até para compensar o que sei marido não dizia. Entretanto as ideias de Su Wu não eram diferentes e os dois eram como um só.

Agora os pensamentos de Su Ning voltaram-se para o dragão gentil. Ele não se parecia em nada com seus pais, era muito direto, objetivo e prático, mas parecia gostar dele.
"Bem, agora você terá que se lembrar do resto." Qiang Yong disse. "Aconselho que não se esforce muito, assim será mais difícil. Apenas relaxe a mente e tente pensar no passado algumas vezes. Isso deve desbloquear as lembranças."

"Seria melhor então eu entrar em meditação?" Su Ning considerou a hipótese com uma expressão séria.
Qiang Yong engasgou chocado e Ren Loo caiu na gargalhada. "Por Buda! Quem te ensinou isso??" Ela passou a mão no rosto. "Deixa eu adivinhar, foi a sua mãe?"
Su Ning assentiu, confuso. "O que há de errado?"

"Você é uma criança muito precoce! Qiang Yong quis dizer para que você se distrair um pouco e deixasse as memórias fluírem. Não para ficar totalmente concentrado nisso."
Ren Loo estalou a lingua. "Tive uma ideia! A-Shyu porque você não vai brincar com ele no pátio? Ele vai gostar de ver o jardim!"
Ren Shyu que esteve esse tempo todo calado, só observando os adultos babarem em cima de uma criança pequena, ficou contrariado.

"De onde a senhora tirou essa ideia? Eu não sou uma criança para ficar brincando!"
"Ora, Ren Shyu! Não seja atrevido! Ou você não consegue nem cuidar de uma criança pequena?" Ren Loo retrucou bem-humorada.
"Que criança? Até ontem ele era um adulto com mãos de 200 anos!"

"Hunf! Você não precisa cuidar dele! Eu mesmo ficarei fazendo companhia ao meu mestre!" An Shu sibilou e assumia a forma de uma pequena cobra se enrolando no pulso de Su Ning. O garoto o olhou espantado.
"Oh! Você é uma cobra mesmo?"
"O mestre não se lembra de mim" An Shu choramingar. "Você não me quer por perto?"
"Que criança iria querer uma cobra?" Qiang Yong aproveitou a deixa para falar

"Não! Não é isso!" Su Ning corrigiu sua fala. E acariciou a pele da cobra. "Me desculpe. Essa foi a primeira vez que vi um do seu tipo."
An Shu ficou feliz como se tivesse sido novamente aceito por seu mestre e afagou o pescoço contra a pele dele. "Que bom que o mestre não me odeia! Tive medo que você me repudiasse!"

Qiang Yong bufou."Como se ele pudesse fazer isso. Falou a cobra que não sabe nada da vida do mestre e nem sobre o temperamento dele!"
Ren Loo não se deu por vencida a empurrou o filho e Su Ning para fora. "Pelo menos seja amigável com ele! Você precisa saber lidar com humanos! E nós temos muito o que falar aqui, isso não é conversa para vocês!"

Ren Shyu saiu sob protestos, mas no fim, agarrando o pulso de Su Ning, o conduziu até o pátio, deixando os adultos conversarem.
"Bah! Sempre me tratam como criança!" Ele reclamou quando chegaram ao jardim. Imediatamente a atenção de Su Ning voltou-se para as plantas, mas então ele olhou para o jovem dragão e pensou em algo para tranquilizá-lo.

"Ah... você não precisa se preocupar comigo... você deve ter muitas coisas importantes para fazer. Eu posso só ficar aqui tentando lembrar." Ele disse com segurança. Aquelas palavras fizeram Ren Shyu se envergonhar, como se ele realmente não fosse capaz de cuidar de uma criança! Entretanto esta mesma criança parecia bem mais madura do que ele.

"Eu... não tenho nada contra ficar aqui com você, na verdade." Ele coçou a cabeça e virou o rosto. "Só que é tão estranho vê-lo assim. Nao que você não fosse estranho antes, sendo tão amigável...Você lembra um pouco o adulto mas ao mesmo tempo é... diferente."
"Você também me conhecia?" Su Ning sentou-se na grama com as pernas cruzadas, admirando as plantas.

"Hum, sim." Ren Shyu o acompanhou.
"Eu posso te fazer uma pergunta? Você me parece ser muito sincero sobre o que pensa." Su Ning perguntou e Ren Shyu sentiu-se lisonjeado.
"Se eu souber responder."
"Disseram que eu sou médico... eu sou realmente um bom médico?" Su Ning abaixou a cabeça, um pouco ansioso. Ren Shyu o olhou com espanto. Seu tio tinha razão! Essa criança tinha pensamentos pesados demais! Mesmo assim ele parou para pensar um pouco.

Afinal, o garoto o achava franco e esperava uma resposta sem floreios. No fim, o que ele realmente pensava do médico?
"Sim..." Ele respondeu lentamente. "Na verdade, eu acho que hoje deve ser um dos melhores médicos do mundo." Ele pensou que o outro ficaria orgulhoso, porém ele recebeu um olhar penetrante até os ossos.
"Eu trato a todos sem distinção? Eu não cobro muito caro?"

"Eeeh, sim. Você trata todos muito bem. E o preço, é bem baixo também." Ele se sentiu encurralado por aquele olhar. O menino sério sorriu com uma expressão aliviada.
"Ufa, agora me sinto bem melhor. Desde que falaram que eu era um médico que eu queria saber isso." Ele acariciou An Shu, ainda preso sob seu pulso. A cobra ouvia com curiosidade este lado que desconhecia de seu mestre.

"Por que?"
"Eu quero estar a altura da minha mãe. Quero ser como ela."
Ren Shyu assentiu de leve, compreendendo. Ele também sentia muita admiração pelo tio. Era o mesmo desejo.
"Acredito que você conseguiu o que queria. Você poderá confirmar isso quando recuperar sua forma original. E se você não se lembrar dessa nossa conversa, eu mesmo te falarei isso de novo."

Su Ning deu um um sorriso sincero. "Obrigado. Aliás, obrigado a todos vocês por estarem cuidando de mim."
Ren Shyu lhe deu alguns tapinhas no ombro. Talvez fosse mais fácil ele lidar com um Su Ning criança mesmo.

Nota da Autora:

Ren Shyu é uma adolescente tão rebelde, mas está tão pitico neste capítulo. Quero uma arte do Su Ning pequeno também 😚.





O Imperador Yao e Seu Médico HumanoOnde histórias criam vida. Descubra agora