Entre folhas e suspiros

Capítulo 15 - Íntimos? (Parte 1)

JÉSSICA

Deixei um bilhete breve sobre a mesa de Henry, devolvendo o celular que ele me deu e recolhendo meus pertences antes de sair da empresa. O atrevimento dele ao sugerir que eu estava fora de forma e insinuar que era sedentária me deixou furiosa. "Como ele ousa?", exclamei em voz alta, mostrando minha frustração enquanto procurava um assento vazio no metrô. Ao me sentar ao lado de uma senhora adormecida, percebi a exaustão refletida em seu rosto cansado. "O que é isso? Vou ficar estudando expressões faciais agora? Estou parecendo o idiota do meu chefe!", meu inconsciente apareceu abruptamente, trazendo à tona a irritação acumulada com a situação no trabalho. Fiquei absorta em pensamentos, questionando-me sobre as atitudes e comentários desagradáveis que enfrentei. Respirei fundo e encostei a cabeça no vidro, tentando acalmar minha mente e aliviar o estresse que se acumulava. Não demorou muito para chegar ao meu destino final. 

Caminhei algumas quadras e logo cheguei em casa. Na portaria do prédio, pedi para restringirem o acesso ao nome de Henry; não queria ter que lidar com ele tão cedo, buscando preservar minha paz de espírito após o conflito no escritório. O arrependimento pela decisão impulsiva de pedir demissão bateu forte e rápido; percebi que não deveria ter agido precipitadamente ao sair da empresa. Literalmente, não pensei muito naquele momento, deixando-me levar pela frustração momentânea. No entanto, minha determinação em encontrar outro emprego era sólida e urgente. Encarei a tela do notebook e enviei alguns currículos por e-mail, ciente de que, por ser fim de ano, as respostas demorariam mais. Considerando isso como um grande passo inicial, mantive minha esperança e foco. Observando o violoncelo por um instante, decidi me entregar à música na tentativa de relaxar e acalmar minha mente agitada. 

Sabia que a música sempre foi uma válvula de escape para mim; a melodia me envolvia totalmente, transportando-me para outra dimensão onde as preocupações pareciam menos intensas. Após tocar várias canções, senti-me renovada e mais equilibrada emocionalmente. Guardei o violoncelo no quarto e liguei a televisão, deixando-a sintonizada em qualquer canal, permitindo-me desligar um pouco do mundo ao meu redor. Absorvi as distrações leves que a TV oferecia, buscando um breve momento de descanso mental após as turbulências recentes. Caminhei até a cozinha e preparei alguns bifes que o Henry havia deixado temperados na noite anterior, quando resolveu se aventurar como meu cozinheiro exclusivo. Enquanto preparava o prato, cortei a carne em pequenas tiras e finalizei com rodelas de cebola, seguindo o cardápio que havíamos planejado juntos. Assim que me sentei no sofá para começar a comer, ouvi algumas batidas na porta. Revirei os olhos, contrariada com a interrupção, e me levantei contra a minha vontade para atender.

— Quem é? — Gritei, temerosa, antes de abrir a porta.

— Sou eu, Elena! — Ela respondeu, e eu imediatamente abri a porta. Ao vê-la acompanhada por Miguel, franzi o cenho.

— O que estão fazendo aqui? Não me lembro de termos combinado algo! E por que ele está aqui? — Encarei Miguel por um momento e cruzei os braços.

— Eu trouxe vinho! — Elena pegou na mão de Miguel e o puxou para dentro da sala. — Eu te liguei mais cedo para avisar que a gente vinha, mas só dava caixa de mensagem. Hum, que cheiro bom de bife acebolado! Que milagre é esse, você não está comendo macarrão instantâneo? — Pegou um pedaço do bife e abocanhou.

— Acabei esquecendo meu celular na empresa! — Resolvi omitir a verdade.

— Ah, então deve ser por isso que o bonitão pediu pra te avisar para ligar pra ele! — Elena foi até a cozinha e pegou três copos.

— Bonitão? — Arqueei a sobrancelha.

— Hum, o senhor Morales! A única coisa que me deixou curiosa foi o fato dele saber a respeito de um vizinho seu. Por que ele sabe desse vizinho e eu não? Ou melhor, como ele sabe desse vizinho, ele veio aqui? — Ela colocou a bebida nos copos e nos serviu. Engoli em seco, pensando no que responder.