XII. Vento no Litoral

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Sim, minha irmã faltar à escola é tecnicamente um desperdício de dinheiro, mas todo momento ao lado dela não tem preço. É como fazer academia — você se sente na necessidade de ir depois que a fatura chega. É como pagar duas entradas para o cinema e rasgar na frente dos cartazes.

Mas nada jamais é em vão, senão o tempo que guardamos na conta poupança. De fato, que, à primeira vista, soa como uma boa ideia investir o momento de agora para aproveitá-lo melhor mais tarde. Até o Collor decidir confiscar a poupança e congelar os preços. Até um caminhão perder os freios e te atirar à sarjeta com uma força resultante da aceleração de quinze toneladas.

O que vier primeiro.

Você até pode achar que seu filho vai ser um médico, até no meio do caminho ele decidir não querer perder seis anos integrais em faculdade, três anos em especialização e o resto da vida trabalhando feito um condenado. É uma década inteira na melhor das hipóteses. É quase metade do que eu já vivi. Essa vida, ainda por cima, deveria ser a tal da recompensa de uma competição desumana de mil para um num sistema de educação desigual.

Isso não é sobre educação financeira, é economia do tempo. Se você vai despender esses dez anos estudando porque é algo que você realmente gosta, vá em frente e não olhe para trás. O problema é que eu passei tempo demais lutando pelo que eu não queria para perceber, vestindo uma camisa e uma bermuda de praia na frente da casa da minha sogra, que essa minha felicidade de agora é a mesma serotonina de um milionário.

Ao contrário do que alguns dizem, o dinheiro realmente traz felicidade, mas não pode te comprar o tempo que você perdeu. Pode dizer o que você quiser, mas todo investimento é uma aposta. Ninguém investe a casa, o carro e todas as economias num plano de ações com lucro a longo prazo.

Onde você vai morar, enquanto isso? O que você vai comer?

Invista o seu tempo como você investe o seu dinheiro. Deixe um pouco para o amanhã, mas não se esqueça que você ainda tem três refeições para fazer no dia de hoje.

E isso tudo foi o que me passou pela cabeça somente para justificar o fato de que eu iria gastar dinheiro indo à praia.

Depois de três toques na campainha da casa, Carolina me apareceu com um roupão preto de verão que lhe cobria um maiô de cor síncrona, óculos escuros sobre suas olheiras e um chapéu escuro de praia. Eu nunca havia parado para reparar, mas até que o preto combinava bem nela.

Carolina abaixou os óculos e espiou-me por cima das lentes.

— E aí, bonitão? — disse ela, afiando seu olhar. — Acho que é a primeira vez que eu te vejo sem aqueles óculos quadradões.

— Eu também estava sem os óculos naquela noite de réveillon; mas não me impressiona que não tenha percebido quando tirei.

Ela soltou uma risada acanhada e balançou a cabeça. Um relance sem jeito e um gracejo sem pleito. Carolina olhou para mim e para minha irmã, repreendendo-me com um olhar e traindo-se com um sorriso.

— Olha, não se fala essas coisas perto de crianças, viu? — murmurou ela, contendo um riso. — Vamos elevar o nível da conversa, por favor.

— Ela nem está escutando — repliquei. — Não é, Laura?

— Eu estava sim! Tudinho! — respondeu ela, balançando a alça de seu balde de brinquedo. — Mas o que é que tem demais?

Não era bem a resposta que eu estava esperando, mas às vezes as coisas se escrevem certas por linhas tortas. É melhor deixar a conversa morrer do que ter que inventar uma mentira para preservar sua inocência. Os óculos sempre foram mesmo um detalhe irrelevante.

O AnacronistaOnde histórias criam vida. Descubra agora