Ficamos alí por alguns minutos sem dizer uma única palavra, sentia meus pensamentos pesarem bem menos do que antes e a única coisa que eu desejava era te beijar por infinitas vezes. De repente toda aquela ansiedade dentro do meu peito tinha se acalmado, e agora era substituída por algo ainda mais quente, entretanto, compassivo, e caloroso.
Meu corpo se inclinou na sua direção quase como se cada molécula do meu ser suplicasse por um toque da sua boca, jamais imaginei que a minha mente seria completamente ocupada por outra coisa além das questões moribundas que eu criava, e naquele instante a única imagem qual formava-se na minha cabeça era a dos seus lábios escuros, escuros como o céu nublado. Estava disposto à trocar todas as filosofias quais cultivei em uma vida por outras sem ao menos questioná-las, como se as complicações anteriores fossem algo irrelevante demais para preocupar-me com os seus processos. O jovem velho apático havia tornado-se a mundança, e esta talvez seria a resposta mais simples entre as complexas para explicar quem sou.
Quando finalmente provei aquela superfície macia a minha percepção de tempo havia acabado, em um gesto delicado você também me correspondeu, e o beijo mais demorado que eu tinha provado finalmente se fez naquela noite. Desejei consumí-la com os meus braços, torná-la cúmplice do meu sentimento apaixonado, mas você interrompeu que aquele momento se aprofundasse, como se houvesse algo a impedindo, alguma questão não resolvida em sua mente. Acreditei saber o motivo, ou pelo menos parte dele, entretanto, existiam também outras razões dentro da sua cabeça para criar todo aquele bloqueio sentimental. Seus olhos brilhavam, porém a sua dor era mais do que notória.
- Qual era o nome do seu irmão? - deduzi que o problema dela seria em sentir a falta dele, então toquei no assunto.
- Por que você saber? - perguntou ela.
- Apenas tive uma certa curiosidade sobre ele... - respondi mantendo o contato visual.
- George... esse era o nome dele... - ela respondeu desviando o olhar para a frente.
- Um belo nome... e acredito que como pessoa, talvez ele também tinha seu valor... nunca o conheci para saber realmente quem ele era, mas, eu posso apostar que nenhum irmão se sentiria feliz em saber que sua irmã está sofrendo por sua causa. - falei direcionando meu olhar para as luzes da cidade.
- E o que você sabe sobre mim? Ou sobre ele? Nunca te pedi nenhuma sessão terapêutica pra me curar de nada, e eu agradeceria se respeitasse o meu espaço. - ela disse levantando-se de cima do carro enquanto mostrava uma insatisfação por estar sendo analisada.
- Me desculpa, eu só queria te ajudar a lidar com isso... - falei tentando me explicar.
- Como se você soubesse da minha vida o suficiente pra tentar isso, você não sabe nada sobre mim, e o que conhece é apenas uma fração da minha vida, o mundo em que vivo é algo muito mais complexo do que os seus pensamentos fantasiosos de universitário. Olha, Rubiel... acho que foi uma péssima ideia te trazer aqui, nossos mundos não são iguais. - ela falou em um tom mais elevado.
Calei-me por alguns minutos tentando assimilar o que ela dizia, mas estava cego demais para ter qualquer pensamento racional naquele momento, talvez os dois estivessem errados, quem sabe a falta de flexibilidade em lidar com certas situações havia tornado tanto quem expressava quanto quem interpretava em algo arcaico, e agora a única real certeza que tinha era sobre estar magoado, inegavelmente ferido pela pessoa que gostava. Uma sensação dez vezes pior do que qualquer crise existencial qual já tinha vivenciado.
- Perdão... - falei direcionando o meu olhar para o chão. - Acho que é melhor a gente ir embora então. - acrescentei percebendo o espaço que você precisava.
Ela assentiu com a cabeça e entrou no carro sem dizer nenhuma palavra, tomei o mesmo caminho e me sentei no banco do carona, enquanto isso a minha cabeça não aceitava aquela situação, não conseguir alcançá-la em seus pensamentos, ser impotente para ajudar a quem eu gostava, aquela situação corroía o meu peito como se fossem agulhas de tatuagem. Precisava pelo menos achar outra forma de me aproximar, e quem sabe entender os motivos quais estariam torturando a sua cabeça.
- Esse é o meu telefone, quando quiser conversar, é só me ligar, entendeu? É sério... - Cortei o silêncio colocando um papel com o meu número escrito, feito enquanto ainda estava na loja de eletrônicos.
- Tudo bem... - ele concordou mantendo seu olhar na estrada. - Me desculpa por hoje, tá? - ela acrescentou.
- Sem problemas. - concordei, mas só eu sabia como aquilo havia me magoado realmente.
Se fosse para supor quem era o culpado por aquele atrito, não saberia responder, certamente havia magoado ela tanto quanto ela tinha me magoado. As vezes, quando tentamos ajudar uma pessoa de forma direta, acabamos piorando os seus conflitos internos, não é como se você tivesse que ser um erudito das respostas para os problemas de cada um, é sobre cada um ponderar as próprias respostas que oferece à sí mesmo. Por melhor que seja o seu conselho, a pessoa em questão sempre interpretará ele da sua própria forma, obviamente na maior parte das vezes uma boa opinião não trará problema real algum, mas, é necessário cautela. Existem bolas de neve que se destroem, como também existem aquelas que derrubam casas.
Você me deixou em casa e foi embora, com o semblante de quem estava lidando com mais coisas do que poderia suportar.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Não Me Leia, Julieta
Roman d'amourRubiel busca se entender dentro de uma crise existencial na qual o acompanha por quase uma vida. Nesse meio tempo ele conhece alguém que lhe desperta novamente grandes emoções inesperadas. Porém, ele não imaginava que sentimentos maiores do que este...