nós estamos aqui com você

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Prazer, me chamo derrota. Me sinto horrível. Meu rosto está uma vergonha, todo amassado, porque dormi com a cara no travesseiro. E agora que lembrei da noite anterior, sinto-me mais patético ainda. Eu cheguei ao cúmulo da estupidez. Ao cúmulo da estupidez, veja só! Duas lamparinas ainda estão acesas e ainda visto as mesmas roupas de ontem, concluindo que dormi na mesma hora que Jisung saiu. Me sinto péssimo.

Lavo o rosto e troco de roupa, mas por que sinto que sou o mesmo de ontem? O arrependimento me aninha em seus braços, e sou apenas um humano sem nem saber para onde vai e que a única certeza da vida é que ela acaba. Talvez eu tenha pisado na bola, porém não me culpo totalmente. Desço as escadas e não me culpo totalmente. Eu falei o que vinha do coração, eu falei minhas verdades, eu não menti em nenhum momento, não omiti em nenhum momento. Não vou me sentir mal por isso. E, atravessando o jardim e passando pelo espelho d'água, eu percebo que talvez eu ainda esteja meio bravo.

Mas, porra. Eu saí do quarto e Han vai ficar puto se descobrir que saí sem ele me buscar. Mas já que estou aqui fora, é melhor eu procurá-lo para pedir desculpas. Ou tentar me explicar pelo surto de ontem.

Quando chego na sala de jantar, a maioria está comendo. Eu dou bom dia, e sem querer meus olhos tropeçam nos olhos do avô de Han. Ele tem um ar autoritário, como se fosse até um pecado olhá-lo. Eu apenas o cumprimento ao juntar as duas mãos e continuo a procurar Jisung ou, quem sabe, a irmã dele. Tern está sentada na pontinha da mesa, que agora percebo ser apenas para familiares mais próximos, já que só tem o avô, os tios e filhos. Alguns primos estão na cozinha, provavelmente por serem distantes. Agora percebo que o fato de eu comer na mesa deles deixa tudo desconfortável, porque eu não sou da família. Por que Jisung me faz comer aqui mesmo?

— Tern, oi, bom dia — aproximo-me dela, puxando uma cadeira para sentar. — Você viu o Jisung?

— Ahnn.... Não — ela fica olhando ao redor e eu sigo seu olhar. Não temos êxito, ele não está em lugar nenhum. — Coma alguma coisa. Eu já terminei, posso procurar por ele.

— Ok, muito obrigado — ajeito-me na cadeira enquanto ela se levanta.

Ignoro minha própria vergonha ao me servir. Mas, parando pra pensar, se Jisung não está aqui na sala, não preciso comer, porque ele não vai me cobrar. Quando eu vê-lo outra vez, com certeza posso dizer que já comi. Então só como um pouquinho de nada, para não sair da mesa repentinamente e as pessoas pensarem que sou maluco. Ainda não me acostumei com o fato de ter alguém aqui para pegar meu prato sujo, porque meus princípios insistem em dizer que eu mesmo deveria levar e lavar. Mas, também, meus princípios são malucos. Muitas vezes eu penso: você quer uma cadeira para sentar? Pois então plante a árvore, corte a madeira, talhe a cadeira e enfim se sente. Nem eu consigo entender.

Após o café pela metade, recebo notícias de Tern sobre o irmão... Ele não está em lugar nenhum, nem mesmo na biblioteca. Ela diz que vai procurar no quarto, eu fico tentado a ir junto, mas como não houve convite, sento-me num banquinho de madeira e fico olhando o laguinho ornamental. Que porra de lugar está Jisung? Nem atendendo minhas ligações ele está.

você: hannn 😭😭🥵🥵
você: cadê você
você: preciso falar contigo 😞

Ele não me responde. Ele nem recebe, na verdade. Deve estar sem internet ou com o telefone desligado. Não sei o que fazer. Talvez o telefone deva ter descarregado, já que Jisung normalmente esquece de colocar para carregar. Ele deve estar em algum lugar por aqui.

— Não está no quarto — Tern surge como um samurai. — E a bolsa que ele trouxe nem está lá.

Porra, a única coisa que ele trouxe foi essa bolsa. Se não está aqui, então... Não, não, não. Jisung não fez isso, fez?

— Tem como a gente falar com Jamie? — peço.

— Com James? — ela começa a andar apressadamente e eu vou com ela. — Claro, venha.

Eu estou começando a ficar nervoso, porque a última coisa que ele me falou foi que eu não teria mais que me preocupar em vê-lo. Que isso quer dizer? Eu estou tão irritado agora, caminho pondo extremo peso na pisada e quero achar James o mais rápido possível. Encontramos ele perto do chafariz, lavando a mão na água. Felizmente, não preciso falar nada, porque Tern pergunta por mim. Ele responde, ela pergunta mais e assim a conversa se desenrola.

— Ele foi embora mais cedo — a menina traduz para mim, após nos despedirmos de James e a lavagem estranha dele. — Seis da manhã. James levou ele de carro até o aeroporto, mas Jisung entrou numa cafeteria ali perto antes de James ir embora. Ele acredita que Jisung tenha entrado no aeroporto depois de comer alguma coisa na cafeteria.

— Então Han me abandonou? — eu paro de andar. Meu Deus... — Ele me abandonou aqui?

— Calma, Minho... — Tern tenta me acalmar, mas está tendo efeito contrário. — Sua passagem de volta é para quando?

— Acho que daqui a dois ou três dias — respondo, e agora percebo que minha voz está meio trêmula. Porra, eu vou acabar chorando.

— Guys, que está acontecendo? — Ethan pergunta, aproximando-se de nós.

— A gente brigou ontem e ele disse que não iria mais me ver — eu explico para Tern na melhor forma possível em coreano, porque estou tendo dificuldade em formar frases em inglês. — Ele foi embora da Tailândia e me largou aqui.

— Não foi isso, não... É um "misunderstood"! — eu não faço a mínima ideia do que isso se trata, mesmo assim não foco nas palavras que não consigo traduzir. — Vem, vamos assistir um filme... Nós estamos aqui com você, não se preocupe.

Não me preocupar? Não me preocupar, sério? Han me largou aqui, como não vou me preocupar? Como não me preocupar? Parem de me levar pela casa adentro, foquem no meu pedido de socorro. É sério que isso é real? É mesmo real? Eu estou machucado, ele simplesmente sumiu e deve estar no avião agora. Será que mereço isso mesmo? Eu mereço isso mesmo?

Eu ligo para Chan enquanto escolhem o filme. Eu poderia dizer sobre como conheci boa parte da estrutura da casa vindo para essa mini salinha de cinema, porém não tenho nem forças ou energia para me importar com essas coisas. Chris está no meio de uma reunião, é o que me responde por mensagem após perder minha ligação. Deixa lá. Deixa lá.

Não importa se colocam o filme legendado em coreano para mim, se tem pipoca amanteigada ou se o refrigerante é um que eu gosto. Eu me sinto horrível. A irmã de Jisung fala que vai me levar ao aeroporto quando eu for embora, que pode me ajudar a me divertir por aqui, mas que também não acredita que Jisung tenha feito isso. Repete de novo misunderstood, que depois de traduzir no Google descubro que significa mal entendido. Não, não. Ele me deixou aqui mesmo.

Eu digo que vou ao banheiro, já perto do final do filme, mas lá dentro eu mando uma mensagem para Jisung.

você: EU TE ODEIO
você: TE ODEIO PRA CARALHO

Eu desisti do xixi, mas minutos depois preciso voltar ao banheiro para fazê-lo. Estou cansado e magoado. Eu nunca iria imaginar que Han iria embora e me largaria aqui. Logo ele, com quem tenho uma conexão tão forte. Eu o odeio tanto. Odeio tanto. Eu não quero mais falar com ele, ainda que esteja checando meu celular a cada quinze minutos. Mas não importa. Não importa. Eu o odeio tanto. Odeio demais.

crises et chocolat • minsungOnde histórias criam vida. Descubra agora