Arautos do Caos

Cap.17 O verdadeiro direito divino

•Kay•

Uma dupla de espiões sorrateiros e silenciosos vagando na noite, era isso que ele e Nuank haviam se tornado nos últimos dias, e se
mostraram bastante eficiente nessa função.

Desde aquela noite em que Nuank foi ao festival eles passaram a planejar o que seria o próximo grande passo na disputa por Torbelário, o assassinato do Governador e consequentemente do Duque. Hoje era o tão aguardado quinto e último dia do festival, o dia derradeiro em que cumpririam a missão mais difícil até o momento, a semana toda ele e Nuank se dedicaram a espreitar aquele festival e a movimentação dos guardas da cidade. O festival era um grande pão e circo, durante esses cinco dias toda a Torbelário girava em torno dele, no segundo dia o Governador e o Duque fizeram discursos no alto do palco que ficava na praça, eles anunciaram aquilo que viria se tornar um novo tipo de temor as vidas humanas naquela cidade, a muralha de Torbélario. O Governador estava disposto a cercar toda a cidade, um tipo de poder ainda mais absurdo que iria comandar o ir e vir daquele lugar, não é novidade para ninguém o clima energético da cidade, tudo lá era cinza, sem vida e brutal, as pessoas sabem o que esperar de Torbelário, mais esse cercamento significaria uma nova escala no sofrimento daquele povo, quem estava fora não iria voltar, e quem estava dentro queria sair, a cidade iria se tornar um grande curral na mão dos Altos.

Já passava da meia noite, era uma noite anormalmente fria e escura, ele estava no jardim na frente da mansão, grilos e corujas embalavam a melodia noturna, o vento soprava cortante entre as árvores frondosas da floresta que cercava a mansão, não era possível enxergar um palmo se quer a sua frente, mais toda aquela escuridão ao seu redor o acolhia o aceitava, e lhe convidava para entrar nela. Seu devaneio foi quebrado pelo som da porta da mansão se abrindo atrás de si, Nuank estava pronto, seus olhos adaptados para a escuridão viu o jovem rapaz vestido todo de preto, estava lindo com aqueles trajes justos de assassino noturno com botas longas e capuz na cabeça.

—está bastante frio hoje. Fumaça condensada saiu dos lábios de Nuank ao falar.

—sim. Sua respiração também se condensou no ar.

—vamos? Não temos tempo a perder. Disse o líder dos arautos já se preparando para voar.

Para essa missão Kay decidiu ir através das sombras, deixando seu nobre cavalo descansar um pouco. Ele havia aprendido a se locomover através das sombras, uma escuridão sem fim e um frio terrível acolhia todo seu corpo e então ele era submergido na dimensão das sombras, assim como Nuank na forma mil pétalas ele se tornava extremamente ágil e intangível nessa forma, a única coisa que podia limita-lo era a luz mas era meia noite em Torbélario, o que não lhe faltava era sombras.

Corria com uma velocidade impressionante pelas ruas, conhecia as ruas labirínticas da cidade como a palma de sua mão. Entrou em uma grande avenida passando pelas sombras projetadas pelos edifícios, uma carruagem estacionada na esquina lhe deu outra passagem de sombra projetada no chão, uma rua aqui outra alí e então se viu em um beco com sua saída fechada por um muro de tijolos, mas para sombras nada era impossível, o batente de um edifício alto que ladeava o beco lhe deu um resquício de sombra mais fina que um poste de madeira, seu corpo se ajustou, se remodelou e se tornou fino e comprido como uma serpente e então ele deslizou por cima do muro que lhe impedia a passagem.

Diante de uma rua larga e pavimentada no coração da cidade ficava a fortaleza do Governador, um castelo antigo e enfadonho de pedras escuras cercado por muros enormes com quatro torres em cada ponto formando um grande quadrado. No chão uma sombra anormal se moveu, se esticou até conseguir alcançar o pé da muralha do outro lado da rua, devia ter sido uma coisa assustadora de se presenciar mas para o desejo de Kay ninguém o viu. Fundido a escuridão das pedras do muro da fortaleza Kay deslizou silenciosamente para dentro.