Capítulo 15 - O Regresso

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 O avião finalmente ingressou na Ilha Pantheon, depois de muitos dias. As quatro amigas saíram, uma por uma, todas extremamente receosas. De todas ali, Camila era a que mais estava hesitante — afinal, só tinha concordado ir depois de muita insistência das amigas.

Olhou para os lados. Tudo estava exatamente da mesma forma desde a morte de Otávio. E pensar que aquele monte de coisas tinha acontecido desde então... Parecia absurdo. Principalmente o fato de sua própria mãe ter cometido os assassinatos.

— Certo — afirmou Julieta, que se localizava à frente de todas. — O plano: eu investigo o segundo andar, Camila e Rebeca investigam o primeiro e Letícia investiga o porão.

— Por que nós duas vamos investigar o primeiro andar? — perguntou Rebeca, genuinamente confusa.

— Porque o primeiro andar fica mais perto do porão e do segundo andar. Se eu ou a Letícia precisarmos de ajuda, vocês estarão disponíveis.

— Ah, certo!

— Então, tão preparadas?

— Não! — interveio Camila. — Eu acho que é muito arriscado a gente ficar investigando por conta própria. Se a mamãe realmente fez isso, a gente tem que deixar a polícia agir e pegar ela.

— Mas a polícia não tá agindo, Camila! — gritou Julieta, enfurecida. — É exatamente por isso que a gente tá aqui!

— Eu não acho que seja uma boa ideia — Cruzou os braços.

— O problema é seu. Agora que a gente já tá aqui, é mais fácil nos ajudar do que ficar reclamando.

— Tudo bem, tudo bem. Eu ajudo.

Inconformada, Camila foi a primeira a entrar na casa. Secretamente, toda aquela angústia dentro de si escondia um sublime medo: medo de que o assassino fosse algo mais além de sua mãe.

. . .

Julieta subiu o local, apreensiva. Duas enormes escadas encaracoladas levavam a uma grande plataforma no topo, evidenciando um espaçoso mezanino que introduzia os quartos. Uma forma realmente criativa para os construtores preservarem tempo e dinheiro, reconstruindo somente uma pequena parte do piso do segundo andar.

Caminhou pelo pequeno corredor. Conseguia, com clareza, ver as irmãs Hermetti abaixo de seus pés, entrando e reentrando em todos os cômodos. Ela, em si, não tinha muito para ver — além dos quartos, nada havia senão um envelhecido piano de cauda, entre as duas escadas. Um mezanino era um lugar um tanto quanto inadequado para se pôr um piano gigantesco.

Continuou, analisando cada um dos quartos. Procurava detalhes que, como policial investigativa, já se cansava de procurar: papéis entre as tábuas de madeira, objetos reveladores dentro de gavetas ou armários, ranhuras ou outras pistas reveladoras mantidas nas portas. Contudo, nos primeiros três quartos, não houve nada além de frustração.

Foi no quarto quarto, contudo, que tudo mudou, Inicialmente, nada foi encontrado além da básica poeira. No entanto, foi observando o teto que encontrou algo potencialmente revelador.

— Gente, acho que encontrei algo aqui! — gritou. Havia um padrão muito distinto e único entre as tábuas do teto, formando um quadrado peculiar que se diferenciava do resto.

Logo, deu alguns socos na região. Conseguiu achar, entre os toques, uma pequena maçaneta, que revelou um grande alçapão secreto.

Cuidadosamente, usou a cama para escalá-lo. Aquilo parecia um tanto quanto estranho para ser somente uma passagem para o sótão. Afinal, não havia outra.

Realmente, era algo a mais. Julieta chegou a tossir por conta da poeira e teve de acender uma lanterna para conseguir enxergar pela escuridão. Era assustador: joagada no chão, havia a imagem de uma mulher familiar. Era uma das vítimas do incêndio. Isabel Hudson? Acreditava que seu nome era esse. Posteriormente, checou no seu bloco de anotações. Era Isobel Hudson. Suas pesquisas em enciclopédias e livros de história citavam-na como "uma estudiosa recatada, descendente de irlandeses e casada com o político Dan Hudson. Cospiracionistas afirmam que Isobel seria, na realidade, uma jovem irlandesa de nome Selena Murphy, filha de um importante político, Gerald Murphy, que faleceu em 1871". Bem instigante, na verdade.

Perto da foto, estava um livro. Parecia um aglomerado de instruções bizarras sobre como invocar espíritos, similar a um 'A Chave de Salomão', mas muito mais desconhecido. O título lia-se 'Gæstgerýne Larboc'*. A julgar pela qualidade, parecia remeter ao século XVI, ou até antes. E isso era realmente assustador.

Pegou o livro para si, antes de descer o alçapão com todo o cuidado possível. Ali, contudo, viu um vulto assustador se deparar, imediatamente fazendo-a derrubar o objeto no chão: era Letícia.

— Ah, Letícia. É você. Que alívio!

— Vim aqui porque a Beca me pediu pra alimentar a Tangerina no avião, e eu me esqueci. Agora só falta achar essa gata maldita.

— Ah, certo — Olhou para os lados. — Procura ela, então.

— O que você quer me contar? — Cruzou os braços.

— Eu achei algo que parece um livro de invocação pra ressuscitar uma das vítimas do incêndio.

— O quê? — Gelou, não podendo crer no que ouvia. — Então você tá me dizendo que tem mesmo a porra de um fantasma nessa história?

— Não, calma. Pode ser só pra nos despistar... Mas temos que considerar tudo — Agachou-se, recuperando o livro caído. — Olha, uma frase dessa página foi marcada!

— O que diz?

— 'For sum sáwol ærist, seofongetel sáwol adúnestígan. For thee sawolhus deofolseocnes, þri sáwol adúnestígan'

— Isso é grego?

— Não. Provavelmente é inglês antigo.

— Você sabe traduzir?

— Deixa eu ver... 'For some soul..., seven souls... For the body..., three souls...'. 'Para alguma alma..., sete almas... Para o corpo..., três almas...'.

— Será que não é sobre a ressurreição? Algo como 'Para alguma alma ser ressuscitada, sete almas devem ser sacrificadas'? É o que mais faz sentido.

— Eu temo que seja isso. Se são sete almas necessárias e já morreram quatro...

— Significa que, se os planos do assassino derem certo, três de nós vamos morrer e só uma vai sobreviver.

— Hm... Mas e a segunda parte? Acho que, como está falando de corpo, deve ser sobre possessão.

— Julieta! Três almas! Otávio, Guilherme e Cecília. Isso seria o suficiente pra uma possessão!

— Possessão essa que seria suficiente pra chegar voando até o carro e matar o Thales e a Júlia?

— Sim. É isso que eu quero dizer. Talvez, só talvez, o próprio fantasma que tá fazendo esse ritual, e não tem assassino de carne e osso.

— O quê? Não é possível... — Começou a olhar para os lados, como se estudando as possibilidades. — Bom, de qualquer forma, volta lá. Vai procurar a gata.

Deu as costas, enquanto Letícia expressou um sorriso singelo.

* Em inglês antigo, 'Epístola dos Mistérios Espirituais'.

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