Livro aberto

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Hoje
Rio de Janeiro
Apartamento de Giovanna Antonelli

Minha cabeça está apoiada em seu peito, meu braço ao redor de sua cintura. Eu me agarro à sua camisa como se ela pudesse me manter no lugar. Aqui, onde tudo o que aconteceu entre nós fica à margem da minha consciência feito ruído branco. Não esquecido, mas mais desbotado.

Depois de nosso confronto no corredor, ele me trouxe para cá. Fez com que eu me deitasse e garantiu que tudo ficaria bem. Agora ele me envolve com seus braços e me faz carinho.

Ainda não consigo acreditar que ele está na minha cama, o cenário de tantas fantasias angustiantes que eu tive com ele. Estamos os dois completamente vestidos e em total silêncio e, no entanto, é o máximo de intimidade que tenho com um homem desde... bem, desde quando estava com ele.

Alexandre pega minha mão e a coloca sobre o peito, e a pressiona contra sua pulsação e suas promessas silenciosas. Consigo senti-lo desejando que eu confie nele.

Quero confiar, mas é como se meu coração estivesse agora pequeno demais para ele. Quando ele foi embora, meu coração murchou feito um balão, cada vez mais vazio e desinflado, e com o passar do tempo ele se atrofiou e permaneceu assim. E agora Alexandre quer que eu abra espaço para ele de novo, mas não sei como.

— Nero?

— Hmmm?

— Quando você soube que era capaz de... mudar? — Ele acaricia minha mão por alguns segundos, mas não responde. — Quer dizer, você tentou mudar quando estava comigo, certo? Ficar mais aberto?

— Sim. Nossa. Eu tentei tanto. E falhei miseravelmente.

— Então, como você mudou do cara que me abandonou duas vezes para o cara que você é agora?

Ele olha para mim.

— Eu disse que fiz terapia por três anos, certo? E não estou falando só de uma sessão por semana. Nas piores fases eram duas, três sessões semanais. Meu terapeuta tinha uma paciência de santo.

— É, mas você podia ter feito terapia quando estávamos juntos, não?

— Tecnicamente, sim. Mas só de pensar nisso eu ficava apavorado, e nós dois sabemos que naquela época eu era governado pelo medo.

— Então como você decidiu que não estava mais apavorado?

Alexandre toma fôlego e expira.

— Eu esperava não ter de lhe contar essa história, mas acho que você merece saber.

— Que história? — Fico arrepiada, certa de que não vou gostar do que vou ouvir.

Ele pega minha mão e a enfia por baixo de sua camisa. No lado esquerdo de suas costelas, meus dedos tocam uma cicatriz. Eu já tinha notado durante nossas cenas de amor, mas sempre estava muito ocupada com seus beijos para descobrir mais.

Puxo sua camisa para cima e me inclino para ver melhor.

— O que é isso?

Ele alisa meu braço enquanto continuo a tocar a pele áspera.

— Isso foi por onde enfiaram um tubo no meu pulmão para drenar o sangue que estava me afogando.

Olho para ele, com o cenho franzido.

— E tem mais esta... — Alexandre pega minha mão e a leva até sua cabeça. Na parte de trás, há outro local onde a pele se eleva. — Esta é onde minha cabeça se chocou contra uma árvore. Catorze pontos.

Fico nauseada.

— Alexandre, o que...?

Ele pega minha mão e brinca com meus dedos.

MJ | gnOnde histórias criam vida. Descubra agora