[19] Um poema, um professor, uma vitória

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Christopher Perry

Cheguei à sala de Andrew no mesmo horário de todos os dias: 8h15. Mas desta vez ele não estava completamente imerso nas atividades dos alunos ou escolhendo os trechos de algum livro do Dickens para trabalhar em aula. Não, ele estava de pé, olhando pela janela alta atrás da mesa de mogno e roçando a barba com o polegar. Parecia distraído.

Bati à porta para não aparecer de supetão ao seu lado, e o som o tirou de seus devaneios. Ele virou-se e me olhou com uma expressão vaga.

— Ah, bom dia, Christopher. - Gesticulou para que eu entrasse e sentasse.

— Bom dia, professor Byrnes. - Sentei-me na cadeira que ficava em frente a mesa e comecei a retirar uma pasta repleta de papéis da mochila. — Consegui finalizar as correções do teste surpresa durante o fim de semana. Apesar da imprevisibilidade, essa turma foi muito bem. - Comentei, impressionado.

— Sim, sim, que bom. - Ele recolheu os testes e posicionou mais ao canto da mesa, sem ao menos passar os olhos sobre eles. — E o que mais você fez durante seu fim de semana? - Ele perguntou, parecendo interessado de repente.

Me surpreendi, sentindo-me um tanto desconfortável com o questionamento. Andrew jamais fez o tipo amigável comigo. Era cordial e profissional, mas não falava sobre sua vida pessoal e não fazia questão de ouvir sobre a minha.

— Hum, nada demais. Dormi, trabalhei em um artigo com Alicia. Aquele sobre o qual comentamos com você no outro dia. - Recordei, ficando animado com a perspectiva de mostrar a ele o que havíamos feito em somente uma tarde.

— Ah, sim! Isso, Alicia, como ela está? - Ele indagou, se inclinando sobre a mesa, totalmente ansioso pela minha resposta e ignorando o que eu havia dito.

— Ela está bem. - Respondi, franzindo o cenho.

Por que o cara com quem ela estava saindo parecia não saber nada sobre seu estado? Foi então que tive um clique de consciência. Alicia não tinha falado com ele o fim de semana inteiro e, pelo visto, ainda não tinha dado notícia alguma. Segurei a vontade de rir para mim mesmo, pensando em como a garota sabia brincar com o ego de um homem. Desde que a conheci, sempre foi assim. Ela se interessava, se aproximava, conquistava, deixava o cara maluco por ela e então enjoava dele. Eu nem compreendia como ainda éramos amigos depois de tantos anos, porque em algum momento Alicia Brown sempre ia embora.

— O que exatamente você quer saber, professor? - Indaguei, me recostando na cadeira.

Aquilo estava ficando divertido. Esquisito, mas divertido.

O homem suspirou, preso em um conflito interno. Não estava seguro em falar sobre aquele assunto comigo. Com certa dificuldade, ele disse:

— Eu tenho sentido Alicia um tanto... distante nos últimos dias. E já que vocês são tão próximos, presumi que você pudesse saber algo sobre o que ela tem pensado. - Ele me observa com um olhar consternado de quem não tinha outra opção.

— Ah, compreendo. - Assenti. — Na verdade, ela me comentou algo, sim. Mas não sei se devo compartilhar. - Disse, entrando na brincadeira. Alicia não havia dito nada.

— Por favor, peço para que sinta-se à vontade em me contar. Eu não direi nada à ela. - Ele suplicou, arregalando os olhos.

— Eu sei, mas ainda assim, é tão pessoal. Não sei se devo. - Alimentei sua curiosidade mais um pouco.

— Por favor, Christopher. - Seu tom de voz se tornava quase esganiçado em alguns pontos.

Não queria que ele perdesse a pose por completo, então peguei mais leve na provocação.

Cupido Reverso [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora