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HEIDI

— Eles são lindos!

Alguém disse ao meu lado quando minha consciência me alertou de que havia vida em algum lugar. Ou eu morri, mas a vida continuava, ou eu permanecia ali, naquele mundo, naquele universo, naquele poço de incertezas e de dor.

Abri os olhos e no primeiro instante havia apenas um borrão. Uma claridade disforme e em movimento. Voltei a fechá-los. O bip quase imperceptível me dizia que eu continuava no hospital. O incômodo em minha mão também.

— Como ela está?

Era a voz da minha mãe, reconheci de imediato, e isso fez com que meu coração disparasse e fizesse com que a atenção de quem estivesse ali, se voltasse para mim.

— Jade? — Anny chamou.

— O nome dela é Heidi — minha mãe repreendeu a mulher.

— Perdão. Nós a conhecemos como Jade, apenas eu sabia o nome verdadeiro dela, ninguém mais — Anny, com seu jeito doce e gentil, se desculpou com a minha mãe, uma mulher séria e severa, contudo, com um grande coração.

— Heidi, filha — ela chamou.

Por obrigação, abri os olhos e me esforcei até que tanto o rosto dela quanto o de Anny ganhassem foco à minha frente.

— Como está se sentindo? — Anny falou com um imenso sorriso.

— Como se eu tivesse caído no triturador — avisei com certo esforço.

Encarei minha mãe. Em nenhum momento, todas as vezes que imaginei aquele reencontro, acreditei que ela sorriria ou se alegraria por ter me reencontrado. Eu desapareci sem nada dizer. Só abri a porta e parti. E sabia que isso a machucaria, que a deixaria desesperada, porém, havia um desespero maior dentro de mim, o mesmo que não me permitiu voltar e me despedir.

Por isso, quando minha mãe me encarou de volta, eu reconheci toda a mágoa, a tristeza e as perguntas que ela não faria enquanto Anny estivesse presente. E eu roguei aos céus para que Anny não fosse embora tão cedo.

— Como estou? — perguntei a Anny.

— Seus filhos estão bem — minha mãe respondeu. — Os dois. Um menino e uma menina.

Puxei o ar com força. Um menino e uma menina. Meus olhos se encheram de lágrimas. Foram oito meses de dúvidas, incertezas, e angústias que me fizeram dizer a equipe médica que me acompanhava, que não desejava saber o sexo dos bebês. Cogitei entregá-los para adoção e seguir com o circo, que planejava mudar de cidade. Entretanto, quando minha barriga cresceu e eles começaram a se mexer, uma sensação estranha me invadiu e eu não podia mais pensar em nada que não fosse arrumar uma maneira de continuar com eles, os dois.

— Já sabe os nomes? — Anny disse com animação.

— Não. Ainda não. — Limpei a garganta e me dei conta do quanto eu sentia sede. — Posso beber água?

— Pode. O médico passou aqui e liberou sua dieta líquida — Anny me deu um pouco de água em um copo reservado na mesinha ao meu lado. — Eu pensei que você fosse... que vocês...

— Há quanto tempo estou aqui? —- Interrompi Anny de continuar com o drama.

— Os bebês nasceram hoje pela manhã, mas já é noite.

— Eu dormi esse tempo todo?

— Foi um parto difícil — minha mãe avisou. — Sua amiga entrou em contato quando presumiu que você morreria.

JEAN KUHN - A REDENÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora