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Quantidade de palavras: 2004
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Segundo meus pais, meu avô e Ren, eu estava a cerca de uma semana na cama. Eles não paravam de insistir para eu me levantar, e algumas vezes até me convenceram a comer, beber água, tomar banho e coisas cotidianas que agora me pareciam sem sentido. Só que não iria durar, em poucas semanas a estada de meus pais aqui acabaria, os dias do meu avô estavam se aproximando do fim, e Ren viajaria um pouco depois.

Meus dias estavam contados, juntamente dos deles. Era até tranquilizante saber que não precisaria me preocupar mais com minha vida. Ouvi uma batida do outro lado da porta, seguida de uma voz conhecida:

– Filho?

Respondi com um desanimado murmúrio e ele entrou no quarto. Era terrível como em duas semanas seu estado havia piorado tanto, me perguntava se era a preocupação que estava deixando-o assim. Se fosse isso mesmo, preferia afastar o pensamento, tudo o que eu não precisava era me sentir mais culpado ainda.

– Como vai, garotão? Com fome ou sede?

Meu avô sentou ao meu lado na cama, neguei com a cabeça. Ele começou a acariciar meus cabelos, com uma expressão que esbanjava ternura, simpatia e preocupação.

– Seus pais estão perguntando-lhe se já está preparado para sair da cama.

Me peguei rindo com a estupidez dos meus pais.

– Os avise que não vou levantar.

Meu avô suspirou, mas logo continuou seus avisos do mundo fora do quarto, fingindo uma alegria estranhamente forçada:

– Ren não para quieto, só vem para comer e olhe lá. Me pergunto o que está fazendo.

Ele riu nervosamente e ao não perceber uma resposta vinda de mim, se retirou, sabendo que seria inútil tentar conversar comigo agora.

Eu estava quase adormecendo quando meus pais entraram fazendo uma bagunça no meu quarto, dizendo que Ren estava no hospital. Não sabia se aquilo era uma brincadeira de mau gosto para me fazerem levantar, mas quando parei para prestar atenção em seus rostos, eles pareciam muito desesperados, então ainda muito desanimado, me levantei e andei até o carro dos meus pais.

Ao chegar no hospital, uma figura conhecida de olhos azuis que não esperava ver estava em pé, me encarando como se tivesse visto o ser mais horroroso, nojento e asqueroso da Terra. Aquele olhar era como um ácido corrosivo que me consumia com culpa e me deixava para agonizar sentindo uma dor tão profunda que era capaz de fazer qualquer um se contorcer no chão implorando por ajuda.

Meus olhos transbordavam a sensação de desespero sem que me desse conta. Me senti envergonhado e movi meu corpo até os fundos do hospital, que julgava ser o melhor lugar para fugir daquele olhar azulado que me assombrava como um fantasma de frieza.

Me escondi em algum canto e deixei que as torrentes salgadas rolassem, não conseguindo esquecer o modo que ele me encarou. Aquilo era aterrorizante, mas certamente seria mais aterrorizante para ele, afinal, o cordeiro abatido era ele. Não eu. Eu sou o culpado. Ele é apenas a vítima. Meu peito doía tanto que parecia uma bomba relógio prestes a explodir, me sentia completamente vulnerável, tanto física quanto emocionalmente. Não só meu peito como também minha cabeça latejava, e àquela altura eu nem sabia mais o motivo.

Me sentia como um passarinho que fora acertado por um caçador e agora estava sangrando até a morte sem saber o motivo de tamanha crueldade. Mas ao mesmo tempo sentia que eu era o caçador, acertei uma criatura tão livre e bela e agora ela não passava de um cadáver amedrontado no chão. Eu tinha acertado meu próprio passarinho, e eu estava o assistindo agonizar e sangrar, me sentindo sujo porque tirara a vida de um ser inocente e não consciente da morte.

#‹𝑶𝒍𝒉𝒂𝒓 𝑪𝒂𝒓𝒎𝒆𝒔𝒊𝒎˚₊Onde histórias criam vida. Descubra agora