35, votação e pedido (lua nova)

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Sem discussões, ela me pegou nos braços e saltou levemente pela minha janela, tocando no chão sem uma sacudida sequer, como uma gata.

Era um pouco mais baixo do que eu imaginei que era.

Ela me ajudou a subir em suas costas, e começou a correr.

Depois de todo esse tempo, já parecia rotina. Fácil. Evidentemente, isso era uma daquelas coisas que nunca se esquece, como andar de bicicleta.

Estava muito quieto e escuro enquanto ela corria pela floresta, sua respiração lenta e uniforme, escuro suficiente pra que as árvores passando por nós voando quase eram invisíveis, e só a rajada de vento no meu rosto realmente indicava a nossa velocidade.

Eu mantive os meus olhos abertos, meu queixo descansando em seu ombro, minha bochecha no pescoço dela. A velocidade era divertida. Cem vezes melhor que a moto.

Eu virei meu rosto na direção dela e pressionei meus lábios em seu pescoço. Ela era cheirosa, e a temperatura era muito gostosa.

-Obrigada. – Ela disse, enquanto as vagas, sombras negras das árvores passavam por nós.

Eu sorri. O som era fácil, natural, sem esforço. Parecia certo.

-Eu vou ganhar a sua confiança de volta de alguma forma. – Ela murmurou, mais pra si mesma. – Nem que seja a última coisa que eu faça.

Ela diminuiu até estar caminhando, eu só sabia a diferença porque o vento parou, e eu imaginei que não estávamos longe da casa. De fato, eu achei que estava ouvindo o som do rio correndo em algum lugar próximo na escuridão.

Ela parou e se inclinou pra trás pra me tirar de suas costas. Suas mãos gentis não me soltaram, depois que ela me colocou no chão de novo, ela me agarrou apertado em seus braços, me segurando no peito.

Ela puxou um dos cantos da boca pra cima meio sem vontade, mas a expressão não tocou os olhos dela. Não era um de seus sorrisos de sempre.

-Se houve pelo menos uma forma de te fazer ver que eu não posso viver sem você... – Ela cochichou. – Tempo, eu acho, é a única forma de te convencer.

Eu gostei da ideia de tempo.

-Tudo bem. – Eu concordei.

O rosto dela ainda estava atormentado. Eu comecei a tentar distraí-la com coisas sem importância.

-Então, já que você vai ficar. Será que posso ter as minhas coisas de volta? – Eu perguntei, fazendo o meu tom sair o mais leve que eu pude.

Ela riu.

-As suas coisas nunca foram embora... – Ela disse. –Eu sabia que era errado, já que eu prometi te deixar em paz, sem lembranças. Foi uma coisa estúpida e infantil, mas eu queria ter alguma coisa minha com você. O CD, as fotos, as passagens, elas estão todas embaixo do seu piso...

-Mesmo?

Ela balançou a cabeça, parecendo um pouco mais alegre com o meu óbvio prazer por esse fato trivial. Isso não foi suficiente pra curar completamente a dor em seu rosto.

-Eu acho... – Eu disse lentamente. –Eu não tenho certeza, mas eu imagino... eu acho que sabia disso o tempo inteiro.

-O que você sabia?

-Alguma parte de mim, meu subconsciente talvez, nunca deixou de acreditar que você se importava com o fato de que eu vivia ou morria. Provavelmente era por isso que eu estava ouvindo as vozes.

Houve um profundo silêncio por um momento.

-Vozes? – Ela perguntou, hesitante.

-Bem, só uma voz. A sua. É uma longa história. – O olhar cauteloso em seus olhos me fez desejar não ter tocado no assunto.

crepúsculo (bellice)Onde histórias criam vida. Descubra agora