XII. Injustiça

1 0 0
                                    

Aquilies passou a visitar a sua mãe no hospital todas as manhãs, incorporando isso como parte de sua rotina. Mesmo tendo recusado a hospitalidade do vizinho Rolf na primeira vez, a dura realidade pressionou o menino a engolir o orgulho para que tivesse onde dormir.

Uma semana havia passado e, aparentemente, as coisas haviam se estabilizado. O amigo de seu pai não passava por muitas dificuldades, eram um dos poucos refugiados a ganharem destaque pela sua utilidade. Descobriu que ele trabalhava como guarda noturno por conta de sua constituição forte e parruda.

Diferente de seu falecido pai, Rolf tinha cabelos cor de fogo e também tinha a típica barba fechada dos homens insulares. Nas manhãs, o via mergulhado em longas sessões de leitura e aprendizado, enquanto desfrutava de seu simples café da manhã. E hoje foi mais um dia desses.

— O que está vendo agora, Rolf? — perguntou Aquilies, que se arrumava para treinar no frio, no idioma de Warren.

— Conjugação dos verbos. — disse o homem.

Para Aquilies, foi fácil aprender a linguagem falada no continente, visto que sua mãe tinha afinidade em aprender novos idiomas. Contudo, Rolf também estava aprendendo a ler e escrever, o que era dezenas vezes mais difícil do que imitar sons que fizessem sentido.

— Mas é mais difícil escrever do que falar, né?

—É bem mais complicado, Aquilies. — Depois disso, mordeu uma tira de bacon frito. — Por que não aprende também? Vai ser útil no futuro.

— Como o quê? — O garoto sentia que escrita e leitura fossem um trabalho muito tedioso, preferia mexer na forja do que pegar em papel e caneta.

— Para o seu sonho. — Rolf não havia esquecido do objetivo do menino numa conversa que tiveram poucos dias atrás. — A prova de admissão dessa tal ordem envolve saber ler e escrever. E responder perguntas sobre assuntos que eu desconheço.

Aquilies nem sequer tinha tempo para pesquisar a fundo, pois trabalhava a maior parte do tempo. Esse baque fez com que ele parasse de se arrumar.

— Eu não sabia que era assim...

— E tá tudo bem, sei o quanto se esforça.

Rolf falava com eloquência numa língua já bem fluída que era proveniente do subcontinente. Ele emanava tranquilidade, mesmo crescendo em torno de uma cultura guerreira. Contrariando as normas, Rolf se absteve de participar do levante de Ragnor, pois não gostava da ideia da guerra e de invasões.

— Você pode começar a aprender com os primeiros livros que li. — ofereceu ele.

— Depois, Rolf. — Terminando de calçar os sapatos, Aquilies girou e foi abrir a porta. — Voltarei às dezoito horas.

— Tenha cuidado. — disse como de costume.

A casa dele ficava a alguns quarteirões à frente da de sua mãe, o que diminuía consideravelmente a distância que ele teria que percorrer. Aquilies olhou para trás e ficou tentado a conferir novamente o que sua casa tinha se tornado. Mas já havia feito isso quando a semana mal tinha acabado de começar. Apenas faixas lacravam e impediam com que entrassem nela.

Então, ele correu e desejou que trombasse com Riza no meio do caminho como da primeira vez, esperando que as coisas mudassem se ele tivesse tomado outras decisões. Não foi o caso, pois se deparou com Jones na saída da periferia.

Pensou em só dar mais um "Bom-dia" ou "E aí" e continuar seu trajeto, do mesmo jeito que dos dias que se seguiram desde que o conheceu. Nessa hesitação, o guarda o abordou primeiro.

O Prelúdio da JornadaOnde histórias criam vida. Descubra agora