O preço da discrição

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O momento é praticamente uma cena de batalha, e o adversário é sua própria mãe; seu pai nunca faria uma cena com visita em casa. Eles tinham avisado que chegariam só à noite, e agora estão bem ali, encarando-o, com Ochako em seus braços. Katsuki mal pode acreditar que a colocou nessa situação; sua mãe vai começar a gritar loucamente a qualquer momento, e ele vai revidar, e tudo vai virar um caos.
 
— Bom dia, senhor e senhora Bakugou! — ele sente Ochako tensa quando se vira e se curva para cumprimentá-los.
 
Sua mãe desvia os olhos dele para olhar a garota que acabou de falar, com uma expressão brava. Ela abre a boca para falar novamente, mas, ao olhar para Ochako, sua reação muda. Seus olhos se arregalam um pouco, e ela para, sem dizer mais nada.
 
— Bom dia! — seu pai responde, passando por sua mãe e se curvando sutilmente.
 
Katsuki sabe que tem que dar uma explicação, por mais ridícula que seja; ele não queria mentir, mas nem fodendo iria comentar que perdeu a virgindade no domingo!
 
— Velho, Velha! — ele tenta manter a voz firme — Está é a Uraraka. Ela estava aqui por perto, vamos juntos para a escola, mas acabei convidando ela pra tomar café da manhã comigo! A gente tava saindo!
 
Sua mãe franze os olhos para ele com desconfiança. Parece que finalmente vai falar algo, mas seu pai a olha de um jeito que ele sabe que é para ela ser gentil e não ter uma atitude extrema.
 
— Bom dia! — ela responde, com a voz seca.
 
— Bom, é melhor vocês dois irem, se não vão se atrasar! — seu pai fala, gesticulando na direção da porta.
 
As mãos de Katsuki automaticamente sobem para os ombros de Ochako. Ele a guia para a saída com pressa; seu pai está lhe dando uma oportunidade, e ele não vai desperdiçá-la. Uma vez que passam pelo arco da porta e descem os degraus da entrada, ele segura na mão dela. Olha para trás e vê seu pai acenando, e logo em seguida a porta se fecha. Eles andam praticamente um quarteirão inteiro antes de quebrarem o tenso silêncio.
 
— Meu Deus, achei que sua mãe ia brigar com a gente!
 
— Ela ia, se não fosse meu pai!
 
— Acho que ela não soube o que dizer quando me viu! Seu pai teve piedade de nós e... Meu Deus, você é um ótimo mentiroso! — ela cobre o rosto, envergonhada.
 
— O que caralhos você queria que eu fizesse???
 
— Eu, eu sei. Só que... Nunca mais vou ter coragem de olhar para seus pais!
 
— Quer saber, foda-se, eles só vão brigar comigo quando eu voltar para casa, no fim de semana que vem. Então não se preocupe com isso, entendeu!?
 
Ochako assente com a cabeça em concordância. Eles voltam a andar, e Katsuki sabe muito bem que isso é a calmaria antes da tempestade.
 

***
 

Assim que Masaru fechou a porta, Mitsuki se arrependeu de não ter brigado com Katsuki. Ela não podia acreditar que ele trouxera uma garota para passar a noite aqui.
 
— Era ela, não é? A garota do primeiro ano! — Mitsuki falou mais para si mesma do que para Masaru.
 
— Sim, querida, é a garota do primeiro festival de esportes.
 
— Você não devia tê-lo deixado sair assim, sem pelo menos dar um sermão nele!
 
— Eu sei, meu bem, mas fiquei muito feliz por ele. Ele gosta dela há tanto tempo!
 
O tom de voz alegre dele e o sorriso afetuoso revelam bem suas covinhas, que Mitsuki tanto gosta. Ela também está feliz por seu filho, mas ele não vai escapar tão facilmente assim.

 
 
***
 

O caminho até a escola é um pouco conflitante devido ao horário de pico do metrô. Katsuki não parou de tocá-la um segundo sequer. Ele segurou sua mão até a estação, segurou seu antebraço durante o embarque e sua cintura pelo resto do trajeto, para que ninguém a espremesse. Mas agora que estavam chegando perto da escola, ela percebeu que ele estava se afastando, como se fossem ímãs com polaridade igual.
 
É ridículo pensar nisso, sendo que nem ela sabia como propor que eles não entrassem lá de mãos dadas. Só que agora que ele fez isso, ela se sente estranha. Esse sentimento de insegurança sempre aparece do nada, pegando-a de surpresa. Ela afasta isso para bem longe, seria bem pior receber um interrogatório das meninas sobre por que eles estavam juntos. Não, ela não saberia lidar com isso assim, ainda mais depois do que aconteceu com os pais dele. Era muita coisa para uma única manhã!
 
— A gente se fala depois, tá!? — disse Katsuki, sua voz fazendo Ochako perceber que estava pensando demais.
 
Nem viu que já haviam passado pelo portão da UA, e também nem percebeu que ele estava com as mãos nos bolsos.
 
Ochako sorriu e balançou afirmativamente a cabeça. Antes de se afastar, ele deu uma piscadela, fazendo seu coração se acalmar um pouco!
 
Uma vez sozinha, ela verificou as horas em seu celular e percebeu que ainda era bem cedo. Talvez essa fosse uma oportunidade para resolver algo que tinha em mente para o horário do almoço.
 
Os corredores ainda estão bem calmos, com poucas pessoas aqui e ali, ninguém que Ochako precise parar para cumprimentar; isso é até um alívio. Chegando na ala hospitalar da escola, ela encontra a Recovery Girl do lado da porta, praticamente abrindo o local.
 
— Bom dia. — cumprimenta.
 
— Bom dia, minha querida. Em que posso ajudá-la? — a senhora a recebe, convidando-a a entrar enquanto acende as luzes do local.
 
— Bom, eu mudei de ideia sobre a solicitação do meu implante contraceptivo e queria saber se posso colocá-lo antes da formatura.
 
— Você veio num bom horário, querida. As coisas são mais calmas pela manhã. Só um momento, vou pegar seu prontuário.
 
Ochako se acomoda na cadeira do consultório; as luzes extremamente brancas causam um pouco de desconforto em seus olhos. Ela observa a Recovery Girl se sentar e avaliar os papéis que estão em seu arquivo.
 
— Seus exames são bem recentes, então só preciso que você assine uma autorização para o procedimento. — ela informa, entregando uma folha para Ochako. — Bom, é um procedimento simples. Se você quiser, podemos colocá-lo agora, mas você vai ter que evitar aula de treinamento intenso hoje!
 
— Tudo bem! — ela responde, pegando a caneta que está na mesa para assinar a autorização. Ochako nem acredita que conseguiu resolver isso tão rápido.
 
O procedimento é simples e rápido, mas é bem doloroso, e em menos de 15 minutos depois, Ochako já está saindo do consultório da Recovery Girl. Ela recebeu uma dispensa para aulas de campo e recomendações para voltar no final do dia para uma avaliação de cicatrização, depois de ter recebido também um beijinho de cura da heroína. Pelo que ela entendeu, isso também ia acelerar a absorção do contraceptivo em seu organismo, fazendo efeito bem mais rápido. Ela também ganhou goma de mascar analgésica caso sinta muita dor.
 
Os corredores começam a ficar cheios, mas Ochako foi a primeira a chegar na sala. Aizawa-sensei a cumprimenta quando a vê, e ela lhe entrega sua dispensa das aulas de campo enquanto também o cumprimenta. Ele olha para o papel e para ela, e a libera sem dizer mais nada.
 
Assim que Ochako se senta em seu lugar, ela sente seu corpo protestar e a parte inferior de seu antebraço latejar sutilmente. Ela pega uma goma de mascar e já sabe que vai passar o dia inteiro recorrendo a elas para não sentir dor. Nem são 9h e ela já estava se sentindo cansada. Ela se debruça sobre a mesa e fica assim enquanto observa seus colegas chegarem.
 

***
 

Assim que Katsuki passa pela porta da sala de aula, percebe uma comoção em volta da mesa de Ochako. Sua curiosidade aflora, mas ele se contém. Tenta pescar palavras aleatórias na conversa das meninas ao redor dela, mas Kaminari está falando sem parar, contando sobre uma competição aleatória que tiveram.
 
A Garota Sapo gesticula para as outras meninas e, finalmente, ele entende que ela está pedindo para deixarem Ochako em paz e que, como ela já passou na enfermaria, estava tudo sob controle. Que droga! Além de curioso, ele fica preocupado. Por que ela foi até a Recovery Girl? Quando finalmente fica sozinha, Katsuki consegue ver seu reflexo nas janelas da sala. Ele aprendeu a observar assim, sem chamar atenção.
 
Aparentemente, sua aparência está normal, mas Katsuki percebe que ela tem um curativo em seu antebraço esquerdo. Ele se contorce porque não pode simplesmente atravessar a sala e falar com ela. Resta apenas esperar até o horário do almoço, mas esperar não é seu forte!

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