Uma noite

159 11 34
                                    

Hoje
Rio de Janeiro
Apartamento de Giovanna Antonelli

Não sei se Alexandre se cansou de falar ou se simplesmente não tem mais palavras. Ele falou um bocado. De medo e de como vencê-lo. De aprender com os erros do passado. De como juntos somos pessoas melhores do que jamais fomos quando separados.

Alexandre está dizendo tudo que eu precisava que ele tivesse dito há anos. Ouvi tudo o que ele tinha a dizer, mas não falei muito.

Esperava que estivesse frustrado comigo a essa altura, mas ele não está. Está caloroso. Gentilmente tranquilizador. Mais compreensivo do que jamais foi.

— Não estou atrás de nenhuma garantia aqui, Gio. — diz ele. — Só uma chance. Uma oportunidade para tentar.

Tentar esquecer o que houve no passado e simplesmente amá-lo outra vez? Seria bom.
Mas tentar nem sempre é o bastante.

Limpo a garganta e encontro minhas palavras.

— Mesmo que eu aceite tentar, o que te faz pensar que não vou fazer exatamente o que você fez naquela época e estragar tudo?

Pela primeira vez hoje, vejo um pouquinho de irritação.

— Porque você é melhor do que eu. Sempre foi. Infinitamente mais sábia e mais forte.

Se eu não estivesse tão ansiosa, riria.

— Alexandre, se tem uma coisa que eu não sou é forte. Se fosse, a essa altura eu já teria superado você e seguido com a minha vida. Não estaria aqui, considerando seriamente a possibilidade de te dar outra chance.

— Bobagem. Você é forte porque está aqui, encarando seus medos, em vez de correr deles. Se eu tivesse essa força, essa história teria tido um final feliz há muito tempo.

Inspiro profundamente e solto o ar devagar. Por mais que eu queira deixar o passado para trás, esta conversa traz tudo de volta, com detalhes que embrulham meu estômago. Meu peito fica apertado a ponto de doer.

Reconheço os sinais de um ataque de pânico. Eu já tive um ou dois antes, todos D.A. — Depois de Alexandre. Normalmente Rodrigo me acalma.

Hoje, sei que é meu instinto de lutar-ou-fugir.

Alexandre acaricia meus braços quando percebe o que está havendo. É claro que ele reconhece os sintomas. Seus ataques de ansiedade foram o que nos destruiu.

Seis anos antes
Rio de Janeiro
CCPAC

O sol se põe, e eu não me movo.
Ale me envia uma mensagem para dizer que ela encontrou um antigo ficante e não virá para casa esta noite, e eu não me movo.

Tenho uma vaga noção de que estou em choque, mas não sei se deveria estar. Ainda não sei o que aconteceu.

Alexandre.
Alexandre aconteceu, mas...
Ele terminou mesmo comigo?
Não.
Não.

Se ele tivesse terminado comigo eu saberia, certo?

Ele estava nervoso, claro, mas estava zangado com Erika, não comigo. Não. Nem era culpa da Erika. Ele estava zangado consigo mesmo. Então por que me sinto tão... inadequada?

Fico de pé e me espreguiço, mas isso não alivia a dor em meus ossos. Preciso fazer alguma coisa. Ajudá-lo.

Eu devia ir até lá e lhe dizer que, seja o que for que ele esteja sentindo, nós vamos resolver juntos. É isso o que os casais fazem, certo? Mas será que ainda somos um casal?

Pego minha mochila com mãos trêmulas e vasculho até achar meu celular. Uma vozinha me avisa para parar. Diz que, se eu falar com Alexandre, ele vai esclarecer minha dúvida e, neste momento, eu prefiro uma vaga esperança a uma certeza sombria.

MJ | gnOnde histórias criam vida. Descubra agora