Pelos Motivos Certos

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I

O grande salão do castelo de Ponta Tempestade era adornado por grossas colunas de pedra e janelas compostas por vitrais. Como era noite, os vitrais faziam pouca diferença. A luz era emanada por velas que compunham um enorme lustre, e algumas outras espalhadas em candelabros. Havia uma longa mesa retangular sobre um tablado, onde Borros estava sentado ao lado de suas filhas. No resto do salão, outras mesas de madeiras, redondas, eram preenchidas por outros nobres e convidados. Poucos casais dançavam alegremente na pista, cuja música provinha de um grupo de trovadores. Um homem vestido com um gibão colorido parecia contar piadas às filhas de Borros, como se as entretesse. Somente uma delas ria das graças do homem.

Lucerys observava o ambiente ao redor para se desviar de todas as sensações incômodas que disputavam seu peito naquela noite. Sentado ao lado de Rhaena em uma daquelas mesas redondas, tinha ambas as mãos em sua taça de vinho. Apertava os dedos em torno dela; estava tão desconfortável.

- Você está tão mudo - Rhaena murmurou ao lado, sorrindo. Ela arrastou a mão pela mesa até alcançar uma das de Luke. Entrelaçou os dedos aos dele, ao que foi bem recebida.

O problema é que Luke não conseguiria disfarçar o quanto suas mãos estavam suadas e frias.

- É meu estômago - mentiu. - Não estou acostumado com a comida desse lugar.

- Vai mentir para mim, Luke? - Rhaena riu, mas parecia desapontada. - Você pensa que não te conheço?

Lucerys havia sido prometido a Rhaena assim que nascera. Ela era mais velha, e uma mulher realmente admirável; diferente de Helaena e assim como Baela, Rhaena era uma guerreira. Não tinha puxado de Daemon somente os cabelos platinados e os olhos lilases; tinha também herdado a fúria, a determinação e um humor simplesmente inabalável. Era uma mulher de ferro. Os cabelos claros eram ondulados e armados; as sobrancelhas eram retas, dando-lhe olhos de águia. Ainda assim, era gentil. Era errado enganá-la, e Luke sabia disso. Apesar de nunca terem trocado mais do que carinhos nas mãos e palavras de ternura, um dia ela seria a sua esposa. Era isso que Rhaenyra e Daemon desejavam.

- Que cara é essa, Luke? Está assustado? - Ela brincou. - Antes, você não ficava assim quando eu segurava a sua mão.

- Claro que não - respondeu, firme, apertando os dedos dela com os seus. - Não é nada do tipo.

- Eu entendo - a mulher murmurou, mantendo apenas um sorriso fraco. - Nós crescemos e passamos a querer outras coisas, certo? Eu também já passei por isso.

- Você... passou?

Ela assentiu com a cabeça e desceu os olhos para a mesa.

- Não vamos falar de coisas tristes - corrigiu. - Leve-me dançar, Luke. A pista está animada e eu estou entediada de ficar aqui sentada.

Lucerys gostaria de se convencer de que o motivo do peso em seu peito naquela noite era somente o remorso por enganar Rhaena, mas seria uma grande mentira. Enquanto caminhava com ela para a pista de dança, concluía que havia uma segunda agitação que o perturbava: Aemond estava naquele evento para escolher uma noiva.

O destino era tão injusto, que mais cedo naquele mesmo dia, Luke havia provocado o tio com ciúmes; tinha perguntado abertamente ao loiro se o motivo de seu mau humor era o fato de se sentir enciumado com a presença de Rhaena na viagem. Agora, Lucerys provava de seu próprio veneno: sentia uma raiva tão grande a cada vez que observava as filhas de Borros Baratheon, que optava por manter os olhos baixos durante toda a ocasião.

A música tocada pelos trovadores era alegre. Luke obrigou-se a colocar um sorriso no rosto e subiu os olhos para sua noiva, que sorria de volta, apesar de alguns detalhes em seu semblante indicarem tristeza. Conduziu-a pela pista como havia praticado inúmeras vezes nos cômodos reais. A dança envolvia mulheres e homens separando-se em dois diferentes lados, para se encontrarem novamente no centro. Batiam palmas e pés; rodopiavam juntos, com as mãos na cintura; encostavam suas testas e voltavam a se afastar, repetindo os movimentos num ritmo cíclico e sem fim. As coreografias mudavam um pouco a cada música, mas como os passos tinham origens comuns para toda a nobreza, a dança era instintiva.

Behave Yourself - LucemondOnde histórias criam vida. Descubra agora