1

5.1K 103 11
                                    

Quando te perguntam quem é você o que vem primeiro na sua cabeça? Por favor, não venha com aquela famosa ironia de falar "eu sou eu". Essa é uma daquelas perguntas onde você fica parada por um tempo só raciocinando o que você vai responder, ou então você fica parada pensando sobre todos os acontecimentos da sua vida e tudo passa como se fosse uma cena de filme que você se lembra detalhadamente pq é o filme da sua vida.

Me fizeram essa pergunta e eu não tive o que responder, mas me deixou tão pensativa que eu abri os meus olhos para o que eu me permitia passar, mas se ainda há amor é pq existe mudança né?

Com os meus 15 anos fui cega, não ouvi minha mãe e me casei com o Rafael, amava ele e ele me amava, bom era o que eu achava.

Tivemos altos e baixos como todo casal no início passamos por dificuldades e por coisas boas em nossas vidas, até que ele decidiu entrar pro movimento na Rocinha, eu não aceitei muito mas quando vi o dinheiro aí mesmo que fiquei cega e foi daí pra pior.

TEMPOS ATRÁS

Acordada a madrugada toda preocupada com o meu marido, cada tiro era uma oração diferente, joelhos dobrados eu clamava a Deus pra proteger a vida do meu marido, choros incessantes, aquilo me machucava de uma tal forma que me partia o coração saber que a cada tiro que era ouvido poderia ser atingindo ele.. ou não.

Depois de um bom tempo os tiros diminuíram, fiquei alguns minutos dentro de casa ainda e só quando ouvi a gritaria na rua que era dos familiares encontrando os corpos eu consegui ter coragem e botar a cara na rua, sempre foi uma cena de terror mas tínhamos que ter estômago pra aguentar já que aceitamos só pensando no melhor que pode proporcionar em nossas vidas.

A cada beco que passava e não encontrava Rafael era um aperto no peito que eu sentia, rodei a Rocinha toda e nada, bati em todas as bocas e nem na hora da trocação viram ele, minha cabeça só pensa em foi preso ou morreu e ninguém viu. Até que decidi parar um pouco na velha que conheço bebi um pouco de água e eu me tremia mais do que bebia água até que escuto um ronco de moto idêntico ao dele me levanto da calçada olhando pra entrada do beco e vejo ele com uma mulher na garupa.

Ele não me viu mas se despediu da mulher com um beijo tão demorado com direito a apertada e tapa na bunda, aquilo ali foi o cúmulo, eu chorando, orando, com dor no peito e ele vadiando com ela? Fui pra cima saber.

Mayara -Seu fdp você tava aonde?? Mó tiroteio aqui e eu chorando preocupada contigo!!- Cheguei nele já batendo.

ZL -Para com isso maluca, tá perdendo a noção do perigo?- Ele segura meu braço com tanta força que logo cai algumas lágrimas.

Mayara -Eu fiquei preocupada e você comendo essa puta, eu não mereço isso Rafael-

ZL -Meu nome não é Rafael e você sabe muito bem disso, e retira o que disse sobre ela, a única puta aqui é você!- Aquilo foi de partir o coração.

Só de ouvir da boca do seu amado que você virou um nada pra ele, ele simplesmente deixou bem claro que você não é e nunca foi um nada.

TEMPOS ATUAIS

Depois daquilo foi só ladeira abaixo real, apanhando sem motivos, sem direito de sair, sem direito de ir comprar alguma coisa no mercado, teve dias até que passei fome pq ele sumia e eu não podia sair se saísse iria apanhar na rua.

Proibida de falar com a minha mãe, com o meu pai, com qualquer pessoa que seja amigo ou parente eu fui proibida o que me restava naquela época era chorar e pedir a Deus uma luz. Que na verdade mandou várias luzes, mas todas as luzes ele matava pq dizia que não era dele. E não é sobre luz..

Mayara [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora