Capítulo 10

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Flórida

St. Augustine, 1761

A cidade em si ainda era pequena. Fundada há quase duzentos anos, Saint Augustine ainda necessitava de desenvolvimento em todos os lugares.
Mesmo com as dificuldades, o lugar era lindo. As ruas eram estreitas, seguindo o modelo de ruas das cidades espanholas, as casas eram grandes e não possuíam cores iguais, mesmo que o modelo de construção fosse bastante parecido.

Ao chegarem à cidade, a madre separou as freiras para que distribuíssem as coisas mais rápido. Comidas, roupas e algumas outras coisas para os necessitados.

Ava juntou-se a outras freiras, ficando separada de Emilly, que seguiu para outro lugar. O pequeno grupo de Ava ficou disposto perto da grande igreja, onde ocorreria a missa de domingo mais tarde.

Observou as freiras mais velhas distribuindo comidas e cobertores para os moradores de rua, algumas com sorrisos alegres por estarem ajudando pessoas que precisavam e outras que mal chegavam perto das pobres criaturas.

A jovem Feyler largou seus afazeres assim que entregou a última coberta para uma senhora de cabelos grisalhos que mal a encarou. Olhou para os lados para ter certeza de que a madre não estava por perto e adentrou a grande igreja.

Repleta de bancos de madeira maciça, a igreja católica de Saint Augustine fora construída inteiramente por pedras de tons claros, tanto do lado de fora quanto dentro. Assim que entrou, Ava conseguiu avistar ao longe a grande estrutura do altar da igreja, com uma grande imagem de Jesus pregado na cruz; mais abaixo a imagem de Nossa Senhora. Ao redor de todo altar velas foram acesas, provavelmente por algumas pessoas que passaram ali mais cedo naquela manhã, e ao lado o padre Michael sussurrava alguma coisa para um menino, que logo atravessou a igreja correndo, quase esbarrando em Ava ao se encontrarem no caminho.

Como ainda era cedo, a igreja não tinha praticamente ninguém. Apenas uma senhora idosa estava em um dos muitos bancos do lado direito. Com o lenço preto ao redor da cabeça, era impossível ter uma boa visão do rosto da mulher, que tinha a cabeça inclinada para baixo como se estivesse dormindo.

Ava a ignorou e fez o sinal da cruz com a água benta que ficava dentro de uma pequena fonte ao lado direito das grandes portas duplas. Sentou-se dois bancos atrás da mulher e pôs-se a rezar, rogando a Deus por coragem para confessar seus pecados. Quando viu que o padre havia saído para o confessionário, Ava o seguiu, virando à direita ao passar pelo altar. Ajoelhou-se no batente amadeirado atrás da tela escura e, tomando um pouco de ar, começou:

- Perdoa-me, Pai, pois eu pequei. Faz dois meses desde a minha última confissão.

- O senhor esteja em seu coração para que arrependida confesse humildemente seus pecados. Em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo. - A voz rouca e já idosa do padre soou do outro lado da tela, fazendo Ava sentir-se ainda mais nervosa - o que a aflige, minha filha?

- Tenho tido pesadelos mais uma vez, padre. Dessa vez, no entanto, estão ainda mais lúcidos. É como se eu estivesse lá.

- Você tem feito suas orações antes de deitar-se?

- Sim, padre, todas as noites. Mas é sempre a mesma coisa: destruição, sangue, animais mortos e aquela mulher. Ela sempre está lá e atrás dela, uma legião de criaturas cheias de chifres e rostos deformados.

O padre ficou em silêncio por um tempo, mas logo sua voz voltou a soar:

- Esses pesadelos, minha filha, são um reflexo dos seus pecados. Algo dentro de você está querendo tomar o rumo da sua vida e a destruir. Algo perturba seu coração?

- Sim, padre. - sua voz saiu quase como um gemido. Ela não queria, mas teria que contar sobre o que a deixava acordada à noite - às vezes eu fico imaginando se eu realmente tenho vocação para isso. Digo, será que a vida no convento é uma missão de Deus para mim ou eu estou apenas me enganando?

Filha Do MalOnde histórias criam vida. Descubra agora