Cap.2 - Ele

795 82 182
                                    

"Não vê que então eu me rasgo
Engasgo, engulo, reflito e estendo a mão
E assim nova vida é um rio secando, 
As pedras cortando e eu vou perguntando
"Até quando?" - 
São  tantas coisinhas miúdas
Roendo, comendo, arrasando
Aos poucos com o nosso ideal
São frases perdidas num mundo
De gritos e gestos
Num jogo de culpa que faz tanto mal
Não quero a razão pois eu sei o quanto estou errado
E o quanto já fiz destruir
Só sinto no ar o momento em que o copo está cheio
E que já não dá mais pra engolir
Veja bem,
Nosso caso é uma porta entreaberta
E eu busquei a palavra mais certa
Vê se entende o meu grito de alerta"


(Grito de Alerta - Gonzaguinha)


Ramiro pediu licença, despediu-se dos amigos e foi para a caminhonete, sentiu como se tivesse um gancho o transportando para aquele dia terrível, ele evitava lembrar com todas as forças, lhe doía, ardia, queimava.

Era como jogar sal numa ferida aberta, que vertia sangue em abundância.

Tinha sentido a necessidade de ir atrás de Kelvin, não podia permitir que ele partisse daquele jeito, precisava tentar impedi-lo, nem que fosse a última coisa que fizesse na vida.

Seu coração protestava dentro de seu peito aos berros.

Como podia viver sem o seu Kevinho?

Ele não conseguia imaginar uma vida sem ele, como sobreviveria sem a luz da sua vida?

Porque era o que ele significava a luz num mundo de tantas trevas e demônios que se organizavam em legiões e sentavam-se em seus ombros diariamente, alimentando o monstro que Antônio La Selva tinha ajudado efetivamente a criar durante todos aqueles anos.

Kelvin era seu anjo caído.

Seu respiro depois de um mergulho de uma vida inteira desconhecendo o que era amor.

Amava Kevinho.

Ama com toda a força que existia em seu ser.

Ele parecia ter sido desenhado para se encaixar em sua vida.

Como se antes de nascer, Deus os tivesse dividido ao meio para que se procurassem pelo mundo, desde a primeira vez que seus olhos pousaram em Kelvin ele soubera que algo dentro dele tinha sido desbloqueado para sempre.

Algo dentro de Ramiro tinha despertado faminto ao olhar dentro dos olhos dourados dele, seu coração tinha aprendido a cantar naquele dia.

Ramiro era como um quarto escuro, e Kelvin era a luz que se infiltrava pela janela sem licença, colocando calor em sua vida.

Era isso, Kelvin tinha colocado música na sua vida, luz na sua escuridão, completude na sua falta, naquilo que ele sequer sabia que era falta.

Desde aquele dia ele enchia seu corpo, ocupava sua mente, cada partícula de seu corpo, era uma paixão meio animalesca que podia ser sentida em seus ossos.

Como ele podia permitir que ele fosse embora daquela forma?

A possibilidade de perdê-lo para sempre sacudiu seu corpo e agitou seu espírito, seu coração gritava informado no peito.

Ele dirigiu como um louco por aquelas estradas, atrás do seu Kevinho.

Tinha por ele uma possessividade sem nome, sentia que ele lhe pertencia, que era dele.

Precisava da sua luz.

Não podia voltar a morar com aqueles demônios, não podia voltar a ser aquele Ramiro monstruoso, porque não podia, agora o Ramiro amava e só sabia ver amor no mundo.

Nó(s)Onde histórias criam vida. Descubra agora