Capítulo 17 - Dia Agitado

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Ontem à noite, quando Toni enfim ligou (quer dizer, acho que foi ela, porque o número era privado), deixei o telefone tocar até cair na caixa postal. E hoje de manhã, enquanto me arrumo para a escola, apago o recado sem sequer ouvir.

— Você não está nem um pouquinho curiosa? — pergunta James, rodopiando na cadeira da escrivaninha, com uma roupa preta, tipo Matrix, e os cabelos penteados para trás.

— Não. — Olho para o moletom de Mickey, ainda na sacola da loja, e escolho outro para vestir. Outro que ela não tenha comprado para mim.

— Pelo menos você devia ter me ouvido. Agora eu poderia fazer um resumo de tudo pra você.

— De novo: não. — Enrolo os cabelos na altura da nuca e uso um lápis para prendê-los num coque.

— Também não precisa descontar no cabelo, né? Caramba, o que ele lhe fez? — James ri. Mas, ao perceber que não vou responder nada, olha para mim e diz: — Não entendo você. Por que essa raiva toda? Vocês se perderam na autoestrada e a Toni esqueceu de dar o número dela. Que mal há nisso? Quer dizer, quando foi que você ficou assim tão paranoica?

Balanço a cabeça e me viro, sabendo que ele está coberto de razão. Estou com muita raiva. E sou paranóica, sim. Mais que isso: sou uma louca que se irrita com qualquer bobagem e sai por aí ouvindo pensamentos, vendo auras e sentindo a presença de espíritos. Acontece que meu irmão não sabe da história toda, e não estou disposta a contar.

Não sabe, por exemplo, que Peaches nos seguiu até a Disney.

Nem que Toni sempre some quando a garota está por perto.

Prestando mais atenção na fantasia reluzente dele, pergunto:

— Até quando você vai brincar de Halloween?

James cruza os braços e faz um bico.

— Até quando eu quiser — diz.

E quando vejo os lábios dele, trêmulos, ameaçando chorar, sinto-me a pior das criaturas.

— Poxa, James. Desculpe. Sinto muito se falei alguma bobagem. — Pego minha mochila e jogo sobre os ombros, desesperada por um pouco de paz, não vendo a hora de encontrar algum tipo de equilíbrio na vida.

— Não sente porcaria nenhuma — ele me encara, bravo. — Está escrito em sua testa.

— Claro que sinto, James. Acredite, não quero brigar com você.

Ele balança a cabeça e levanta os olhos para o teto, batendo um dos pés no carpete.

— Então, você vem comigo? — Vou para a porta, mas James se recusa a responder.

Então respiro fundo e digo: — Ande logo, James.Você sabe que não posso me atrasar.

Resolva logo, vá.

Novamente ele balança a cabeça, agora de olhos fechados. Quando enfim os reabre, eles estão vermelhos e marejados.

— Não tenho de estar aqui, você sabe! — diz.

Encosto na maçaneta da porta, impaciente. Preciso sair, mas sei que não posso. Não depois do que acabei de ouvir.

— Do que você está falando?

— Digo, aqui! Tudo isso! Você e eu, nossos encontros. Eu não tinha de estar fazendo isso!

Encaro meu irmão, sentindo um frio repentino na espinha. Não quero ouvir mais nada.

Fiquei de tal modo habituada com a presença de meu irmão que sequer cheguei a supor que talvez ele preferisse estar em outro lugar.

— Mas... mas achei que você gostasse de vir aqui — digo com um nó na garganta, a voz refletindo meu pânico.

para sempre - choniOnde histórias criam vida. Descubra agora