CAPÍTULO 5: EVAN

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Ter tido aquela visão foi demais para mim. Foi como se eu tivesse feito aquilo, e para piorar, foi minha culpa. Mira estava ao meu lado, estava assustada, e eu  tentando levantar, com a ajuda dela eu consegui.
- O que aconteceu? - ela perguntou, com a mão no meu ombro, se certificando de que eu não iria cair.
- E-eu tive uma visão, Mira. - e contei a ela.
Mira me encarou horrorizada.
- C-como? - ela perguntou - Como você pôde se conectar?
- E-eu não sei. - respondi - Não sei ainda.
Dumble apareceu, estava em meu ombro, e ele disse coçando o queixo.
- Eu já vi isso antes - começou ele a explicar - Quando uma bruxa malefica é aprisionada, a magia das trevas adormece, juntamente com o poder da bruxa. E, quando ela consegue fugir, bem, tudo volta.
- Mas, porque a sombra que Evan viu, ficaram ligados, como ele conseguiu se conectar? - indagou Mira.
- Talvez, porque são bruxos? Bruxos possuem magia, mesmo que vocês sejam Nascidos das Sombras, ainda terão a convocação da natureza de seus poderes. - Dumble explicou - E, se não me engano, Evan está quase perto de completar dezesseis.
Mira assentiu.
- Agora faz sentido, mas porque eu não vi a sombra também?
- Talvez, você não está tão vulnerável quanto Evan, afinal, a sombra não sabe que ele o viu.
- O que acontecesse se ele soubesse que eu estava vendo-o? - perguntei.
- Viria atrás de você. - respondeu Dumble - A sombra serve apenas uma bruxa.
- Ônix. - Mira e eu respondemos juntos.
- Sim. - confirmou Dumble.

Mira e eu fomos até a cidade, que estava quieta. A cidade estava em ruínas, os prédios estavam queimados, as ruas estavam com enormes rachaduras, as carroças estavam quebradas, e havia sangue por toda parte.
O céu agora estava escuro, a linha fina verde ainda marcava território atravessando as nuvens. Continuamos a caminhar, tentando não fazer barulho, não queríamos chamar atenção.
A Fenda ficava na extremidade, tínhamos que atingir o ponto final, que fazia uma curva, que cercava toda a cidade, lá decidiríamos o que fazer para descer até lá embaixo.
As luzes das cidade estavam acesas, embora os postes de luzes haviam sido destruídos, estavam curvados, com uma aparência estranha. Onde estava todo mundo? Imagine você em um lugar vazio, onde o único som vem dos seus pés enquanto caminha. Era o único som que ouvíamos.
A cidade estava ficando para trás. A rua seguia numa passagem escura, cercada por uma rua entre uma grama alta.
Respiramos fundo e continuamos.
O vento soprava frio ali, como um sopro de algo á espreita, que fez os pelos dos meus braços se arrepiarem.
Senti que algo estava nos observando das sombras. Caminhava entre o gramado do outro lado da rua. Cutuquei Mira, e ela também viu, acenando afirmativo com a cabeça.
Fingimos que éramos dois adolescentes que não percebiam nada estranho.
Não demorou muito, a criatura saiu da escuridão e pulou na nossa frente, nos impedindo de avançar. Era um lobo. Um lobo enorme, que fazia nos parecer um inseto perto daquela grandiosidade.
Os pelos eram escuros e eriçados, a boca enorme estava aberta, com as presas ameaçadoras á mostra, sua baba pingava no chão. E ele estava faminto...
- Para onde dois adolescentes ingênuos vão, heim? - indagou a criatura, com a voz grave e lambendo os dentes.
- Até a Fenda! - falei - Deixe-nos passar!
O lobo nos encarou com aqueles olhos dourados e cruéis, com as garras fincadas no chão, se preparando para qualquer momento nos atacar.
- Vocês não vão a lugar nenhum! - esbravejou a criatura - Serão a minha refeição!
- Tente! - desafiei.
O lobo rugiu em resposta, e veio para cima de mim.
Mira gritou de terror.
O lobo tentava fincar as garras dele em mim, mas eu o agarrei pelo pescoço, não sei de onde viera tanta força. Talvez do meu poder? Agarrei-o pelo braço, tentando enforcá-lo. Ele tentou investir, mas não conseguia, eu o havia prendido.
- Me Solte! - ele berrou - Me perdoe! Não pensei que fossem bruxos.
- Como sabe? - indaguei, soltando-o.
- Eu senti. - respondeu o lobo - Tinha sentido o cheiro antes, mas não imaginei que era de vocês. Há tempos não vejo bruxos adolescentes, desde que fui banido para cá.
Mira foi até ele e o acariciou.
- Obrigada por não matar meu irmão. - Mira agradeceu.
- Acho que eu é que deveria agradecer por ele não me matar. - respondeu o lobo.
- Então, qual o seu nome? - perguntei.
- Me chamo, Zorubo. - falou - E vocês estão indo para a Fenda, é verdade?
- Sim. - respondeu Mira - Sabe onde fica?
O Lobo Zorubu se encolheu com medo.
- Vocês querem morrer de verdade, pelo que parece...
- Porque? - indaguei, querendo saber mais a respeito de sua inquietação.
- A Fenda é protegida por um monstro que ninguém sabe o que é, quando é chega ao fundo, se é que há um fundo, dizem que ele é o Guardião para que ninguém fuja de Margholia. - explicou - Muitos já tentaram, mas nunca retornaram.
- Mas temos que tentar, queremos ir ver os elfos! - disse Mira - É o único jeito de reverter o que fizemos...
- E o que fizeram? - pergu tou Zorubu, erguendo a sobrancelha enorme de lobo.
- Bom, meu irmão - começou Mira a contar o que eu havia feito.
Pavor tomou conta de Zorubu.
- Você libertou Ônix?
- Sim. - respondi, com pesar.
- Você simplesmente liberou a morte para todo o mundo!
- Como assim?
O lobo então começou a contar:
- "Numa época distante, bruxos e bruxas viviam em harmonia. Pelo que contam por aí, Ônix conheceu um humano e eles se apaixonaram. Mas uma coisa aconteceu. O homem decidiu matá-la pois tinha medo de seus poderes. Ele passou a vê-la como uma aberração quando viu as coisas que ela podia fazer. Então, ele tentou matá-la. Ônix descobriu, é claro. E o matou antes mesmo que ele realizasse o ato. Ela fugiu. E prometeu vingança.
- E o que ela fez depois? - indaguei, com frio percorrer minha espinha.
- Ela retornou, o exercito dos Nascidos das Sombras e elfos tentaram detê-la. Foi uma batalha sangrenta. O plano era aprisioná-la., aprisioná-la numa prisão que fosse capaz de prendê-la para sempre.
Vários Nascidos das Sombras foram mortos naquele dia.
Marcaram o chão com a estrela de cinco pontas, com velas negras acesas, sangue de cordeiro em volta, e a bruxa foi trazida ao meio daquele círculo ritualístico. Selando-a, dentro de uma caverna. Somente um Nascido da Sombra foi capaz de fazer tal feito. Mas, morreu em seguida, pois exigiu muito de seu poder.
- Quem era ele?
- Não sei quem era. -, respondeu Zorubu.
Dumble que estivera prestando atenção na história, disse:
- Foi seu pai.
Fiquei surpreso.
- Nosso pai? - indagou Mira, dando de ombros - Ele que a aprisionou?
- Sim. - Confirmou Dumble.
- Como sabe?
- Eu estava lá, Evan. - falou Dumble, pela primeira vez, parecia entristecido - É o que posso dizer, agora devemos continuar.
Zorubu ficou parado encarando Dumble.
- Não me recordo de duendes na história... - falou, e então ele urrou- Você é...
Dumble fez cara feia e disse:
- Cale a boca, maldito lobo!
Zorubu acanhado, ficou com o rabo entre as pernas e andou em direção ás sombras das gramas altas.
- Não vai conosco? - perguntei.
- Agradeço, meus bruxos, mas não. - respondeu o lobo - Essa viagem é de vocês, não minha. Até outro hora.
E ele desapareceu em meio a escuridão.
Dumble estava quieto. E estava mal humorado.
- O que Zorubu quis dizer com os duendes não estarem na história da guerra com a bruxa Ônix? - perguntei.
A pergunta que eu fiz pareceu deixa-lo ainda mais nervoso.
- Não é da sua conta, Evan. - respondeu ele - Se fosse algo que eu quisesse compartilhar, já teria feito.
Olhei para Mira e ela deu de ombros.
Continuamos o caminho em silêncio.
Se Dumble não queria dividir sua história conosco, um dia viria à tona.

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