Capítulo 9: Palha de aço

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Eu precisava de um lugar para Hadassa se apresentar e precisava levá-la para conhecer Saulo. Dito isso, resolvi matar ambos os coelhos num único tiro.

Acho que a maior razão para eu e Saulo sermos melhores amigos é que sempre fomos os mais altos da turma, desde os 12 anos de idade. Isso foi uma estranheza que nos uniu. Porém, em muitas coisas sempre fomos muito diferentes. Como o fato de Saulo ser extrovertido, e ter nascido numa família cristã perfeitamente tradicional, com uma condição financeira estável, sem grandes problemas e sendo filho único. O pai dele tem uma loja de instrumentos musicais, e com apenas uma ligação para o sr. Campos, pude agendar um show ao vivo na porta da loja dele.

E agora, estou novamente na porta da casa de Hadassa para enfrentar o olhar julgador de tia Maria.

Não precisei nem mesmo entrar, mesmo atrás da porta pude ouvir uma discussão acalorada.

— Como você me aparece com uma notícia dessas? Garota, será que eu nunca te ensinei o mínimo de prudência? — Ouvi tia Maria esbravejar. — E ainda quer que eu fique calma?

— Ai mãe, essas coisas acontecem, agora já foi e a gente dá um jeito! — Reconheci a voz de Letícia, irritada, estressada.

— Não Letícia, derrubar um bolo acontece, chutar a quina de uma mesa acontece, o que não “acontece” — ela enfatizou antes de uma curta pausa, para logo após gritar: — É você usar o dinheiro das contas da casa, o dinheiro que eu saquei da minha aposentadoria, para pagar entrada em show de funkeiro!

Eita… o assunto é sério. Me pergunto se é uma boa ideia bater na porta agora.

— Eu sei mãe, mas você nunca me deu dinheiro pra nada! — Letícia protestou.

— Ah e por que será? Nunca faz nada de útil! — tia Maria rebateu.

Letícia riu sem humor.

— Ah mamãe, me desculpe se não sou a perfeita, a pura, recatada e do lar, igual a sua preferidinha Hadassa. Se fosse a Hadassa pedindo, você não negaria.— Letícia falou afiada.

— Não coloque a Hadassa nisso! Eu sei que nunca concordou com a sua prima morando aqui, mas ela precisava disso. Você teve muito do que ela nunca pôde ter, e nunca foi um por cento grata por isso! — Acusou, com ressentimento. Aquilo me intrigou. Então Hadassa provavelmente morava com tia Maria para ter uma vida melhor que a que ela tinha antes.

Ouvi o som de passos rápidos e desesperados se aproximando, e então a voz de Hadassa se fez distinguível mesmo diante do barulho da TV e das vozes de mãe e filha.

— Tia Maria, Lety, por favor parem de brigar! Daqui a pouco vão chamar a atenção dos vizinhos, vamos conversar direito! — Hadassa se pronunciou, com a voz trêmula de ansiedade.

— Que se danem os vizinhos garota! Todo mundo sabe que eu não sou a filha favorita! — Gritou mais alto, como se propositalmente quisesse que ouvissem. — Para de querer parecer perfeita, você me dá nos nervos!

Então ouvi o barulho de algo quebrando, e isso foi suficiente para que meus impulsos me fizessem empurrar a porta a força, que por sorte estava aberta.

As três mulheres na sala me encararam com olhares de choque, Hadassa estava trêmula. Olhei para Lety que se vestia de maneira similar ao outro dia em que a conheci, e vi ao lado de seu pé um vaso de porcelana quebrado. Deduzi que ela esbarrou nele sem querer e o derrubou da estante em que antes estava.

— Jonas. Que bom te ver. — Tia Maria forçou calmaria ao falar comigo, porém não conseguia forçar um sorriso e eu só via raiva em seu olhar quando desviou-o novamente para Lety. — Hadassa, melhor ir com ele. Tenho coisas a resolver.

Redenção, Acordes e Amores [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora