Há certos momentos na vida em que o tempo aparenta desacelerar. De repente o mundo ao redor passa a transcorrer em câmera lenta enquanto tudo o que se ouve é o intenso pulsar do coração dizendo que a vida se pôs mais viva do que nunca, como o coração de um corredor pulsando em êxtase ao dar-se conta de que está próximo da linha de chegada e será o primeiro. E assim cada célula de seu ser é preenchida por uma sensação reconfortante, uma sensação de paz.E algo dá mais paz do que voltar para casa?
Voltar para o seu lugar, o seu perfume. Voltar para as pessoas que você ama e que te ama?Diante da calidez do sol sobre a derme, ao passo que o vento se esvai por entre os seus dedos, com a mão para o lado de fora da janela do carro, Giovanna sente que não. Não há nada mais prazeroso do que voltar para casa. Embora, ainda, não saiba o verdadeiro e imenso significado desta palavra ao lado de Laura, Maria e Alexandre. Mas portando no peito a certeza de que regressar à casa junto deles é uma das melhores sensações de que se recorda. E essa constatação não sucede na detenção do tempo enquanto o veículo corre na autoestrada, nos olhos negros relanceando sobre si disfarçadamente através do retrovisor, ou, na risada das filhas soando ao fundo, mas sim na paz que preenche o seu peito com o conjunto da obra.
Paz.
Giovanna não se lembra quando foi a última vez que sentiu essa sensação tão alentadora. E apesar do medo tentar surgir bem no fundo de seu interior, a paz que se alastra pelo seu coração é mais potente. É uma sensação tão intensamente boa que logra dissipar todas as outras sensações ruins, como se essa única certeza estivesse afagando suavemente todas as incertezas com carinho. Levando a amnésia a se tornar uma simples viagem.
E todas as viagens, na verdade, não são viagens de regresso a casa?
Todas as viagens não nos modificam de alguma forma?
Nunca somos os mesmos que antes ao voltar de uma viagem.
E voltar para casa sempre desperta uma mescla de melancolia e felicidade. Melancolia pelas coisas que descobrimos no decorrer da viagem mas tivemos que deixar para trás, e, felicidade, por regressar a casa.
Porque em casa sempre, sempre, sempre há algo de paz.
— Estamos quase chegando. – informa Alexandre.
Giovanna desperta de seu devaneio e o encara.
Por um breve instante a atenção de Alexandre se mantém exclusivamente na estrada, até ser necessário ele reduzir a velocidade quando os carros começam a se enfileirar na frente do seu. E é nesse momento que ele consegue desviar o foco da pista para encarar a mulher ao seu lado.
Então os olhos dele se cruzam com os dela. E Giovanna percebe imediatamente de onde vem o seu medo quando algo nas pupilas a atinge bem no coração. Também há medo em Alexandre. E, talvez, muito mais profundo do que aquele que surge de pouco a pouco dentro dela.