Como diabos eu deveria me explicar?

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Estava sentada à mesa de jantar, fitando inexpressivamente minha taça de vinho. Noah tinha acabado de ir para seu quarto, deixando-me sozinha com meus pensamentos. Meus olhos pousaram na tigela de doces que Maria vinha colocando sobre a mesa, e a mini barra de Butterfinger imediatamente me fez pensar em Maraisa - não que eu precisasse de um lembrete para pensar nela. Eu pensava nela todo santo dia.

Um mês havia se passado desde a tarde em que ela foi embora da minha casa. O Natal passou, e agora estávamos no começo de janeiro - o começo de um ano novinho em folha, no qual jurei parar de fazer merda. Decidir não contatar Maraisa novamente foi parte dessa resolução. Estava sendo dificil, mas me convenci de que era o melhor a fazer. Qualquer ação que eu tomasse só deixaria a situação ainda pior.

Quando ela abaixou a boca em direção à minha naquele dia, tudo que eu mais queria era beijá-la. A decisão estava nas minhas mãos. Maraisa havia me entregado a iniciativa. Mas ao invés de tomá-la e fazer o que queríamos, eu surtei. Eu sabia que se deixasse as coisas seguirem por essa direção, não haveria mais volta - mesmo que beijá-la teria sido a coisa mais natural que eu faria em muito tempo. Fiquei a um fio de me inserir em lugares aos quais não pertencia, tanto literal quanto figurativamente. De modo direto, minha atração por Maraisa era egoísta. Eu não era a mulher certa para ela, em nenhum sentido, forma ou modo. Então, fiz a difícil escolha de encerrar o que estava acontecendo antes que saísse do controle.

Eu tinha certeza de que ela havia tirado a conclusão errada ao sair correndo da minha casa. Esperava que ela não se sentisse envergonhada por tentar tomar a iniciativa, especialmente quando a iludi. Eu deveria estar envergonhada - envergonhada por contatá-la depois que ela pediu demissão de seu emprego na Elite, quando deveria ter deixado as coisas como estavam. Envergonhada por não ter conseguido esconder a droga da minha excitação - nas duas vezes em que ela me massageou, mas especialmente na última vez. Envergonha pelo fato de que eu ainda assistia aos seus malditos vídeos de música todas as noites e por essa ser a única forma de eu conseguir dormir. Essa era a parte mais difícil - eu ainda a via. Todas as noites. Só não em carne e osso.

A voz de Maria veio por trás de mim, interrompendo minhas ruminações.

— Você tem andado preocupada. Bom, mais preocupada do que de costume.

— Que bom que você esclareceu essa última parte, porque eu basicamente estou sempre preocupada mesmo.

Maria era minha funcionária, mas estabelecemos uma amizade havia muito tempo. Não era incomum ela se intrometer quando sentia que algo estava estranho.

Como se tivesse lido a minha mente, ela disse:

— Talvez esteja na hora de você marcar outra massagem.

Minha mandíbula tensionou. Era a primeira vez que ela tocava nesse assunto desde a saída desconfortável de Maraisa. Fiquei surpresa por ela ter demorado todo esse tempo para pegar no meu pé por isso, mas, aparentemente, meu período de paz havia acabado. Pigarreei.

— Isso não vai mais acontecer.

— Por que não?

— Não é muito a minha praia.

— Aquela massoterapeuta era muito bonita.

— O que isso tem a ver? — vociferei.

— Não sei. Apenas senti algo naquele dia quando voltei mais cedo. Pensei que podia estar acontecendo algo a mais.

— Bem, você pensou errado.

— Não é da minha conta, Mari. Mas você sabe que seria perfeitamente aceitável se estivesse acontecendo alguma coisa, não é? Faz quase dois anos desde que Luísa morreu. Ela gostaria que você seguisse em frente.

M. Mendonça | G!POnde histórias criam vida. Descubra agora