XIV. Satisfação

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— Senhor, está me dizendo que roubou uma mãe e seu filho por inveja? — interrogou Galvino, vestido num uniforme mais casual.

Dentro do prédio da guarnição, Aquilies viu o justiceiro questionando, num cubículo onde havia apenas uma mesa e uma cadeira, o agressor e também o assaltante de sua família.

— Você sabe como é passar oito anos de sua vida trabalhando, ajudando, martelando, se queimando, para um patrão que te usou por todo esse tempo, sem ter qualquer reconhecimento ou nem sequer um aumento no seu pagamento? — desabafou o homem adulto. — E esse mesmo sujeito ainda vai continuar o ciclo de exploração com outros meninos como aquele ali. — Inclinou a cabeça para Aquilies, que estava do lado de fora da sala.

A sala em que estava ocorrendo a extração de informações era, basicamente, uma cela com grossas grades de aço. Embora apertado, tinha uma janela de grades na outra extremidade da sala, no alto dela, aliás, para que não houvesse tentativas de fuga.

Não sabia se era por vergonha de ter cometido o crime, mas Aquilies viu que Tobias, o mais velho dos assistentes do mestre ferreiro Godo, estava de cabeça baixa com os cabelos cobrindo seu rosto.

— Justiceiro. — chamou o criminoso. — Acha tudo isso que eu contei justo?

O tenente ficou em silêncio.

— As devidas advertências serão dadas ao seu patrão...

Advertências? — rosnou Tobias, erguendo a cabeça. — Eu exijo uma indenização por todos os danos que eu tive que passar ao longo da minha vida por causa dele!

A situação estava tão ruim assim para vir roubar da gente?

— Olha aqui, cidadão. — Galvino aumentou seu tom de voz, soando autoritário. — Você não tem o direito de exigir nada aqui. Você roubou de um garoto e deixou uma viúva em estado de internação. A justiça veio até você, e você vai pagar pelos seus crimes. — Em pé, o tenente delongou um olhar de cima a baixo para o meliante. — Você passará dez anos na cadeia e terá de pagar uma multa de quinhentas moedas de ouro para quem suas ações prejudicaram. E se a mãe do garoto vier a morrer por causa de você, juro cortar a sua mão eu mesmo, e que fique maneta pelo resto de sua vida apodrecendo na prisão.

Aquilies ouviu o julgamento sendo dado ali mesmo, sentindo-se satisfeito pela justiça ter sido cumprida.

— Mas agora, me responda, você está envolvido com mais alguma coisa? Ou fez isso tudo por raiva e satisfação de ser compensado pelos anos improdutivos?

Tobias continuava de cabeça baixa, com uma marcação roxa em sua mandíbula por causa do forte golpe que recebeu, mas ainda temperamentalmente insistente.

— Senhor, ouviu a minha pergunta? — perguntou o tenente.

Sem saída, o homem arriscou:

— Eu exijo a Justiça por Combate! — gritou ferozmente.

Aquilies ficou assustado pela forma que ele proferiu sua exigência, pois nunca havia visto tanto ódio destilado. Galvino ficou surpreso pela abismal transformação do homem que não tinha mais nada a perder. Contudo, como previsto em lei, a Justiça por Combate podia ser solicitada por qualquer um que tivesse a honra ferida. Não podia ser solicitada na maioria dos crimes, mas quando honra era envolvida, o culpado tinha tal direito.

— Está bem. — confirmou o justiceiro, desejando que a situação tomasse outro rumo. — Você mesmo será seu próprio representante na luta?

— Sim. — respondeu rápido sem pensar.

— O desafiado se trata do seu patrão, correto?

Tobias tinha o olhar franzido e ao mesmo tempo sério. Parecia encarar a parede, mas na verdade, olhava para Aquilies com intenções malignas.

O Prelúdio da JornadaOnde histórias criam vida. Descubra agora