Metade da estrada

490 41 180
                                    

15/03/2024 - Sexta-feira

Mais uma noite escura e gélida atravessava o céu de São Paulo, o ar poluído formava nuvens de neblina que cobriam uma parte da visão da grande janela da sala de estar da casa. O relógio digital que ficava sobre o móvel da estante marcava 21:30. A mulher de cabelos escuros estranhava o sumiço da sua loira, o que ela não sabia é que a loira que não era tão sua assim.

Sentada no sofá caro e espaçoso, assistindo a reprise de alguma novela ruim, Verônica cogitava a ideia de ligar para Berlinger, mas o medo de atrapalhar seu trabalho faz com que ela afaste a ideia. A morena sentia um mal estar na boca de seu estômago, uma ansiedade ruim tomava conta dela. O que poderia ter acontecido para que Anita sumisse sem deixar nenhum aviso?

Verônica, num ato de desespero por informações sobre sua namorada, desbloqueia a tela de seu celular, procurando o numero de Berlinger. O celular começa a chamar, um celular começa a tocar do lado de fora da porta de madeira bruta da sala. O barulho das chaves destrancando a porta ganha a atenção da morena, que agora forçava seu olhar para tentar enxergar sobre a meia luz baixa do ambiente.

A figura da loira atravessa a porta, o par de salto alto em sua mão e a bolsa pendurada no ombro; ela joga as chaves no móvel branco que havia ao lado da porta, vasculhando o cômodo escuro com seus orbes azuis, encontrando a mulher que ela mais temia ver, a encarando.

Com passos calmos, ela se aproxima de Verônica, passando ao lado do interruptor e fazendo questão de acender as luzes do ambiente. Verônica observava tudo em silêncio, estranhando o silêncio perturbador da sua mulher; o mal estar que a morena sentia na boca do estômago piorara ao notar os olhos úmidos da mulher que ela amava.

- Meu bem...o que houve? - Verônica sabia que não era do feitio da loira o ato de chorar, por isso o tom aflito tomara conta de sua voz, fazendo Berlinger levantar os olhos até os seus, ainda de pé, bem a frente de Torres.

Sentindo os olhos molhando seu rosto, a mais velha se sentara ao lado da namorada; não sabia por onde começar, o seu nível alcoólico complicava ainda mais suas tentativas falhas de falar. Abria a boca, mas nenhum som saia.

- Amor, pode confiar em mim... - O tom doce era evidente na voz da mulher de olhos castanhos. - Você bebeu?

Anita apenas assentiu com a cabeça, a erguendo para trás a procura de algum folego para seus pulmões, e do outro lado da moeda, Verônica tentava ao máximo conter sua preocupação com a amada e as fincadas que sentia no coração, o batimento cardíaco das duas eram ouvíeis no cômodo silencioso.

- Eu não posso mais te esconder, vou contar tudo para você. - Com apenas uma frase Anita conseguira tirar de uma vez o pouco ar que havia nos pulmões de Verônica, a mais nova já sabia o que viria em seguir, e os olhos lindos já se tornavam vermelhos na tentativa de segurar as grossas lagrimas que imploravam para ser libertas. Anita sabia que não havia mais volta, teria que assumir o que fez e fazia.

- Eu beijei outra boca, já tem mais de um ano... - A morena se levanta de supetão do sofá, andando até o pequeno bar delas, a visão turva causada pelas lágrimas dificultava seu trabalho de se servir um dose de whisky; as mãos tremiam, e a ultima frase que fora dita ecoava por sua mente.

- Estava dividida entre o amor e a paixão, mas decidi que assim não dá... me perdoa por favor. - O tom de súplica era eminente em sua voz, voz que no momento causava enjoos aos ouvidos de Verônica. - É com você o meu lugar, me perdoa. Por favor, eu te amo.

Verônica usava de toda calma que conseguia ter, o copo com o liquido amadeirado tremia em sua mão, e lágrimas pingavam sobre o tapete da sala.

- Qual o nome dela? - Anita negara com a cabeça, de todas as perguntas que esperava que a morena fizesse, essa não estava na lista. - Qual a porra do nome dela, Anita?

- Olga. - Verônica deixara uma risada sarcástica escapar de seus lábios, não podia acreditar que tudo aquilo estava acontecendo. O copo que a morena segurava fora arremessado contra a foto das duas que estava pendurada na parede, a foto do dia do pedido que namoro agora era manchada pela bebida; o cacos de vidros sujam o chão.

A morena finalmente havia entendido que o suor que Anita chegava não era da academia, o porque seu banco do carro nunca estava no mesmo lugar.

- Meu amor... - Anita começa a falar mas a risada embriagada de choro de Verônica interrompe sua fala.

- 'Meu amor', Anita? Onde estava esse amor quando estava com a sua outra mulher? Que por acaso, é a mulher que trabalha com você. - Anita apenas se entregara a um choro profundo, cobrindo o rosto com as mãos. Sentia vergonha, vergonha de si mesma e de ter traído a mulher que ela mais amava.

- Você é o meu amor, Verônica. Acho que eu que não serei mais o seu amor. - Verônica não poderia negar que seu amor pela a outra permanecia em seu peito, a fazendo se aproximar da loira, tirando suas mãos do rosto molhado e limpando as lágrimas que conseguia.

- Me doí muito mais saber que você não enxerga o tanto que eu te amo. - Se levanta e segue para pegar outro copo para si, suas mãos viram para baixo a porta retrato das duas que estava posto ali ao lado. - Vai tomar seu banho, Anita. Você está cheirando álcool e cigarro barato.

Nem toda dor é constante, nem toda foto é para sempre na estante

A loira apenas seguira a instrução que lhe fora dada, subindo as escadas e a cada degrau pedia aos céus para esquecer das últimas horas. Já Verônica, tentava encarar o mutirão de sentimentos que atravessam seu peito sem pedir licença, precisava lidar com a situação, mas não sabia como o fazer.

Depois de meia hora submersa na água gelada, o corpo da loira cruzara a porta da sala, encarando sua mulher deitada no sofá, coberta com um cobertor fino e afogada em um sono profundo. Um suspiro escapara de seus lábios, a culpa e o remorso que sentia podiam ser capazes de matá-la.

Ela havia prometido a vida toda a morena, e a abandonado na metade da estrada.

*

Me perdoem qualquer erro, e não me matem.

Betrayed | Veronita FanficOnde histórias criam vida. Descubra agora