CAPÍTULO 2: MIRA

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Ver meu irmão pegar fogo, foi tipo: UAL! CARAMBA!
Evan estava assustado, é claro, até eu ficaria. Dumble sabia que ele era um bruxo, disse que sempre sentiu uma energia mágica emanando dele. E Dumble, era um duende. Um duende chato, mau humorado e que as vezes dava vontade de chutá-lo para longe. Mas, ele era o nosso amigo, não tínhamos muito. E o encontramos ele na casa em que morávamos quando era bem pequenino. Ele crescera com a gente e se tornara parte de nós. Evan e eu fomos abandonados quando tínhamos sete anos, desde então, aprendemos a viver de algum modo, ás vezes passar fome, se alimentar com um resto de pão que encontrávamos. Assim era a vida de quem era trazido pra cá. Para Margholia. Uma cidade cheia de criaturas mágicas poderosas e ruins. E não tinha saída. Margholia era separada do resto dos outros lugares. Era isolada por uma enorme Fenda que nos separava.
Havia prédios altos, casas, como uma cidade normal. Mas, nada aqui era normal. Éramos bombardeados. Meu irmão e eu fomos banidos pra cá porque diziam que éramos Nascido das Sombras, e eu nem sei o que isso significa.
Depois do incidente com o vampiro, pensei que talvez tínhamos alguma chance. Evan era bruxo. Será que eu também era?
Nós continuamos a caminhar pela floresta em busca de um abrigo, e nós esperávamos que tivéssemos sorte, porque logo estaria anoitecendo e não queríamos ficar na floresta sozinhos. Sabíamos o que aconteceria. Como o vampiro por exemplo, provavelmente haveria outros monstros esperando para nos atacar.
Evan estava quieto e eu também. Pensei nos nossos pais. Será que eles sabiam sobre a gente? O que nos tornaríamos no final?
Eles eram temidos também. Diziam que eles eram nascidos das sombras e que éramos os únicos que restaram. Meus pais estavam mortos. E talvez, todos foram eliminados.
Estava ficando tarde e ainda não encontramos nenhum lugar para nos abrigar. Não sabíamos se era seguro voltar para a cidade, se é que ela ainda existisse, pois tudo estava sendo bombardeado quando saímos, incluindo nossa casa. Bom, nunca sentimos que aquela era a nossa casa, mas com certeza, era melhor do que morar na rua.
Evan me chama e quando olho para ele, vejo que ele está segurando algo.
- O que é isso? - pergunto ao me aproximar dele.
Ele sorri e me entrega.
- Maçã?
- Ual! - eu falo e dou uma mordida - Está muito gostosa.

Evan sempre foi muito protetor, sempre tentando dar o melhor de si, nós sobrevivemos por causa dele. Ele não era do tipo musculoso, ele era magro, tinha o rosto anguloso, era loiro, infelizmente eu puxei os cabelos escuros, e ele tinha olhos azuis, e os meus eram escuros.
Nunca vi Evan reclamar da vida que tínhamos, acho que no fundo, ele acabou se conformando e, sobreviver foi o que ele escolheu para nós dois.
- Obrigada, Evan! - agradeci - Lembra quando roubávamos maçã de Rouvatt?
Evan riu.
- Sim! E como ele inchava as bochechas de ódio! - Evan imitou como as bochechas dele ficavam e não tive como não rir.
- Volta aqui, seus desgraçados! - Evan imitou, gargalhando.
O Sr. Rouvatt era uma criatura nem um pouco amigável, e era louco por maçãs, e sempre guardava várias dentro de uma bolsa velha que ele sempre carregava para onde ia.
Foi então, que após um descuido, Evan e eu conseguimos roubar algumas maçãs e saíamos correndo. Ele era uma criatura estranha, com cabeça de peixe e o corpo tinha tentáculos. E o Sr. Rouvatt usava óculos, como se fosse alguém muito culto. Depois de um tempo, nós não o encontramos mais. Não sabemos o que aconteceu com ele.
Evan estava caminhando ao meu lado, Dumble estava no ombro dele.
- Vocês deviam andar mais depressa, está anoitecendo e isso não é bom!
- Não sabemos para onde ir, Dum - respondeu Evan, - Aqui só tem árvores e nada mais!
Ele apenas revira os olhos.
- Evan, ele está com medo! - falei, Dumble estava transpirando.
- Por que, Dum? - Evan perguntou.
Dumble fica em silêncio.
Olho desconfiada para ele. Ele sabe de alguma que não sabemos.
Evan e eu continuamos a perambular pela floresta, eu estava cansada. A floresta parecia não ter fim. A lua estava cheia, e o céu estava escuro. E silêncio. Havia apenas o silêncio novamente.

- Eu não estou gostando desse silêncio, é muito estranho! - falei para Evan, que parecia muito tranquilo.
- Relaxa, logo encontraremos um lugar. - Ele respondeu, tentando me deixar mais calma.
Minhas pernas já estavam fracas, eu queria descansar. Queria estar dormindo numa cama quente, sem me preocupar com nada. Quando ia fechar os olhos para me imaginar em outro lugar, Evan grita.
- Olha, o que é aquilo? - ele diz, apontando para algo que está bem na nossa frente.
Tento enxergar no meio de tantas árvores, mas não vejo nada.
- Onde? - pergunto.
- Ali! - Evan dispara a correr.
Corro atrás dele.
- Espere, Evan!
Ele não me escuta e continua a correr através das árvores. Então, ele para de repente.
- O que você... - paro de falar, e fico surpresa ao ver uma caverna imensa.
O que uma caverna estaria fazendo naquele lugar, do nada? Algo não me cheirava bem. Na entrada da caverna havia algumas caveiras jogadas no chão, crânios, esqueletos, pedaços de ossos, todos espalhados. E um cheiro muito, muito ruim. Não conseguiria descrever o cheiro, nem se eu tentasse.
- Pronto, encontramos abrigo!
- Você está louco, Evan? - perguntei indignada - Não podemos ficar aqui!
- É único lugar que encontramos, Mira! - disse Evan - E já anoiteceu!
Ele tinha razão. Se continuássemos talvez encontraríamos algo ruim, mas eu estava com um pressentimento ruim quanto aquele lugar.
- Tudo bem então - falei - Me dê sua mão.
Evan pegou minha mão, respiramos fundo, tentando não vomitar com aquele cheiro horrível e entramos dentro da caverna.
Estava escuro e parecia que eu estava pisando em alguma coisa que fazia estalo. Caminhava na ponta dos pés. Estava tão escuro que não conseguia ver Evan, mas sentia sua mão na minha.
- Estou vendo uma luz mais á frente... - anunciou Evan - está vendo?
Logo á frente havia um pontinho de luz, e eu estava grata, porque, andar no meio da escuridão, sem saber onde pisar é horrível. Sabe se lá o que podia haver aqui dentro.
Continuamos a seguir juntos até aquela luz misteriosa.
Cada vez mais chegando até ela.
Quando chegamos perto, vimos o que estava ao nosso redor: mais caveiras, mais crânios, símbolos estranhos por toda parte, e no chão havia um círculo que devia ser uma conjuração, um tipo de ritual, pois tinha símbolos dentro dele, estrelas de cinco pontas e sangue derramado no centro.
- Onde estamos? - perguntei, olhando ao redor, e pior, não havia apenas caveira e esqueletos nas paredes, mas cobras, várias delas, entrando pelos buracos dos crânios, que eram a boca do esqueleto.
Me arrepiei e Evan parecia estar sentindo o mesmo.
No meio de tudo aquilo, havia uma mulher num canto, afastada e presa em correntes.
Ela era linda, cabelos negros e tinha cobras no pescoço, e estava com seus olhos vidrados em nós, parecia que ela olhava no fundo de nossas almas. Seu olhar era ardente como fogo.
A mulher pegou uma das cobras que se envolvia pelo seu corpo e acariciou-a, sorrindo para mim.
- Não esperava visitas tão jovens... - disse ela, num tom um tanto amigável - De onde vocês são? O que fazem aqui?
- Somos de Morgholia, da cidade... - respondi.
- Vocês são bruxos, não são? - perguntou a mulher.
Como aquela mulher sabia disso?
- Apenas meu irmão. - respondi.
Ela estava acabada, vestida em farrapos, embora sua aparência fosse majestosa, como uma mulher tão bonita pudesse estar naquela condições?
- Você deve estar se perguntando porque eu estou aqui nessas condições... - disse ela, sem tirar os olhos de mim, como se adivinhasse meus pensamentos.
Evan estava paralisado com a beleza dela.
- Eu fui banida para cá, eu era uma bruxa comum - ela começou a contar - me apaixonei por um homem mortal, que apenas queria usufruir dos meus poderes. Mas, um dia eu me vinguei, fiz com que ele engolisse cada moeda, que se derreter no estômago dele. Então, deixei de ser uma bruxa da luz, e fui para as trevas. Todos me temiam, pois sabiam quem eu era e o que eu tinha feito. Humanos são fracos e merecem a morte.
Ao mesmo tempo que fiquei com pena dela, também senti medo.
- E como sabe de mim? - indagou Evan - Como sabe que sou bruxo?
- Eu posso sentir o cheiro de vocês. - ela respondeu - Nós temos um cheiro diferente dos humanos.
- Vocês? - perguntei, sem entender o que ela havia dito.
- Sim, minha doce garota, você também é uma bruxa. Vocês Nascidos Das Sombras demoram um pouco para descobrir seus poderes, mas quando descobrem... Bem, causam destruição quando são invocados pelas Trevas.
- Invocados?
- Sim, todo Nascidos Das Sombras ao completar dezesseis anos, a magia é convocada numa luta entre bem e o mal. E o que vence, é o que definirá seu destino.
Evan e eu ficamos surpresos. Ele completaria dezesseis anos em breve.
- Como você...
- Eu sou uma bruxa! - ela levantou a voz, seu poder transparecendo apenas pelo som da voz - E eu conheci os Nascidos das Sombras!
- E o que aconteceu com eles? - indagamos juntos.
- Houve uma batalha, uma batalha por liberdade, nós bruxos e bruxas éramos temidos por todos. Principalmente, os Nascidos das Sombras, com essa história de invocação e do bem e do mal. Muitos foram mortos. Me deixa surpresa saber que vocês sobreviveram, embora, foram deixados aqui para morrerem...
Evan e eu estávamos muito confusos.
- E você foi aprisionada por todo esse tempo?
- Sim. Mas, sinto que vocês irão me libertar.
Balancei a cabeça para Evan. Embora, aquela mulher fosse quem dizia ser, ela havia sido presa por uma razão. Ela era má. Má de verdade. E pior, era uma bruxa poderosa.
- Sinto muito, mas não podemos.
Ela levantou, a mulher era alta, muito alta. Devia ter uns 2 metros de altura. Seu vestido desgastado e sujo estava acinzentado, com manchas escuras.
- Vocês poderiam me pedir qualquer coisa, e eu daria a vocês... - disse ela, sorrindo, acariciando a cabeça da cobra. - Me falem, crianças...
- Vamos embora, Evan! - falei, pegando a mão dele.
Mas antes que eu o detivesse, ele se abaixou e pegou algo nas mãos.
- O que é isso? - indagou ele.
Era um colar. Um colar muito bonito, com um medalhão com uma pedra rubi no meio, uma pedra arroxeada com detalhes de prata.
Quando ele esfregou a pedra no meio para limpá-la pois estava muito suja, houve um clarão.
A bruxa levantou do chão, erguendo-se no ar. As correntes estavam quebradas. Havíamos feito a pior coisa que podíamos ter feito: libertamos a bruxa.

NASCIDO DAS SOMBRASOnde histórias criam vida. Descubra agora